Política

Lula vetou os pontos centrais da tese ruralista do Marco Temporal; entenda o que foi derrubado

A bancada ruralista no Congresso já se organiza para reverter a decisão do presidente

O presidente Lula. Foto: Evaristo Sá/AFP
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O presidente Lula (PT) decidiu vetar parcialmente, na sexta-feira 20, o projeto de lei do Marco Temporal para a demarcação de territórios no Brasil. O texto foi aprovado pela Câmara em maio e pelo Senado em setembro.

Ele barrou exatamente os dispositivos que estabeleciam o limite das demarcações em 1988 – ou seja, barrou o ponto principal do projeto. Manteve, no entanto, os artigos “que respeitam a Constituição”, segundo o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha.

O ponto central é o artigo 4º, considerado o “coração” do Marco Temporal. O dispositivo vetado por Lula estabelecia como “tradicionalmente ocupadas pelos indígenas brasileiros” as terras em que eles estavam na data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.

“A proposição legislativa, ao apresentar a tese do Marco Temporal e seus desdobramentos, incorre em vício de inconstitucionalidade e contraria o interesse público por usurpar direitos originários previstos nocaputdo art. 231 da Constituição Federal, haja vista que tal tese já foi rejeitada pelo Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida em 27 de setembro de 2023″, diz um trecho da justificativa do veto parcial ao artigo.

Lula também vetou:

– a obrigatoriedade da participação de estados, municípios e partes interessadas na demarcação de uma área indígena;

– a obrigatoriedade de intimar os interessados desde o início do processo de demarcação e de permitir a indicação de peritos auxiliares;

– a obrigatoriedade de indenizar as benfeitorias realizadas nas áreas em disputa;

– a permissão para que não-indígenas que tivessem posse da área demarcada pudessem usufruir da terra até a conclusão do procedimento demarcatório e tivessem indenizadas as benfeitorias;

– a proibição de ampliar terras indígenas já demarcadas;

– a possibilidade de contato com povos indígenas isolados para supostamente “prestar auxílio médico ou para intermediar ação estatal de utilidade pública”.

– a supressão de um trecho da lei que proíbe o cultivo de alimentos transgênicos em terras indígenas;

– a possibilidade de a União tomar novamente as terras caso os traços culturais da comunidade indígena tenham sido modificados com o passar do tempo;

– a formalização do conceito de “áreas indígenas adquridas”, por meio de compra, venda ou doação;

– a permissão para instalar bases e postos indígenas sem consulta à comunidade ou ao órgão indigenista competente;

– a possibilidade de operações das Forças Armadas e da Polícia Federal em áreas indígenas sem consulta às comunidades;

– a permissão de instalar estradas, redes de comunicação e outros equipamentos em terras indígenas;

– a proibição de cobrar tarifas pelos indígenas para utilização de estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou qualquer equipamento a serviço público em terras indígenas;

– a determinação de que antropólogos, peritos e outros profissionais especializados, nomeados pelo poder público, fosesem submetidos às regras do Código de Processo Civil sobre suspeição e impedimento;

– a permissão de turismo em terras indígenas, organizado pela própria comunidade;

– a determinação de que o usufruto por indígenas em terras indígenas em unidades de conservação deveria ficar sob a responsabilidade do órgão federal gestor da área protegida.

Conforme apurou CartaCapital, o governo se dividia entre vetar todo o projeto de lei ou apenas alguns de seus dispositivos.

O Legislativo ainda poderá derrubar os vetos de Lula. Para isso, será necessário convocar uma sessão do Congresso Nacional e obter maioria absoluta dos votos de deputados e senadores para rejeitar a determinação do presidente.

A bancada ruralista no Congresso já se organiza para derrubar a decisão de Lula. Em comunicado, a Frente Parlamentar da Agropecuária diz que os vetos “serão objeto de derrubada em sessão do Congresso Nacional, respeitados os princípios de representatividade das duas Casas Legislativas, com votos suficientes para a ação”.

Os ruralistas dizem, ainda, que “não assistirão de braços cruzados à ineficiência do Estado Brasileiro em políticas públicas e normas que garantam a segurança jurídica e a paz no campo”.

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