Política

Da dívida com o FMI à guerra comercial: o que líderes discutiram no G20 enquanto Bolsonaro se isolava

Em Roma, o presidente brasileiro priorizou contatos informais e o turismo

Foto: Alan Santos/PR
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O presidente Jair Bolsonaro encerrou neste domingo 31 sua participação na cúpula do G20, o grupo das 20 maiores economias do mundo. O fim da passagem do ex-capitão por Roma chegou sem qualquer reunião bilateral com líderes globais na agenda do dia.

Mais do que isso, o saldo geral do evento demonstra o isolamento diplomático do governo brasileiro. Um dos episódios que ilustram essa falta de articulação ocorreu na manhã deste domingo, quando Bolsonaro não participou de uma visita organizada pelo premiê italiano, Mario Draghi, à Fontana di Trevi. Compareceram a primeira-ministra alemã, Angela Merkel, o presidente francês, Emmanuel Macron, e os premiês da Índia, Narenda Modi, da Espanha, Pedro Sánchez, e do Reino Unido, Boris Johnson.

Além desse acontecimento simbólico, porém, há acordos e conversas importantes promovidos por chefes de Estado neste fim de semana, enquanto Bolsonaro priorizou contatos informais e o turismo.

Os Estados Unidos e a União Europeia chegaram a um meio termo para resolver uma disputa diplomática que se converteu em guerra comercial, ligada às tarifas sobre o aço e o alumínio europeus na Era Trump.

De acordo com a secretária de Comércio de Washington, Gina Raimondo, o pacto do G20 manterá a tarifa de 25% sobre os dois itens, mas permitirá uma entrada de “quantidades limitadas” de aço e alumínio sem as taxas extras. Em troca, a União Europeia não aumentará a taxação de produtos norte-americanos.

Após o diálogo, Draghi expressou “grande satisfação.”

“Que esse acordo seja um primeiro passo em direção à reabertura das trocas entre União Europeia e Estados Unidos para favorecer o crescimento de ambas as economias”, disse o italiano.

Joe Biden (EUA), Angela Merkel (Alemanha), Emmanuel Macron (França) e Boris Johnson (Reino Unido) também retomaram discussões sobre o acordo nuclear de 2015 com o Irã. Em declaração conjunta, afirmaram estar “convencidos de que é possível alcançar e implementar rapidamente um entendimento no retorno ao cumprimento total” do acordo.

“Isso só será possível se o Irã mudar de rumo”, escreveram os líderes ao presidente iraniano, Ebrahim Raisi.

“Pedimos ao presidente Raisi que aproveite esta oportunidade e retorne a um esforço de boa fé para concluir nossas negociações com urgência. Essa é a única maneira segura de evitar uma escalada perigosa, que não é do interesse de nenhum país.”

Por sua vez, o presidente da Argentina, Alberto Fernández, focou na tentativa de avançar com a renegociação das dívidas com o Fundo Monetário Internacional. Fernández se reuniu com a diretora-geral do fundo, Kristalina Georgieva, com quem discutiu a possibilidade de reduzir ou retirar sobretaxas impostas a países que excedem os limites de empréstimo.

A demanda, caso obtenha sucesso, pode representar uma economia de 900 milhões de dólares por ano à Argentina. Ao deixar a embaixada argentina em Roma no sábado 30, Georgieva demonstrou otimismo: “Discutimos a situação econômica da Argentina e o compromisso entre a equipe econômica e o corpo técnico do FMI de continuar trabalhando para encontrar um caminho a seguir em nosso relacionamento.”

Fernández esteve acompanhado pelo ministro da Economia, Martín Guzmán, e pelo secretário de Assuntos Estratégicos, Gustavo Béliz.

Pelas redes, o presidente argentino afirmou que o objetivo do encontro era “avançar nas negociações que nos permitam sair do ponto social e economicamente insustentável no qual o governo que me precedeu deixou nossa querida Argentina”. Negociar com “firmeza”, prosseguiu, “é recuperar a soberania.”

E Bolsonaro?

No sábado, o presidente brasileiro se encontrou com o secretário-geral da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, a OCDE, Martin Cormann. Não houve, porém, qualquer anúncio de destravamento dos obstáculos à entrada do País no grupo.

“O Brasil fez esforços muito grandes para participar”, disse Cormann após a conversa, “mas faz parte de um processo para decidir quais devem fazer parte.”

Neste domingo, Bolsonaro se reuniu por cerca de 13 minutos com o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom.

Isolamento

No sábado, chamou a atenção da imprensa italiana o fato de Mario Draghi ter evitado apertar a mão de Bolsonaro, após ter cumprimentado muitos outros chefes de Estado. Veículos do país destacaram que o dirigente brasileiro afirmou categoricamente que “não vai se vacinar contra a Covid-19”.

Relato do jornalista Jamil Chade, do UOL, dá conta de que Bolsonaro também esteve isolado na antessala da reunião principal. Ele não foi abordado por qualquer um dos líderes que estavam no local, como Merkel, Justin Trudeau (Canadá), Johnson e Macron. Assim, dirigiu-se à mesa do café e tentou puxar conversa com garçons. “Todo mundo italiano aí?”, perguntou, segundo o repórter brasileiro. O presidente ainda tentou fazer uma piada com a final da Copa do Mundo de 1970, disputada por Brasil e Itália, mas ninguém se divertiu.

Pouco depois, seguranças de Bolsonaro providenciaram uma conversa informal com o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, que durou dois minutos. Questionado sobre as eleições de 2022, o ex-capitão omitiu as pesquisas que apontam a rejeição popular ao governo.

“Eu também tenho um apoio popular muito grande. Temos uma boa equipe de ministros. Não aceitei indicação de ninguém. Fui eu que botei todo mundo. Prestigiei as Forças Armadas”, disse. “Um terço dos ministros [é de] militares profissionais. Não é fácil. Fazer as coisas certas é mais difícil.”

O brasileiro também mencionou a Petrobras, após o turco dizer que o País tem “grandes recursos petrolíferos.”

“Petrobras é um problema. Mas estamos quebrando monopólios, com uma reação muito grande. Há pouco tempo era uma empresa de partido político. Mudamos isso”, acrescentou Bolsonaro.

Ainda antes do evento principal, Bolsonaro trocou poucas palavras com Modi e teve um breve diálogo com Fernández. Ele não reproduziu pessoalmente os ataques desferidos ao país vizinho nos últimos meses em transmissões ao vivo e em contato com apoiadores.

Segundo o jornal Pagina 12, de Buenos Aires, o tema da breve conversa entre os dois foi o futebol. Em julho, antes da final da Copa América, Bolsonaro apostou em uma vitória da seleção brasileira sobre a argentina por 5 a 0. A equipe de Tite, porém, foi derrotada por 1 a 0, no Maracanã.

“Você não ligou para me felicitar pela vitória da Argentina”, disse Fernández a Bolsonaro no G20, em tom de brincadeira.

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