Esther Solano

esther@cartacapital.com.br

Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Complutense de Madri e professora de Relações Internacionais da Unifesp

Opinião

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Em defesa do voto útil

Esta eleição é diferente de todas as outras. É tudo ou nada, vida ou morte

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No Datafolha divulgado em 15 de setembro, Ciro Gomes aparece com 8% e Simone Tebet registra 5%.

Eis os dados. Uma grande diferença entre democratas e terraplanistas é que nós acreditamos na importância dos dados, na relevância de pesquisas metodologicamente robustas. Nós, os democratas, utilizamos dados para guiar nossas percepções políticas, escolhas e racionalidade. Nós, os democratas, sabemos da relevância que a ciência, a construção coletiva do conhecimento, deve ter na sociedade. Não é? Então, eis aí os dados. Os votos de Ciro e Simone, juntos, não chegam a 15%.

Sim, óbvio, também sabemos que política vai muito além dos dados. É paixão, tesão, afeto, ódio, ideologia, posicionamento, ressentimento, indiferença. É programa, propostas, ideias. Na verdade, política é tudo, porque a política é a representação da vida. Então, entendo perfeitamente os eleitores que ainda hoje enfatizam o voto em Ciro ou Simone. Boas-vindas a esses eleitores, em nome da saúde democrática, pois nada mais importante para uma democracia viva e saudável do que a pluralidade de projetos políticos.

Entendo também que uma parte desses eleitores, e talvez não seja inexpressiva, votará em Bolsonaro em um eventual segundo turno, porque o antipetismo fala mais alto do que qualquer outro afeto político. Não quero, no entanto, dialogar com eles. Não existe diálogo possível com quem não rejeita o monstro. Essa escolha não representa uma divergência política, mas uma divergência vital e o diálogo é impossível quando dois indivíduos estão separados por um abismo. Quero dialogar com os democratas. Com quem ainda hoje mantém seu voto em Ciro ou ­Simone, mas fica com o estômago revirado só de pensar na possibilidade de outra vitória de Bolsonaro. Eleitores de Ciro ou Simone que detestam o fascismo e o fascista no poder e que sabem que o Brasil tem muito a perder nestas eleições. Eleitores de Ciro ou Simone, que, embora não gostem do PT, sabem que entre a destruição e o petismo não há dúvida. Com eles gostaria muito de falar.

Amigos, por favor, eu lhes imploro, coloco-me de joelhos, o Brasil coloca-se de joelhos. Por favor, solto um grito de súplica: votem em Lula no primeiro turno. Por favor.

Vocês, democratas, sabem que esta campanha pelo voto útil é diferente das outras. Nem teria a coragem de suplicar o voto útil publicamente, se não fosse o fato de, nestas eleições, estarmos diante do tudo ou nada. É vida ou morte. E vocês sabem disso. Devolvamos à política um pouco da racionalidade perdida nos últimos anos. Sabem que a única chance de a gente se livrar do monstro é Lula. Os dados não podem ser mais expressivos. Aguardamos meses e meses para ver se a terceira via decolava. Não decola e o tempo corre. Não decola e não vai decolar. Vocês sabem disso. Vocês não gostam de Lula, não gostam do PT, pensam que Lula não merece uma segunda chance. Respeito e consigo entender sua posição, mas, vocês, os democratas, sabem que não temos outra chance. Se houvesse uma alternativa diferente, eu, como cientista, que tenho nos dados minha bússola de vida, seria a primeira a citá-la publicamente, mas não há. É Lula ou o monstro. E vocês, os democratas, detestam o monstro muito mais do que desgostam de Lula.

Sim, seria ideal viver num contexto em que todos tivéssemos a ­oportunidade de expressar nossa opinião política na urna, mas a verdade é que esse contexto não existe. Nosso contexto é da sobrevivência. Nosso contexto é o de tentar, desesperadamente, devolver um mínimo de dignidade a um país que não suporta mais tanto desrespeito.

Vocês, os democratas que pensam em votar em Ciro ou Simone, se sentem realmente confortáveis diante de um cenário de segundo turno entre Lula e Bolsonaro? Confesso publicamente: me enche de terror essa possibilidade. Em um segundo turno, a máquina bolsonarista vai ser um instrumento de horror, de ataques, de pânico moral e nem todo mundo conseguirá resistir a essas acometidas violentas. Em um segundo turno, o risco é elevadíssimo.

Então, por favor, democratas que ainda pensam em votar em Ciro ou Simone, a vocês dirijo este artigo, com todo respeito e humildade, sem desmerecer os candidatos. Imploro de novo. Vocês têm um papel histórico. Em um segundo turno, as portas das trevas se abrem. Por favor. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1227 DE CARTACAPITAL, EM 28 DE SETEMBRO DE 2022.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Em defesa do voto útil “

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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