Justiça
CCJ da Câmara aprova PL que prevê a realização de audiências de custódia por videoconferência
Para advogados e especialistas na área criminal, a medida não deveria ser aprovada pelo Legislativo por colocar em risco o mecanismo capaz de conter injustiças


A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira 3, um projeto de lei que prevê a possibilidade de realização de audiência de custódia por videoconferência.
O PL tramita em caráter conclusivo nas comissões, o que significa que, caso aprovado sem recursos por parte de deputados, o projeto deve seguir direto para o Senado, pulando a votação em plenário na Câmara.
A audiência de custódia se tornou obrigatória no Brasil a partir de 2015. A legislação prevê que todos os presos em flagrante sejam apresentados a um juiz em até 24 horas.
A medida visa garantir que o encarcerado tenha todos os seus direitos garantidos e que a legalidade da prisão e a possibilidade de conversão em medidas cautelares sejam avaliados o mais breve possível. É também a oportunidade do preso relatar situações de maus tratos ou tortura por parte dos agentes de segurança pública.
Anteriormente, sem essa obrigatoriedade, muitas vezes o primeiro contato do acusado com o juiz acontecia somente na audiência de instrução e julgamento, muitos anos depois. Situação na qual, não em raras vezes, se era constatado a ilegalidade da prisão, medida excepcional da lei penal.
Em 2021, em decorrência da pandemia de Covid-19, as audiências foram permitidas na modalidade de videoconferência enquanto durasse a emergência sanitária.
A realização de forma remota da audiência, no entanto, é criticada por advogados e entidades de direitos humanos, que apontam que a modalidade remota dificulta a garantia dos direitos, principalmente no tocante a identificar situações de maus tratos.
Essa possibilidade de realização à distância das audiências foi revogada em 2022. Pouco tempo depois, o Supremo Tribunal Federal (STF) defendeu a realização das audiências por videoconferência, somente em casos de urgência.
O projeto votado na CCJ vai além e retoma a possibilidade de realização do encontro entre presos e juízes à distância, não somente em casos em que ficou constatado a urgência, como defendia o Supremo.
Para o advogado Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do Grupo Prerrogativas, o contato pessoal ante os presos e os magistrados pode fazer a diferença entre a permanência no cárcere e a aplicação de medidas alternativas.
Ele avalia o projeto como um absurdo. “O contato pessoal, nesse tipo de situação, é determinante. Ele pode fazer a diferença”, disse.
Marco Aurélio ainda pondera que, sendo a audiência por videoconferência uma mera ocasionalidade, não haveria prejuízos. No entanto, a possibilidade de tornar regra o modelo remoto não pode acontecer.
Para ele, a audiência também permite a interação entre a defesa e o juiz de garantias, condição que poderia ser prejudicada por videoconferência.
Subjetividade
O texto discutido na Câmara transfere ao juiz a decisão sobre qual formato adotar e estabelece os critérios que devem embasar a posição do magistrado, como as peculiaridades do crime, a localizada do cometimento, a periculosidade do agente e os custos envolvidos no transporte e segurança do indivíduo.
Essas alterações modificam o caráter objetivo da lei que prevê as audiências de custódia e coloca elementos subjetivos que podem embasar a decisão do juiz.
A proposta é de autoria da deputada bolsonarista Julia Zanatta (PL-SC).
Para ela, a medida se provou estar “em perfeita consonância com as demais previsões legais, especialmente com os direitos humanos e com a preservação da segurança física do detido”, diz a justificativa do projeto.
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