Política

As expectativas da campanha de Lula depois da carta aos evangélicos

O ex-presidente não queria uma carta, mas aliados argumentaram que as fake news no campo evangélico estavam em ‘nível devastador’ e precisavam ser rebatidas

O ex-presidente Lula (PT) durante encontro com evangélicos. Foto: Ricardo Stuckert
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Após a realização do esperado encontro do ex-presidente Lula (PT) com pastores, nesta quarta-feira 19, a campanha petista planeja usar o conteúdo da carta de “compromisso com evangélicos” em materiais de campanha nas ruas e nas redes sociais e avalia aproveitar imagens na propaganda eleitoral na TV.

Uma versão do texto já estava pronta há pelo menos uma semana e levava o título de “carta aos cristãos”, mas Lula vinha dizendo ter medo de ser obrigado a escrever cartas a vários outros setores da sociedade.

Além disso, um integrante da campanha afirmou que o ex-presidente se sente ofendido por ter de rebater acusações que não condizem com a sua conduta no campo religioso, à luz dos seus dois governos.

No entanto, aliados de Lula favoráveis à divulgação da carta argumentaram que as fake news no segmento evangélico alcançaram um “nível devastador”, superior ao de outros grupos sociais.

Apesar de ter cedido às argumentações, Lula preferiu não fazer a leitura da carta. A tarefa ficou com o ex-ministro Gilberto Carvalho. Na sequência, o ex-presidente se queixou de sempre precisar se justificar em relação ao tema.

“Eu queria contar uma coisa para vocês. Desde que eu e outros companheiros criamos o PT, a gente vive tendo que se explicar. Não é a primeira vez que nós fazemos carta aos evangélicos. Toda eleição, há uma quantidade de mentiras neste País que nós precisamos fazer carta, ora à Igreja Católica, ora à Igreja Evangélica”, declarou.

Articulada pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), a versão final da carta foi fechada na véspera por Carvalho. Ambos dizem ter ocorrido contribuições de “muitas mãos”, mas Lula fez diversas revisões do conteúdo.

O petista teria reivindicado inserir, logo no início da carta, algumas recordações sobre a sua passagem no Palácio do Planalto. A primeira frase do documento diz: “A grande maioria dos brasileiros e brasileiras que viveram os oito anos em que fui Presidente da República sabe que mantive o mais absoluto respeito pelas liberdades coletivas e individuais, particularmente pela Liberdade Religiosa”.

E acrescenta: “Como todos devem se lembrar, no período de meu governo, tivemos a honra de assinar leis e decretos que reforçaram a plena liberdade religiosa. Destaco a Reforma do Código Civil assegurando a Liberdade Religiosa no Brasil, o Decreto que criou o dia dedicado à Marcha para Jesus e ainda o Dia Nacional dos Evangélicos”.

Já os evangélicos que colaboraram com a produção da carta apontaram a necessidade de falar sobre o fechamento das igrejas. Um dos trechos diz: “Posso lhes assegurar, portanto, que meu governo não adotará quaisquer atitudes que firam a liberdade de Culto e de Pregação ou criem obstáculos ao livre funcionamento dos Templos”.

Também se percebeu a necessidade de desmentir alegações de que o ex-presidente instauraria leis cuja competência recai sobre o Congresso Nacional ou o Judiciário, como a liberação do aborto e a descriminalização do uso de drogas. “Lembro a todos e todas que este não é um tema a ser decidido pelo Presidente da República e sim pelo Congresso Nacional”, diz outro trecho da carta.

Para Eliziane Gama, o ato de Lula não significa que a pauta religiosa tenha retirado o protagonismo da questão econômica na eleição. Ela reforça que era o único campo que demandava uma carta específica.

“Por que o Lula está fazendo uma carta a esse segmento e não para os demais? Porque com os demais se conversa na área da economia. Aqui, nós estamos num campo religioso, onde as fake news são absurdas. Ou você fala de uma forma clara e direta, ou essas fake news serão infelizmente multiplicadas”, afirmou.

Ainda que Jair Bolsonaro (PL) lidere as intenções de voto entre os evangélicos, a campanha petista identificou um segmento de evangélicos indecisos que ainda podem ser disputados.

Em uma tentativa de sair da defensiva, Lula tem feito críticas a Bolsonaro sobre o uso indiscriminado da religião com objetivo político e relembrado o escândalo recente do “pintou um clima” com menores de idade.

O candidato do PT, porém, não prevê novas agendas semelhantes. Ele resiste à ideia de entrar em uma igreja evangélica para alguma agenda de campanha, por entender que templo não é local para promover atos do tipo.

Aliados pretendem organizar mobilizações, ainda que sem a presença de Lula. Um dos focos é o Rio de Janeiro, onde Bolsonaro venceu em 70 municípios, com 51% dos votos, e Lula em apenas 22, com 40%.

Após passar pelo Rio Grande do Sul nesta quarta, o petista fará agenda na zona oeste do Rio. A campanha avalia que a ajuda do prefeito de Belford Roxo, Waguinho (União Brasil), tem sido relevante. Também houve uma percepção de que a passagem pelo Complexo do Alemão teve resultado positivo para Lula e má repercussão para Bolsonaro, devido a declarações preconceituosas sobre moradores de favelas.

Ainda assim, há poucas chances de virar o placar no Rio de Janeiro. A meta é reduzir a distância.

O ato de Lula no Complexo do Alemão foi alvo de declarações preconceituosas de Bolsonaro. Foto: Ricardo Stuckert

A tarefa de Lula é conseguir ampliar votos no Nordeste, em estados como Pernambuco, Bahia e Maranhão e frear a desvantagem no Sudeste. Para isso, precisa não só reduzir a distância no Rio, mas manter a liderança em Minas Gerais, onde o governador Romeu Zema (Novo) e vários prefeitos apoiam Bolsonaro.

Após o Rio, na sexta-feira 21, Lula passará pelos municípios mineiros de Governador Valadares, Teófilo Otoni e Juiz de Fora, provavelmente ao lado de Simone Tebet (MDB). Apesar de ter desmarcado presença no debate do SBT, há uma articulação para que Lula dê entrevista a uma afiliada da emissora em Minas, a TV Alterosa. A entrevista seria exibida na mesma data do debate.

O encontro com evangélicos é mais uma agenda “fura-bolha” da semana. Na segunda-feira 17, um evento com Tebet pregou o voto em Lula a banqueiros e empresários indecisos, com direito a sugestões de argumentos como “Foca no Alckmin” e “A Venezuela já é aqui”.

Na terça 18, Lula deu uma entrevista ao Flow, canal no YouTube criado em 2018 e popular pela transmissão de entrevistas informais. O ex-presidente superou a marca de 1 milhão de visualizações e bateu recorde de Bolsonaro.

Para a campanha, a agenda no Flow foi um dos principais acertos do segundo turno. Os coordenadores avaliam combinar uma nova entrevista nesse formato. Uma das sugestões vindas das redes sociais é o canal do influenciador Casimiro.

O otimismo com a vitória permanece, mas aliados afirmam que os próximos dez dias serão “sangrentos” e que o debate da TV Globo no dia 27 demandará um “nocaute” nos discursos de Bolsonaro.

Além disso, o receio da abstenção persiste. Mesmo que o Supremo Tribunal Federal tenha autorizado gestores locais a oferecer transporte gratuito no dia da eleição, a ação não será unanimidade no País. Segundo uma avaliação à reportagem, é difícil superar a abstenção motivada por aspectos econômicos.

Na véspera da eleição, o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, deve fazer um pronunciamento para chamar os eleitores a votarem. Há uma avaliação de que o feriado de 2 de novembro, na quarta-feira seguinte à votação, favorece a abstenção de setores da classe média que costumam viajar. Porém, se a abstenção for maior entre os mais pobres, o prejudicado pode ser Lula, por ter nessa camada a sua mais expressiva intenção de votos.

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