Na Fazenda do Sertão não havia eletricidade naqueles anos 1960. E eu me lembro bem de que a nossa roupa, naqueles julhos que passávamos lá, era passada a ferro de brasa.
Era um ferro bem pesado, meio feioso e eu, curioso, ficava espiando aquela idosa passando cada peça e, de tempos em tempos, abrindo sua tampa e colocando pequenos cubos de brasa pra coisa não esfriar.
Lamento não me lembrar o nome daquela pessoa idosa, negra, franzina, saia comprida e lenço branco escondendo os cabelos.
Saía fumaça e um cheiro de queimado contaminava o ambiente. Nossas camisas e calças curtas iam sendo empilhadas e eu costumava cheirar para sentir aquele defumado.
Depois, com o progresso, veio o ferro elétrico, que acabou mudando a história e transformando aquele monstrengo a brasa em peça de decoração.
Me lembro que durante muito tempo, na minha casa, ele ficava no chão, segurando a porta para não bater, soprada pelo vento.
Na casa da minha tia, ele ficava na sala, aberto, cheio de flores secas.
Agora, em dois mil e vinte e quatro, essa geração resolveu não mais passar roupa, perder tempo passando peça por peça.
Eu talvez seja o último, mas passo. E gosto de passar. Instalo a mesa na sala e é geralmente no domingo de manhã, espiando o Globo Rural, depois o Esporte Espetacular.
Não gosto de roupa amassada, talvez na memória me venha uma frase da minha mãe, quando eu vestia uma camisa meio troncha:
– Parece que você tirou essa roupa de dentro de uma garrafa!
Meus filhos, todos casados, acho que nem têm ferro em casa. E olha que eu nem percebo se eles andam assim meio amassados.
A única coisa que ainda não faço é mandar consertar o ferro quando ele estraga. Hoje em dia, trocar a resistência fica o preço de um novo.
Como o meu anda meio velhinho, resolvi comprar um novo e fui pesquisar na Internet. Gente, encontrei um ferro elétrico Mondial preto, bonitão, na Amazon, por 67 reais e 89 centavos, o preço de um lanche na Fabrique.
Sessenta e sete e oitenta e nove centavos, francamente tá de graça.
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