Opinião

As diferenças dos atos a favor e contra Bolsonaro na Avenida Paulista

Os do dia 2, rejuvenescidos, brincamos, tocamos e nos divertimos, sem idolatrias, sem adoração de falsos mitos, sem mentiras

Foto: NELSON ALMEIDA / AFP
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“Não se interesse pela quantidade de pessoas que o respeitam e admiram, mas sim em sua qualidade. Se os maus não gostarem de você, tanto melhor.”
Sêneca.

Por estar em São Paulo, pude ver os manifestantes tanto do dia 7 de setembro quanto os do dia 2 de outubro. Há uma diferença abissal entre os dois grupos. O primeiro, composto por pessoas envelhecidas – não necessariamente idosas, porque juventude e velhice não estão determinadas por fatores etários. Aqueles, eram seres atados ao passado brasileiro, escravagista, autoritário, assassino de corpos e liberdades.

Os do dia 2, rejuvenescidos, brincamos, tocamos e nos divertimos, sem idolatrias, sem adoração de falsos mitos, sem mentiras.

No “Bloco Pé Vermelho”, fui admitido a tocar agê! Imaginem a minha felicidade em tocar algo (mal), depois de mais de dois anos longe do bloco “Ai, que saudades do meu ex”, de Porto Alegre.

Foi muito samba na avenida Paulista, literalmente. Patos amarelos ou verde-amarelos não se viram.

Uma sugestão para os organizadores seria de mais movimento, mais caminhada, o centro de São Paulo tem muita energia: como em Porto Alegre, homenageemos nossas ruas e praças, nossos logradouros. Na capital gaúcha, todas as marchas terminam no Largo Zumbi dos Palmares.

Atualmente, em razão da pandemia, mas não apenas, muitos moradores estão confinados, por profilaxia ou dificuldade de locomoção, vayamos a eles!

Pessoas, bichos e palavras são música! Precisam circular, voar, significar!

Em Os filhos dos dias, de Eduardo Galeano, o grande escritor uruguaio narra: “…Rafuema, o avô que contou a história da origem do povo uitoto, na região colombiana de Araracuara…contou que os uitotos nasceram das palavras que contaram seu nascimento. E cada vez que ele contava isso, os uitotos tornavam a nascer.”

Na obra, Galeano nos recorda, neste dia 4 de outubro, dia de São Francisco, patrono da ecologia, os tantos desaparecidos da chamada civilização ocidental:

“Dia dos Desaparecidos.

Desaparecidos: os mortos sem tumba, as tumbas sem nome.

E também:

os bosques nativos,
as estrelas na noite das cidades,
o aroma das flores,
o sabor das frutas,
as cartas escritas à mão,
os velhos cafés onde havia tempo para perder tempo,
o futebol de rua,
o direito a caminhar,
o direito a respirar,
os empregos seguros,
as aposentadorias seguras,
as casas sem grades,
as portas sem fechaduras,
o senso comunitário
e o bom-senso.”

O outro Francisco, o Papa, em Quem sou eu para julgar?, da editora LeYa, observa, com muita perspicácia: “O ambiente humano e o ambiente natural se degradam em conjunto, e não podemos enfrentar adequadamente a degradação ambiental se não prestarmos atenção às causas que têm a ver com a degradação humana e social. De fato, a deterioração do ambiente e da sociedade atingem, de modo especial, os mais frágeis do planeta. Por exemplo, o esgotamento das reservas de peixe prejudica especialmente as pessoas que vivem da pesca artesanal e não têm como substituí-la.”

O quanto necessitamos dessa sabedoria pode ser medido pelas desmedidas palavras do Chanceler da União Européia, Joseph Borell, que teria dito ao homólogo russo Sergei Lavrov, sobre a África: “Aquele lugar é nosso. Melhor não atrapalhar”. Simples assim, sem ao menos meias palavras. Colonialismo na veia, o mesmo que nos reconduziu à condição de colônia de facto, desde 2016.

Naquela mesma obra do Papa Francisco, também lemos: “A terra é de todos, e não somente aos ricos.’ São palavras de Santo Ambrósio, que serviram para o Papa Paulo VI afirmar, na Populorum progressio, que a propriedade privada não constitui para alguém um direito incondicional e absoluto e que ninguém está autorizado a reservar para seu uso exclusivo aquilo que supera a sua necessidade quando aos outros falta o necessário. São João Crisóstomo afirmava: ‘Não compartilhar os próprios bens com os pobres significa roubá-los e privá-los da vida. Os bens que possuímos não são nossos, mas deles.”

O que dizer de ministros da economia e presidentes de bancos centrais que mantêm suas fortunas em paraísos fiscais, sem pagar impostos e operando a política econômica exclusivamente em proveito próprio? A que justiça fazem jus?

Não tenhamos a reação de Macabéa, a protagonista de A Hora da Estrela, de Clarice Lispector, que, como relata Nádia Batella Gotlib, em Clarice – uma vida que se conta, ao se deparar com Humilhados e ofendidos, de Dostoiévski, reage: “Talvez tivesse pela primeira vez se definido numa classe social. Pensou, pensou, pensou! Chegou à conclusão que na verdade ninguém jamais a ofendera, tudo o que acontecia era porque as coisas são assim mesmo e não havia luta possível, para que lutar.”

Luchemos!

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