Opinião

O Brasil tem terra para si e para todos os refugiados do mundo

Eis uma plataforma eleitoral: inserir o direito à terra e à água no artigo 6 da Constituição Federal, em que se encontram explicitados os direitos humanos

Manifestação do Movimento dos Sem-Terra - Foto: Agência Brasil
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“A intertextualidade é um fenômeno constitutivo das produções de sentido e poderá acontecer entre textos de diferentes linguagens. Todo texto é um resultado de outros textos, isso significa que não são puros, pois a palavra é dialógica. Quando se diz algo num texto, se faz em resposta a um outro que já foi dito, em estilos e gêneros diferentes, em outros textos. Pode-se concluir que um texto é sempre oriundo de outros textos orais, iconográficos ou escritos.”
Bruno Carneiro Lira.

Ler é um prazer; compartir a leitura, júbilo redobrado, completo, pois compartilhar traz enorme satisfação.

Percebe-se isso ao viajar só: após algum tempo, percebemos que estamos plenos de sensações e ansiamos por dividi-las. Um pouco como a verdadeira riqueza acumulada, seja em livros, revistas ou outros artigos culturais; como que clamam por partir, ilustrar outras pessoas; assim como a água, que busca fluir, passear, no caso, por outras mentes, paisagens, viver de fato a liberdade.

Como é triste o cerceamento da liberdade!

A Comissão Pastoral da Terra (CPT), da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), divulgou nesta segunda-feira 18 sua publicação “Conflitos no Campo 2021”.

A CPT apurou 35 assassinatos no campo em 2021, com aumento de 75% com relação a 2020. Os registros de trabalho escravo também aumentaram, na mesma proporção.

São números dramáticos para um país com tanta terra, mas tão desprovido do direito humano à terra e à água.

Eis uma plataforma eleitoral: inserir o direito à terra e à água no artigo 6 da Constituição Federal, em que se encontram explicitados os direitos humanos.

O Brasil tem terra para si e para todos os refugiados do mundo! Não compartilha-la entre os sem-terra é crime que clama aos céus!

Mas como estamos longe da equidade, no Brasil e no mundo!

Em “O método Brecht” (editora Vozes), Fredric Jameson, cita Bertold Brecht, numa passagem ilustrativa da aleatoriedade a que estamos submetidos pelo capitalismo irracional. São as seguintes as recordações de Brecht: “Uma espécie de acidente de trabalho me ajudou. Para uma certa peça eu precisava do valor do trigo na bolsa de valores de Chicago como pano de fundo. Pensei que seria capaz de obter a informação necessária rapidamente fazendo algumas investigações entre especialistas e profissionais. Ocorreu o inverso. Ninguém, nem escritores conhecidos das áreas de economia e negócios – viajei de Berlim a Viena atrás de um corretor que trabalhara toda a sua vida na bolsa de Chicago – ninguém conseguia explicar adequadamente os processos relativos à cotação do trigo para mim. Fiquei com a impressão de que esses processos eram simplesmente inexplicáveis, isto é, que não eram para ser apreendidos pela razão, ou seja, eram ilógicos. De todo e qualquer ponto de vista, exceto o de meia dúzia de especuladores, este mercado de cereais era um enorme mistério.”

No entanto, se os despossuídos não compartem o saber das oligarquias, repartem o ocaso, aliás, suportam-no quase por completo.

Nesse sentido, agrega o grande dramaturgo alemão, citado por Jameson:

“Quando cai a casa de um grande senhor,

Muitos pobres são esmagados.
Os que não compartilham a fortuna do poderoso
Frequentemente compartilham seu fado. A queda da carroça
Arrasta consigo os bois suados

Para o fundo do abismo.

“Nestes dias em que vemos a oligarquia local e seu corpo pretoriano – os militares – cada vez mais como cleptocracia, que chega a fruir com dinheiro público itens pornográficos (literalmente), cabe refletir sobre as formas de fazer política e superar o desgoverno dos ladrões.

A propósito, reflete Brecht, secundando Karl Marx, sempre na referida obra de Jameson: “Os filósofos burgueses insistem na distinção fundamental entre ação e contemplação. Mas o pensador verdadeiro (o dialético) não faz essa distinção. Se você a fizer, você deixa a política para aqueles que agem e a filosofia para aqueles que contemplam, enquanto na realidade o político deve ser um filósofo e o filósofo um político.”

Se o “político” é o habitante da polis, a cidade, na etimologia grega, não somos todos políticos e políticas?

Jameson complementa aquela reflexão de Brecht: “É evidente, a partir da gama temática das outras notas e escritos de Brecht, que quaisquer outras oposições “ocidentais” ou burguesas fundamentais também se incluem aqui – aquela entre trabalho mental e manual, por exemplo, ou entre arte e vida, entre governante e governado etc.”

Nas eleições que se aproximam, não devemos nós também assimilarmos o conceito de “político” ao de “cidadão”?

Quais instrumentos de participação serão propostos para que a participação mais ampla ocorra, em todos os campos das políticas públicas, indo da política externa à defesa?

Dessa maneira, será possível derrotar o fascismo e a cleptocracia, quiçá para sempre.

 

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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