À porta dos cem primeiros dias de governo, Lula ainda tem se desincumbido da tarefa básica de construir governabilidade. A cartilha das democracias liberais recomendaria, de fato, esforços nessa direção a qualquer governo eleito, mas Lula 3 não é qualquer governo. À reconstrução de políticas públicas que possam reduzir os alarmantes índices de pobreza e desigualdade social, de gênero, étnica e racial e, ainda, retomar o desenvolvimento econômico, soma-se a empreitada nada elementar de retomar a normalidade.
Se os criminosos atos de 8 de janeiro não foram suficientes para elucidar a persistência dos riscos de retrocesso, algumas pesquisas de opinião apontam para o renitente apoio a medidas antidemocráticas. Em resposta, Lula 3 tem adiantado a discussão sobre a necessidade de construção de mecanismos institucionais de reforço da cultura democrática. A ideia de democracia militante (ou defensiva) voltou à cena em um contexto de instabilidade das democracias em todo o mundo, pela ascensão eleitoral de lideranças autocráticas que avançam, progressivamente, sobre o conteúdo liberal das Constituições, mobilizando, não raro, o próprio aparato legal. Depois de vencer as eleições, essas lideranças mobilizam estratégias legais para atacar a liberdade e a dignidade individuais e afastar os mecanismos de controle público sobre seu governo. Avessos à institucionalidade, costumam avançar sobre o Judiciário, a mídia, os órgãos de controle e as instituições eleitorais, promovendo discursos de ódio e intolerância, articulados por uma rede de desinformação, entrincheirados em uma concepção distorcida de liberdade de expressão. Qualquer semelhança com o governo Bolsonaro não é mera coincidência.
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