Política
Bolsonaro compara Covid-19 com HIV: ‘Era voltado a uma classe com comportamentos sexuais diferenciados’
Especialista aponta equívocos na fala do presidente
O presidente Jair Bolsonaro voltou a defender o uso do chamado ‘tratamento precoce‘ contra a Covid-19, que utiliza medicamentos sem a eficácia comprada para a doença. Desta vez, o ex-capitão fez uma comparação com o vírus do HIV.
Em discurso na cidade de Chapecó, nesta quarta-feira 7, o presidente disse que nos anos 80 foi utilizado tratamento precoce contra o HIV e que o vírus ‘era mais voltado para uma classe específica que tinham comportamentos sexuais diferenciados’.
“Naquela época, o que foi usado para combater o HIV? O AZT, era comprovado cientificamente? Não. Se não tivesse usado, não chegaríamos no futuro ao coquetel. Que dá quase uma condição de vida normal aquele que contraiu o vírus.” justificou o presidente.
“Por que não se combateu também? Porque o HIV era mais voltado para uma classe específica, que tinham comportamentos sexuais diferenciados. E também se contraria via injeção e compartilhamento de agulhas. E ninguém foi contra. E chegou-se ao bom termo no futuro. Até hoje não temos uma vacina para isso. A mesma coisa agora a questão do Covid-19. Porque essa campanha contra métodos e médicos e quem fala no tratamento imediato?”, questionou Bolsonaro a seus apoiadores.
O presidente Jair Bolsonaro diz que o HIV não foi combatido quando surgiu porque atingia pessoas com “comportamentos sexuais diferenciados” e usuários de drogas, que na África “não existe nada” e que há uma conspiração global contra o que ele chama de tratamento imediato da Covid pic.twitter.com/yhwxxHJwpL
— Samuel Pancher (@SamPancher) April 7, 2021
Ao fim do discurso, Bolsonaro incentivou a população a não aceitar medidas de isolamento contra a Covid-19. “Não vamos aceitar fique em casa. Esse vírus veio para ficar e vai ficar a vida toda. É impossível erradicar. Até lá vamos fazer o que? O Brasil não pode parar”.
Especialista aponta equívoco
A infectologista da Unicamp e Consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia, Raquel Stucchi, analisa que a fala do presidente é equivocada.
“O Grande equívoco da fala do presidente é que em todo o tratamento da Aids, toda a evolução feita do tratamento, a descobertas de novas drogas e a incorporação desses medicamentos foram baseados em pesquisa científica, que comprovaram a eficácia dos tratamentos. A eficácia foi melhorando conforme novas drogas foram descobertas”, explica.
O mesmo, segundo Raquel, não se aplica à Covid-19.
“Na época, AZT tinha comprovação científica e era melhor que nada. Hoje nós temos um ano de pandemia da Covid-19 e os trabalhos científicos mostram que não existe nenhum tratamento precoce eficaz”, diz,
Chapecó
A cidade catarinense visitada por Bolsonaro é apontada por ele como “exemplo” no combate à covid-19. A viagem foi marcada de última hora, após o prefeito da cidade, João Rodrigues (PSD), celebrar, em um vídeo nas redes sociais, a queda de internações e a desativação de uma unidade de terapia semi-intensiva. Mesmo assim, a ocupação de leitos ainda é alta. De acordo com dados da própria prefeitura, atingiu 93% na rede pública e 100% na privada nesta terça-feira, 6.
O município acumula ainda mais mortes por 100 mil habitantes do que o País e Santa Catarina. A cidade enfrentou colapso de saúde em fevereiro, precisou transferir pacientes, adotar restrições de circulação e ampliar o número de leitos. Chapecó tem 541 mortos pela pandemia, sendo que mais de 410 foram registrados neste ano.
Bolsonaro disse na segunda-feira, 5, que Chapecó faz um “trabalho excepcional” contra a pandemia e deu “liberdade” a médicos para prescreverem o “tratamento precoce”, ou seja, medicamentos sem eficácia para a covid-19, como a hidroxicloroquina. “Não sei como salvar vidas, não sou médico, mas não posso tolher liberdade do médico”, afirmou o presidente no discurso desta quarta.
Desde o início da pandemia, Bolsonaro tem defendido a prescrição de medicamentos como hidroxicloroquina, ivermectina e azitromicina contra a doença. Centenas de estudos científicos realizados até agora nunca comprovaram a eficácia das drogas para combater a covid-19 e, em alguns casos, como da ivermectina mostraram que não há qualquer efeito positivo. O aumento no consumo desses remédios também tem causado reações em pacientes e, como revelou o Estadão, alguns morreram em decorrência de complicações.
Com informações da Agência Estado.
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