Política

Alckmin também vai escapar da crise da “reorganização”?

A tendência é que sim, pois ele e o PSDB sabem navegar com maestria o eleitorado paulista

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Uma característica comum aos críticos do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), é a dificuldade de conceber como o tucano consegue passar incólume por crises criadas dentro de seu próprio gabinete ou por auxiliares diretos. A atual adversidade, provocada pela chamada “reorganização” do ensino estadual, vem sendo explorada por alguns opositores, mas dificilmente vai prejudicar a imagem do governador. 

A “reorganização” foi um ato típico das gestões Alckmin: bolada e desenvolvida dentro do governo, sem qualquer tipo de participação popular. Não à toa, a ideia provocou pânico em pais e alunos que verão suas escolas fechadas e serão obrigados a mudar toda sua rotina e hábitos sem terem sido consultados. Em reação, diversos alunos se mobilizaram e ocuparam cerca de 200 escolas estaduais, em uma tentativa de fazer o governo recuar. 

O caráter centralizado da “reorganização” foi notado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que negou a reintegração de posse das escolas ocupadas pelos alunos alegando, entre outras coisas, que a “reorganização” de Alckmin viola o preceito de gestão democrática da educação básica previsto na lei 9.394 / 1996. 

Sem o apoio da Justiça paulista, o PSDB mudou de estratégia. Ela foi destrinchada por Fernando Padula, chefe de gabinete de Herman Voorwald, o secretário de Educação de São Paulo. Homem do PSDB na pasta, Padula disse a dirigentes regionais de ensino, em áudio vazado pelo site Jornalistas Livres, que era preciso retratar as ocupações como “radicalizadas” e dar início a uma “guerra de informação” para desmobilizá-las. 

A estratégia de Padula e Alckmin está em curso desde a segunda-feira 30 e tende a funcionar. Ela mostra como Alckmin e o PSDB navegam São Paulo com maestria, sendo praticamente imbatíveis em eleições realizadas no Estado.

Em outubro passado, após a reeleição de Alckmin, a revista Época publicou reportagem atribuindo a vitória fácil de Alckmin sobre Alexandre Padilha (PT) e Paulo Skaf (PMDB) ao fato de que ele “soube entender as ruas de junho”. O título recebeu diversas críticas, mas o diagnóstico parece correto. 

Uma das heranças mais fortes de junho de 2013 é a onda reacionária atual. No início, aqueles protestos ganharam corpo por conta da violência policial, mas no fim das manifestações boa parte da população estava mais preocupada com o que via como ameaça representada pelos black blocs.

Apresentar as ocupações das escolas como organizadas por baderneiros, como deseja fazer Padula, é um chamamento à necessidade de ordem que tem enorme apelo com o eleitorado paulista.

Ao mesmo tempo, a gestão Alckmin tenta atribuir as ocupações a “grupos políticos” que estariam instrumentalizando a questão educacional. Coube ao próprio governador fazer essa acusação, nesta quarta-feira 2. “Há uma nítida ação política”, disse ele em entrevista coletiva. Alexandre de Moraes, o secretário de Segurança, fez eco ao alertar sobre os “infiltrados”.

“Não são manifestantes da rede pública. Há pessoas ligadas a partidos políticos e a movimentos sociais que estão querendo aproveitar uma bandeira dos estudantes para se manifestar de forma errada, depredando o patrimônio público”, disse. “O que podemos esperar em São Paulo é o cumprimento da lei”.

Apesar de ter dedicado sua vida à política, Alckmin costuma denunciar a presença dela na vida social do País, em especial quando se vê acossado. Nas greves de metroviários, de professores, nas investigações do cartel de trens nas gestões do PSDB e nas críticas da Agência Nacional de Águas a sua gestão hídrica, o tucano denunciou “ações políticas” semelhantes. 

A crítica à política, e sua negação de fato, é outro sentimento compartilhado por Alckmin com o rescaldo de junho de 2013 – foram marcantes em São Paulo, no fim dos protestos daquele fatídico mês, as agressões físicas a quem se identificava como integrante ou simpatizante de partido político. Até hoje, em diversas manifestações populares o sentimento de rejeição aos políticos, aos partidos e à política como um todo são facilmente observados.

Neste clima, o perfil anódino de Alckmin, mais de administrador ou gerente do que de político, agrada. A atuação do governador, entretanto, não é de todo construída. Em boa parte, ela é genuína, o que a torna particularmente eficiente, pois faz de Alckmin a personificação do cidadão comum do estado. 

Em dezembro de 2014, um integrante de sua campanha foi bastante explícito sobre este aspecto da personalidade do governador. “Ele não é elitista, parece uma pessoa comum da classe média. Por isso, praticamente não precisa de pesquisas de grupo. O que ele pensa é o que pensa a média da população”, disse em entrevista à revista Piauí.

A favor de Alckmin conta também a simpatia da grande imprensa ao PSDB, em parte existente por conta da antipatia desta com o PT. Muito mais que a violência policial na repressão às ocupações, ecoa com força nos sites e jornais a denúncia de “ação política” feita por Alckmin. 

A acusação respinga automaticamente no PT, apesar de não ser ancorada em fatos. Como CartaCapital mostrou em maio, o Partido dos Trabalhadores tem uma atuação inexpressiva como oposição a Alckmin. Em troca de cargos e sob protestos de alguns de seus integrantes, o PT apoia o presidente da Assembleia Legislativa, Fernando Capez, do PSDB de Alckmin. 

São Paulo é o estado brasileiro governado há mais tempo pelo mesmo partido, e Alckmin é o governador que mais tempo esteve à frente do Palácio dos Bandeirantes. As gestões do PSDB, assim como as de Alckmin, não têm nenhum projeto marcante, a polícia é violentíssima, sobram denúncias de corrupção no Rodoanel e no metrô e boa parte do estado foi afetada de forma dura por uma crise hídrica provocada por falhas de governança. 

Agora, está exposta à luz do dia sua estratégia de deslegitimar os alunos manifestantes, em vez de dialogar, mas mesmo assim não há sinais de que o governador enfrentará alguma instabilidade. Em outubro de 2014, 12 milhões de pessoas mostraram que o eleitorado de São Paulo é Alckmin. Mas Alckmin é São Paulo. E sabe governar sem ser importunado por seus críticos.

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