Randolfe Rodrigues

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É senador pela Rede/AP, professor, graduado em História, bacharel em Direito e mestre em Políticas Públicas.

Opinião

Randolfe: Depoimentos na CPI indicam prevaricação do governo federal

‘Começa a ficar delineada a negligência do Planalto em relação a temas centrais no enfrentamento da pandemia’, escreve o senador

Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado
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A CPI da Covid encerrou a segunda semana de trabalhos e já é possível enumerar algumas importantes conquistas desde o início das investigações, notadamente a mudança de postura do governo federal em relação ao enfrentamento da crise desencadeada pelo novo coronavírus. Como afirmamos anteriormente, a sua simples instalação se constituiu numa medida sanitária de combate à Covid-19, ainda que a tragédia humanitária que assola o Brasil esteja descontrolada.

O estabelecimento de um comitê científico para acompanhamento e deliberação acerca das medidas de enfrentamento ao coronavírus, por exemplo, é algo a ser comemorado, ainda que tenha transcorrido mais de um ano desde o início da crise sanitária para a sua criação. Mas não ficou só nisso: bastou a instalação da CPI para que o governo federal decidisse veicular campanhas informativas sobre a importância do uso de máscaras, isolamento social e medidas sistemáticas de higiene pessoal, como o uso de álcool em gel para limpeza das mãos.

Outra mudança de postura observada é em relação às vacinas contra o novo coronavírus. Antes da comissão, os imunizantes eram vistos com desconfiança pelo governo federal. A campanha de desinformação chegou ao cúmulo de levantar a hipótese de que pessoas vacinadas sofreriam alterações em seu código genético, além da defesa enérgica feita pelo governo da não obrigatoriedade de vacinação. Entretanto, nas últimas semanas o que vimos é um tardia movimentação do governo federal para aquisição de imunizantes e a mudança de discurso sobre a importância das vacinas para a saúde coletiva.

Aqui cabem parênteses esclarecedores: em 2020 o governo se esquivou de adquirir vacinas com o argumento de que somente aquelas com registro aprovado na Anvisa seriam compradas. A preocupação era justificada em função da segurança na administração desses medicamentos. Porém, em 2021, essa orientação parece ter sido esquecida. Afinal, nas últimas semanas vimos o Ministério da Saúde se organizando para aquisição da Covaxin, vacina indiana ainda sem registro no Brasil. Qual a razão para repentina mudança? Acreditamos ser devido à CPI da Covid.

Os depoimentos colhidos até agora sugerem prevaricação do governo federal na aquisição de vacinas. Ficamos sabendo que ainda em setembro do ano passado indústrias farmacêuticas tentaram negociar a venda de imunizantes ao Brasil, sendo reiteradamente ignoradas. Quantas vidas poderiam ter sido salvas caso não fossem desprezadas as inúmeras tratativas? Essa e outras perguntas a CPI da Pandemia pretende responder.

Importante frisar que esta comissão parlamentar de inquérito não investiga pessoas e sim fatos. Neste sentido, a tese de que o governo federal apostou na estratégia da imunização de rebanho, isto é, a porcentagem suficiente de pessoas contaminadas para a criação de uma barreira natural contra a propagação do vírus – começa a ganhar força.

Além da imunização de rebanho, também fica patente o protagonismo da cloroquina e derivados no tratamento da covid-19 mesmo diante de inúmeras evidências científicas demonstrando sua ineficácia. Aqui também cabem parênteses importantes sobre o tema: depoimentos indicam que o Ministério da Saúde levantou a hipótese de alterar a bula da cloroquina para que esta fosse indicada no tratamento de pessoas contaminadas pelo novo coronavírus.

Ainda há muito a ser investigado e os trabalhos estão apenas no início. Entretanto, começa a ficar delineada a negligência do governo federal em relação a temas centrais no enfrentamento da pandemia do novo coronavírus. Em que pese a tentativa da base do governo de tumultuar os trabalhos da CPI, a tendência é que os próximos depoimentos aprofundem o entendimento da estratégia utilizada no Brasil e cujas consequências podem ser medidas pelas mais de quatro centenas de milhares de vidas perdidas para a covid-19 no país.

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