Política

A tentativa de Torres de ligar o PT a facções criminosas para justificar as operações no 2º turno

A anotação que indica a pressão do ministro para ligar o partido de Lula a um esquema de compra de votos e ações de grupos criminosos no Nordeste consta no celular de sua principal auxiliar

O ex-ministro da Justiça Anderson Torres. Foto: Sergio Lima/AFP
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O ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, um dos principais auxiliares de Jair Bolsonaro no governo anterior, pressionou para que integrantes do seu ministério tentassem ligar o PT a facções criminosas no Nordeste, em especial na Bahia, na véspera do 2º turno na eleição de 2022. A ação ajudaria a justificar o aumento das operações policiais na região.

O caso foi revelado pelo jornal Folha de S. Paulo nesta sexta-feira 6 a partir de uma anotação encontrada no celular de Marília Ferreira, a delegada da Polícia Federal que era a principal auxiliar de Torres no comando da pasta. O texto está em posse da CPMI do 8 de Janeiro.

Segundo a anotação, “havia certa pressão” de Torres para ligar o PT a grupos criminosos no Nordeste após derrota de Bolsonaro para Lula no primeiro turno. O pedido do ministro indicava “preocupação” com a Bahia, onde Lula recebeu 72% dos votos na disputa contra o ex-capitão.

“Havia uma preocupação do ministro com o Nordeste e ele falava muito na Bahia, pois havia visto no mapa com o planejamento do primeiro turno que havia muito pouca distribuição de equipes no interior da Bahia. Desde antes do primeiro turno a DINT [Diretoria de Inteligência] recebia dezenas de vídeos e postagens de pessoas, a maioria delas fake news, sobre compra de votos e ligação do PT com facções criminosas”, diz trecho do texto encontrado no bloco de notas do celular da delegada.

“Havia uma certa pressão para que eu fizesse um relatório que indicasse a relação do PT com facções criminosas, pois havia alguns indicativos disso, mas não fizemos porque não havia comprovação”, diz outro trecho do texto revelado pelo jornal.

No decorrer da mensagem, que é toda escrita em primeira pessoa, a pressão de Torres para que agentes tentassem encontrar essa ligação fica clara. “Toda notícia ou informe que chegava, tentávamos fazer a confirmação, pedindo o BO [boletim de ocorrência] ou consultando o centro de inteligência respectivo”, descreve na mensagem. “Então, algo que estava arraigado ali”.

Não está clara a data exata da produção do texto encontrado no aparelho. A Apple, responsável por entregar a anotação aos parlamentares, informa apenas que os dados entregues são do período entre 31 de dezembro de 2021 e 18 de agosto de 2023 e que estavam no bloco de notas do celular da delegada.

As informações contidas, ali, no entanto, reforçam a suspeita de que o esquema policial montado pela gestão do ministro no 2º turno era político. Naquele momento, blitze da Polícia Rodoviária Federal foram montadas de última hora em locais onde o PT havia obtido vitória eleitoral no 1º turno. A suspeita é de uso político da força policial. Marília e Torres são os principais alvos dessa investigação.

Foi justamente a delegada, que ocupava o cargo de diretora de Inteligência do Ministério, quem produziu o relatório e o mapeamento que embasa a suspeita de que a operação tenha sido feita para dificultar a locomoção de eleitores de Lula. A anotação engrossa a lista de provas contra a dupla.

Um outro trecho da mensagem reforça essa mobilização do Ministério e seus braços policiais para a tentativa de implicar o PT e justificar a operação montada pelo ministro para, ao que tudo indica, favorecer o ex-presidente Bolsonaro.

“Márcio [diretor-geral da PF na ocasião] perguntou se havia relatório de inteligência sobre isso [relação do PT com grupos criminosos], eu disse que ia tentar ver se conseguíamos demonstrar o incremento de crimes eleitorais para que houvesse justificativa de aumento de efetivo em relação ao segundo turno”, detalha a delegada no texto. “Porém, conversei com o Tomás [supostamente Tomás Vianna, ex-coordenador de inteligência do ministério], e concluímos que não havia esse incremento”, conclui.

A mensagem, diz ainda o jornal, sugere que Torres iria demitir o diretor da PF em caso do vitória de Bolsonaro sob a justificativa de ter feito “corpo mole” para cumprir suas ordens no episódio em questão.

As defesas de Marília e Torres, ao jornal, disseram não ter conhecimento do texto por não terem tido acesso ao documentos citados pela publicação.

“Se ela existir, é sigilosa e seu vazamento deve ser apurado”, alegou a defesa da delegada para não comentar. Já o advogado de Torres informou ter tido conhecimento da mensagem pela imprensa e não de forma oficial e, por isso, não iria se manifestar.

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