Justiça

Áudio revela a pressão de Dallagnol sobre Gabriela Hardt pela condenação de Lula

‘E aí ela disse que vai sentenciar o caso do sítio, mas o outro não tem a menor condição de sentenciar’, disse o procurador após a reunião

O procurador da Lava Jato, Deltan Dallagnol. Foto: Mayke Toscano/GCOM-MT
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A defesa do ex-presidente Lula enviou ao Supremo Tribunal Federal nesta quinta-feira 4 um novo relatório com mensagens trocadas entre procuradores da Lava Jato, sob o comando de Deltan Dallagnol, que reforçam a proximidade entre eles e magistrados responsáveis pelo julgamento de processos em primeira instância.

No início de novembro de 2018, o então juiz Sergio Moro, que respondia pela 13ª Vara Federal de Curitiba, deixou a magistratura para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública no governo de Jair Bolsonaro. Com isso, seu cargo foi assumido interinamente pela juíza federal Gabriela Hardt.

Segundo o material anexado pela defesa de Lula, a força-tarefa de Curitiba tinha um profundo receio de que o novo juiz incumbido em definitivo dos casos da Lava Jato não tivesse o mesmo “perfil” de Moro.

“Ele não sabe quem vem na remoção, torce para ser alguém com ‘perfil’ adequado, mas como a antiguidade é que vai definir, ele não pode fazer nada”, escreveu em 9 de janeiro o procurador Antônio Carlos Welter no grupo dos procuradores no aplicativo Telegram. Ele menciona uma reunião “com o presidente do TRF4 para conversar sobre a 13ª Vara”.

No mesmo dia, os procuradores Paulo Galvão e Jerusa Vicelli expuseram aos colegas o desejo de que Hardt, antes de ser substituída na 13ª Vara, condenasse Lula no caso do sítio de Atibaia. “Ela podia sentenciar o sítio né”, escreveu Galvão. “Ela falou que iria sentenciar”, respondeu Vicelli.

CartaCapital manteve os eventuais erros gramaticais e abreviações dos procuradores.

Os dias seguintes foram de preocupação entre os membros da Lava Jato em relação ao nome do novo magistrado, inclusive com a produção de um mapa de possíveis escolhidos. De acordo com os advogados de Lula, “a toda evidência, a ‘força-tarefa’ queria escolher o juiz que iria substituir SERGIO MORO na 13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba. Alguém que fosse ‘alinhado’ aos propósitos do ‘plano Lula’, o qual, como já demonstrado na petição anterior, envolvia toda sorte de ataques ao Reclamante e à sua Defesa Técnica”.

A defesa do ex-presidente sustenta que, diante desse cenário, o sucesso do “plano Lula” passava por pressionar Gabriela Hardt a proferir rapidamente uma nova sentença. No dia 10 de janeiro de 2019, Dallagnol comunicou aos procuradores uma reunião com a magistrada em que ela foi pressionada a sentenciar os processos contra o petista, desconsiderando centenas de outros casos que aguardavam uma decisão.

Disse Dallagnol, em mensagem de áudio no Telegram, conforme transcrição enviada ao STF:

Isabel, falei com a Gabriela. A Gabriela, é…, perguntei dos casos né, perguntei primeiro do caso do sítio, se ela ia sentenciar. É, aí ela disse: “Olha, você está vendo isso aqui na minha frente?” – aí tinha uma pilha de papel grande na frente dela. Eh, eu falei: “Tô”. Ela falou: “O que você acha que é isso aqui?”. Aí eu sei lá, chutei lá qualquer coisa. Aí ela falou: “Isso aqui são as alegações finais do Lula”. É, que estão lá com umas 1.600 páginas. Aí ela falou: “Olha, tô tentando fazer isso aqui, tá todo mundo esperando que eu faça isso, mas tô aqui eu e o Tiago, e fora isso aqui – que é uma sentença – eu tenho mais 500 casos conclusos pra decisão. Que horas eu vou fazer isso aqui? Só se eu vier aqui e trabalhar da meia noite às seis. Tem todas as operações. Tem as prisões que vocês pediram. Tem isso, aquilo”. Então ela tá assim bem, bem, ela falou de um modo bem cordial, toda querida, com boa vontade, querendo fazer o melhor, mas ela tá bem, assim, bem esticada. Sabe? E aí ela disse que vai sentenciar o caso do sítio, mas o outro ela não tem a menor condição de sentenciar. E já abriu hoje o edital de remoção, hoje mesmo dia 10, e vai estar encerrado dia 22. Então isso aí, certamente vai ficar pro próximo juiz. É, se você tiver alguma ideia, alguma proposta pra fazer algo diferente, a gente precisaria ir lá conversar com ela, mas, assim, eu senti as portas bem fechadas pra isso. Parece bem inviável, mas se tiver alguma sugestão diferente vamos pensar juntos sim. Beijos.

Ouça o áudio:

Essa conversa entre Dallagnol e Hardt aconteceu três dias depois de a defesa de Lula apresentar as alegações finais no caso do sítio, com mais de 1.600 páginas. Além disso, como revela Dallgnol, Hardt tinha cerca de 500 processos pendentes de decisão judicial. O diálogo, no entanto, reforça que a prioridade deveria ser a condenação de Lula.

27 dias depois da reunião, veio a sentença. Lula foi condenado no caso do sítio de Atibaia, em 6 de fevereiro de 2019, a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro. A defesa pontua que a decisão foi tomada mediante “‘aproveitamento’ de sentença anteriormente proferida pelo ex-juiz SERGIO MORO no caso do ‘triplex’ — situação que ficou conhecida na imprensa como ‘sentença copia e cola'”.

A propósito do caso do sítio de Atibaia, os advogados de Lula resumiram as etapas até a condenação em uma linha do tempo:

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