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Lenta agonia

Com possível cassação do mandato de Sergio Moro, políticos paranaenses já cobiçam a sua vaga

Vácuo. O bolsonarista Paulo Martins pode ocupar o cargo como interino. Requião disputa a indicação do PT – Imagem: Geraldo Magela/Ag. Senado, Edilson Rodrigues/Ag. Senado e Jefferson Rudy/Ag. Senado
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Rei morto, rei posto. No Paraná, o adágio popular tem sido levado ao paroxismo, com uma sucessão abreviada diante de um monarca agonizante. Até o fim ano, o Tribunal Superior Eleitoral deve julgar o pedido de cassação do mandato do senador Sergio Moro. Depois da malfadada tentativa de disputar a Presidência da República pelo Podemos, o ex-juiz contentou-se em ­disputar o Senado por outro partido, o União Brasil. Venceu a disputa com 1,9 milhão de votos, mas tornou-se alvo de duas ações que questionam os gastos feitos na pré-campanha, quando ainda sonhava com o Palácio do Planalto. Por vestir durante meses a fantasia de presidenciável, isso o colocou em situação de vantagem indevida em relação aos demais candidatos, questionam o PL de Jair Bolsonaro e a federação liderada pelo PT no estado. Muito antes de o caso chegar à Corte eleitoral, políticos paranaenses estão de olho na vaga, e os partidos já encomendam sondagens eleitorais para definir candidatos.

O infortúnio da ex-senadora Selma Arruda alimenta as especulações sobre o destino de Moro. Eleita pelo PSL de Mato Grosso, Arruda, também juíza, conhecida como a “Moro de saias” pelo “rigor” com que atuava no combate à corrupção, foi cassada por unanimidade pelo TSE em dezembro de 2019, sob a acusação de uso do “caixa 2” na campanha. O processo contra Moro guarda algumas semelhanças, mas ainda está na fase de instrução no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná. O desembargador Mario Helton Jorge, relator do caso, rejeitou os pedidos da defesa para anular sumariamente o processo e autorizou a produção das provas.

“O objetivo da ação é investigar o abuso de poder econômico pelo dispêndio de recursos financeiros durante a pré-campanha de Sergio Moro, não declarados e contabilizados pela Justiça Eleitoral”, explica Luiz Eduardo Peccinin, advogado da Federação Brasil da Esperança, a reunir PT, PCdoB e PV. Segundo Peccinin, também autor da ação que resultou na cassação do mandato do ex-deputado Deltan Dallagnol, outro prócer da República de Curitiba, o senador do União Brasil beneficiou-se de uma campanha antecipada, “ferindo a igualdade de oportunidade nas eleições de 2022”. Além disso, há suspeitas da triangulação de valores do Fundo Partidário via escritório de advocacia e empresas de seu primeiro suplente.

Seja qual for o resultado do julgamento no TRE, é certo que a parte derrotada deverá recorrer à última instância da Justiça Eleitoral, em Brasília. A expectativa é de que o trâmite da ação no TSE seja rápido, uma vez que, se confirmada a cassação do mandato de Moro, haverá necessidade de uma nova eleição para escolha de outro senador. Como em 2024 teremos eleições municipais, para escolher prefeitos e vereadores, é possível aproveitar a votação por medida de economicidade.

O arranjo suscita, porém, algumas dúvidas. O estado do Paraná ficaria sub-representado, com um senador a menos, até a posse do novo eleito? No caso de Selma Arruda, o TSE empossou, provisoriamente, o terceiro colocado na disputa de 2018. Se acontecer o mesmo no Paraná, o escolhido seria Paulo Martins, do PSL, segundo colocado nas eleições de 2022.

A eleição para preencher a vaga de Moro teria de começar do zero. Assim, todos os partidos podem lançar candidatos, independentemente dos nomes que disputaram o pleito no ano passado. Por ser uma eleição suplementar, os prazos para convenções partidárias, desincompatibilização para as candidaturas e propaganda eleitoral podem ser reduzidos, a fim de adequar o processo ao calendário diferenciado. Na prática, a movimentação eleitoral já começou, diante do cadáver insepulto do parlamentar.

A semelhança com o caso da ex-senadora Selma Arruda alimenta as especulações sobre o destino do ex-juiz

Arilson Chiorato, deputado estadual e presidente do PT no Paraná, antecipa que seu partido terá candidatura própria e com grande visibilidade eleitoral. “Até porque o presidente Lula precisa de gente do seu time no Congresso para votar nas mudanças que o Brasil necessita”, justifica. Difícil será definir o candidato. Três nomes fortes colocam-se na ­disputa: a deputada federal e presidente da legenda Gleisi Hoffman, o líder do PT na Câmara dos Deputados, Zeca Dirceu, e o ex-governador Roberto Requião.

Ex-senadora, ex-ministra da Casa Civil de Dilma Rousseff, reeleita deputada federal com a maior votação do partido, presidente nacional do PT desde 2017 e da total confiança do presidente Lula, Gleisi Hoffmann parece largar na pole position da disputa interna. Zeca ­Dirceu, filho do ex-ministro José Dirceu, está em seu quarto mandato como deputado federal. Disposto a lançar candidatura à prefeitura de Curitiba em 2024, ele cogita mudar os planos e concorrer ao Senado. O mais ativo dos postulantes é o neopetista Roberto Requião. Pelas redes sociais, o ex-senador já está em campanha, e tem defendido que o Paraná precisa de “alguém com larga experiência” e que tanto Gleisi como Zeca “já estão eleitos deputados federais”.

Mordaz, alfinetou a primeira-dama Janja após ela ter chamado Gleisi de “futura senadora” pelo Twitter. “Janja é forte demais, ela deveria ser candidata”, ironizou Requião. “Ela pode ser prefeita de Curitiba. Vou colocar uma bandeira na minha janela: ‘Estamos todos com Janja’”, concluiu. A CartaCapital Requião confirmou que pretende disputar a indicação do partido para concorrer ao Senado.

No outro lado do tabuleiro, a movimentação também é intensa. Ricardo Barros, do PP, deputado federal licenciado e atual secretário da Indústria, Comércio e Serviços do governador Ratinho Jr., é um dos interessados na vaga de Moro. Para o cientista social Emerson Cervi, doutor em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro e professor da Universidade Federal do Paraná, essa eleição passa por uma negociação mais ampla, a envolver as eleições municipais. “Ratinho Jr. terá grande influência, pois foi reeleito governador com quase 70% dos votos. Sua força é incontestável”, avalia.

O bolsonarista Paulo Martins, ex-deputado federal pelo PL, ficou em segundo lugar na disputa pelo Senado em 2022, sendo derrotado por Moro. Sem cargo político, ganhou do governador paranaense o posto de comentarista em uma emissora de tevê afiliada ao SBT e comandada pelo pai, o apresentador Ratinho. Ainda teria apoio de Jair Bolsonaro para concorrer? Inelegível, o padrinho seria capaz de desequilibrar a disputa?

Outra incógnita é o ex-senador Álvaro Dias, do Podemos. Após quatro mandatos consecutivos, ele foi derrotado em 2022 e, desde então, está afastado do noticiário político. “Ele pode correr por fora, mas enfrentará um caminho pedregoso, pois não tem apoio dos bolsonaristas, do governador Ratinho Jr. nem dos petistas.” •

Publicado na edição n° 1267 de CartaCapital, em 12 de julho de 2023.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Lenta agonia’

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