Instituída no primeiro dia do governo Mario Covas (1º/1/1995), a Ouvidoria de São Paulo, primeira do país, mereceu Lei Complementar em 1997, quando seu titular, o ouvidor, passou a ter mandato e ser escolhido pelo governador a partir de lista tríplice enviada a ele pelo Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana. Entre suas atribuições, estão o recebimento de denúncias de violações de direitos, encaminhamento de casos para órgãos corregedores, acompanhamento e cobrança. Desde então, a ouvidoria já enviou 50 recomendações ao governador.
A proposta do PLC 31/2019 é uma ameaça aos cidadãos e cidadãs e aos próprios agentes das corporações (que também se queixam de abusos internos e más condições de trabalho na Ouvidoria), à transparência do serviço público e com isso, à democracia. Se aprovada, vai aumentar a impunidade policial e pode representar um retrocesso histórico na luta por uma segurança pública mais eficiente, cidadã e respeitadora de direitos.
O projeto teve voto contrário de seu relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Alesp, deputado Emídio de Souza, recebeu pronunciamentos contrários da OAB paulista e do jurista Fabio Konder Comparato, e teve cinco pedidos de deputados e deputadas para retirar seus nomes da coautoria.
No entanto, permanecem como coautores da ideia autoritária os deputados e deputadas Frederico d´Avila, Adalberto Freitas, Agente Federal Danilo Balas, Castello Branco, Gil Diniz, Letícia Aguiar, Tenente Nascimento, Tenente Coimbra, Coronel Nishikawa, Major Mecca, Valéria Bolsonaro – todos do PSL –, Conte Lopes, Coronel Telhada, Delegado Olim e Professor Keny (PP), Barroz Muhoz (PSB), Douglas Garcia e Roque Barbiere (PTB) e Sargento Neri (Avante).
Fica evidente, até pelas patentes exibidas, a participação majoritária de figuras proeminentes da chamada “bancada da bala” – aquela turma pra qual, na dúvida, se atira para matar –, em particular os ligados à Polícia Militar. Os defensores da proposta afirmam que a Ouvidoria sempre foi um espaço para a revanche contra policiais, que gasta muito e que foi sempre foi gerida “por partidos”. Foi o que se ouviu de Frederico D’Ávila e outros defensores da ideia na Audiência Pública virtual realizada no último 24 de agosto.
Nessa mesma ocasião, porém ficou evidente a existência de um “racha”, pois a imensa maioria da Polícia Civil de SP não tem acordo sobre extinguir a Ouvidoria, começando pela cúpula da corporação, porém o comando da PM manteve até agora silêncio cúmplice sobre o PLC.
O sociólogo Benedito Mariano, ex.-Ouvidor, que trabalha como assessor da minha mandata, também participou da Audiência e afirmou: “Falar em acabar com o órgão por razões de economia é cínico: o gasto da Ouvidoria é irrisório”. Mariano recorda que, além do ouvidor, com salário de R$ 6.400, ela conta com 15 assessores, cinco com salário de R$ 5 mil e 10 com salário de R$ 4 mil, congelados há 20 anos.
Segundo Mariano, “dizer que as polícias já têm as corregedorias também é equivocado, porque estas últimas são órgãos internos da civil e da PM, e a Ouvidoria é um ente de controle social, vinculada ao gabinete do secretário”. O sociólogo destacou ainda que “a transparência não atrapalha, mas qualifica a polícias, sem falar que a Ouvidoria recebe demandas e queixas dos policiais”.
Há muitas forças a favor e muitas contra o retrocesso que seria a extinção da Ouvidoria. Ainda falta, no entanto, um amplo movimento de divulgação da existência da ameaça e de repúdio por parte da sociedade civil. Divulgue a tramitação do PLC 31/19 e seja contra essa ameaça!
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