Política

Em meio ao distanciamento entre Bolsonaro e Republicanos, Moro faz ofensiva junto à Universal

Aliados do ex-juiz abrem diálogo com Crivella e miram Edir Macedo. Invasão à Ucrânia vira ‘alerta’ contra governo

O ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Diante de abalos na relação mantida pelo presidente Jair Bolsonaro com lideranças evangélicas, o ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro (Podemos) trabalha numa ofensiva para estreitar o diálogo com pastores e políticos ligados ao segmento. Aliados de Moro têm conversado com o presidente do Republicanos, deputado federal Marcos Pereira (SP), que acenou anteontem com um desembarque da campanha de reeleição. A equipe do ex-ministro já incluiu na agenda reuniões com outras pessoas consideradas próximas ao bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal, em meio ao esforço de angariar apoios de descontentes com Bolsonaro.

Um desses nomes no radar de Moro é o ex-prefeito do Rio Marcelo Crivella, sobrinho de Macedo. Após uma frustrada tentativa de se reeleger, em 2020, como apoiador de Bolsonaro, e de ver sua indicação ao posto de embaixador na África do Sul ser recusada, Crivella acalentou uma candidatura a senador neste ano, sem despertar apoio no Palácio do Planalto. No Rio, Bolsonaro estará no palanque do governador Cláudio Castro (PL), que avalia deixar a vaga ao Senado com partidos como MDB, União Brasil e o próprio PL, do senador Romário, que se diz candidato à recondução. O Republicanos também resiste a lançar o ex-prefeito ao Senado, por entender que ele pode ter boa votação concorrendo a deputado federal.

Crivella já foi procurado para encontrar-se com interlocutores de Moro nas próximas semanas, no Rio. As articulações da campanha do ex-juiz com o meio evangélico são conduzidas por Uziel Santana, advogado ligado à Igreja Batista e presidente licenciado da Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos).

Em paralelo, a presidente do Podemos, Renata Abreu, tem sondado o nível de insatisfação de Pereira, seu colega de Câmara, com os rumos da campanha de Bolsonaro. O dirigente do Republicanos disse na terça que Bolsonaro, até agora, “só atrapalhou” a montagem de chapas em 2022.

O passo seguinte, que já vem sendo planejado pela campanha de Moro, será um encontro com o próprio Macedo, que tem afunilado o rol de possíveis alianças da igreja para a eleição presidencial. Há nos últimos meses um acúmulo de críticas da Universal a Bolsonaro, incluindo temas como a reação do governo brasileiro à expulsão de pastores de Angola, considerada fraca e tardia, e o fato de o presidente ter o pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, como principal aliado no meio evangélico.

No fim do ano passado, chegou aos ouvidos da cúpula do Republicanos que Bolsonaro se consultou com Malafaia sobre o convite recebido para se filiar ao partido, e que teria sido desencorajado pelo pastor de ingressar na sigla ligada à Universal. Pouco tempo depois, em um artigo escrito pelo ex-presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) Guto Ferreira, ligado ao Republicanos, Malafaia foi chamado de “falso profeta” e acusado de tratar Bolsonaro como “marionete”. O artigo não fazia qualquer menção à filiação partidária de Bolsonaro, que optaria em novembro pelo PL, mas deixou arestas.

Em janeiro, nos primeiros movimentos de Moro para se aproximar do Republicanos, Guto Ferreira foi apresentado como possível “consultor” da campanha do ex-juiz numa reunião entre Renata Abreu e Marcos Pereira.

Mesmo com estremecimentos na relação com Bolsonaro, a Universal seguiu caminho distinto ao de igrejas como a Assembleia de Deus de Madureira, que fez acenos ao ex-presidente Lula (PT). O bispo Renato Cardoso, genro e tido como sucessor de Macedo, assinou artigo há um mês no site oficial da igreja no qual argumentou que quem é cristão não vota na esquerda, fechando a porta por ora a uma aliança com o petista.

Para abrir canais no meio evangélico, Moro apresentou uma carta a líderes religiosos em Fortaleza no início do mês. Com o auxílio de Uziel Santana, ele já encontrou pastores pentecostais, como R.R. Soares, e grupos presbiterianos e batistas.

A estratégia envolve ainda fazer “alertas” a evangélicos de diferentes ramos sobre ações de Bolsonaro consideradas prejudiciais aos fiéis. Uma das situações citadas é a invasão da Rússia à Ucrânia, concretizada ontem. Será lembrada a visita de Bolsonaro à Rússia e o fato de ter mostrado solidariedade a Vladimir Putin.

Diversos pastores, incluindo nomes próximos ao presidente, como Robson Rodovalho e Estevam Hernandes, compartilharam mensagens ontem pedindo apoio a cristãos ucranianos, em meio a receios de perseguição religiosa contra não-membros da Igreja Ortodoxa russa. Um encontro que reuniria entidades evangélicas de vários países em Kiev, em abril, foi cancelado ainda antes da invasão. O desembargador federal William Douglas, próximo a Malafaia, convocou uma vigília na embaixada russa em Brasília contra a guerra.

— Mesmo os pastores aliados de Bolsonaro não deixam de sentir decepção e tristeza por vê-lo ficar ao lado de China, Venezuela, Cuba, para defender a Rússia — afirmou Santana.

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