Guilherme Boulos

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Coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). Foi candidato à Presidência da República em 2018, pelo PSOL.

Opinião

Em vez de combater o desemprego, Bolsonaro faz cruzada contra a Educação

O governo revela uma indisfarçável aversão ao pensamento crítico. O ensino que prepara para a vida e a cidadania é visto com temor

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Em vez de combater o desemprego, a fome ou a falta de moradia, Bolsonaro parece decidido a levar adiante uma cruzada contra a Educação. Sua trajetória, é verdade, jamais inspirou bons ventos para a área no Brasil, mas seria difícil imaginar uma saga tão bizarra e com tamanha repulsa de um dos pilares centrais para o nosso desenvolvimento.

A passagem de menos de cem dias de Vélez Rodríguez pelo MEC dava a impressão de ter garantido ao colombiano o título de pior ministro que ocupou a pasta na história. O novo titular, Abraham Weintraub, parece, no entanto, ter um empenho fervoroso em disputar o prêmio e segue a mesma direção, em ritmo até mais acelerado do que seu antecessor.

Antes mesmo de assumir, Weintraub defendia que os nordestinos deveriam trocar a Filosofia pela Agronomia. Como ministro, o preconceito transformou-se em proposta de governo anunciada e apoiada publicamente por Bolsonaro: corte de investimentos em faculdades de Ciências Humanas de todo o País e foco em áreas que gerem um suposto “retorno imediato ao contribuinte”.

A alegação é de que esses cursos seriam elitizados, por isso deveriam ser pagos e não oferecidos na universidade pública. “Pode estudar Filosofia? Pode”, tranquilizou o ministro, como se estivesse sob sua alçada banir a disciplina do Brasil. “Mas com dinheiro próprio.”

Qualquer um que circula em universidades públicas percebe o perfil de quem frequenta cursos como Filosofia e Sociologia. Somam hoje apenas 2% do total de alunos das federais e, ao contrário do que é a regra em cursos como Medicina ou Engenharia, a maioria não tem origem elitizada. Muitos são os primeiros de suas famílias a ingressar no Ensino Superior. A formação desses jovens representa, inclusive, um investimento crucial para o futuro: serão eles que vão lecionar em milhares de salas de aula de escolas públicas e formar nossas próximas gerações. Nada disso parece significar alguma coisa para o atual governo.

E a imposição de critérios discricionários – e delirantes – para a distribuição de recursos nas universidades não se limita aos cursos de Ciências Humanas. Weintraub decidiu nos últimos dias anunciar um corte de quase 6 bilhões de reais em gastos com água, luz, limpeza e bolsas de auxílio de universidades federais para as instituições que, em sua prova de avaliação, promovem “balbúrdia”. Para o ministro, uma instituição que organiza debates críticos ou recebe “sem-terra dentro do campus” precisa ser retaliada.

O corte de verbas por critérios ideológicos e, além de tudo, toscos é não só autoritário como flagrantemente ilegal. Sabendo ser alvo fácil de uma ação de improbidade, o ministro “recuou”, mas da maneira mais estúpida que se poderia imaginar: estendeu o corte de 30% para todas as universidades federais.

Na verdade, o que está em jogo não é o perfil social dos estudantes ou atividades pontuais nas dependências das universidades, mas uma indisfarçável aversão ao pensamento crítico. A educação que prepara para a vida e forma para a cidadania é vista com temor. Nunca isso foi tão evidente num governo. Por isso atacam tanto Paulo Freire. Por isso gostariam que a universidade fosse reservada apenas para uma “elite intelectual”, cabendo aos demais apenas ler, escrever e fazer contas.

Ao contrário de seu carinho pelos milicianos, Bolsonaro sempre tratou professores como inimigos. Estimula a violência, divulga vídeos descontextualizados por meio das redes sociais, faz pronunciamentos preconceituosos. O ataque e a perseguição são as bases de sua plataforma de governo. Fora delas, é incapaz de formular propostas e sequer frases com algum nexo. O presidente, o “conge” Sérgio Moro, o ministro da Educação que “insita” a violência e seu “literalmente” incompreensível filho colocam até a língua portuguesa no rol de adversários.

O mais grave é que não se trata apenas de tuítes ou discursos. Seu governo utiliza o ministério com maior orçamento do País para sustentar uma plataforma de destruição da educação e manter seus alucinados sequazes em atividade. Caso siga em marcha, os efeitos dessas medidas podem afetar milhões de brasileiros e comprometer o futuro da próxima geração.

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