Justiça

As bases transformadoras do professor Adilson José Moreira

Cânone do Direito Antidiscriminatório do país tem introduzido debate fundamental nas Faculdades de Direito e instituições de justiça.

Professor Adilson Moreira fala em lançamento da obra "Direito Antidiscriminatório e Relações Raciais", na Tapera Taperá, em São Paulo.
Apoie Siga-nos no

Estive nessa terça-feira, 20, na Tapera Taperá, espaço cultural no segundo andar da Galeria Metrópole, no Centro de São Paulo, que já está marcado na história da produção de resistência cultural na última década.

Fui para prestigiar o lançamento da obra “Direito Antidiscriminatório e Relações Raciais: práticas excludentes, perspectivas críticas, medidas inclusivas”, publicada pela editora Conhecimento e que reúne trabalhos acadêmicos de Adilson José Moreira e oito de seus orientandos e orientandas, a maioria desses da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Os trabalhos de orientação acadêmica foram selecionados após serem indicados no rol de melhores Trabalhos de Conclusão de Curso do ano, uma eleição disputada e que envolve centenas de produções acadêmicas. Entre os temas abordados, está a premiada pesquisa sobre violência obstétrica contra a mulher negra, desenvolvida pela acadêmica Sheyla Graziela Aparecida de Azevedo, um tema de relevância fundamental e atravessado por intersecções que estão postas de uma maneira aprofundada.

Em sua fala de lançamento, o professor Adilson passou pelo tema de todos os trabalhos, fez elogios e destaques, como o desconforto que suscita da leitura do trabalho sobre Constitucionalismo Negro, objeto central da pesquisa desenvolvida pela acadêmica Rachel Costa da Silva Gonçalves. Um trabalho que coloca no centro o protagonismo da população negra no desenvolvimento de direitos e políticas públicas, na própria formulação de Estado Democrático de Direitos e da Constituição Federal.

Já tinha conhecimento prévio dessa pesquisa que causou um impacto na cena acadêmica mackenzista, como também já ouvira falar da pesquisa sobre racismo nos campos de futebol do Brasil, desenvolvida pela acadêmica Ângela Maria Leite Leal, uma perspectiva de vanguarda que tenho certeza de que irá inspirar muitas outras no mesmo sentido. Atualmente, o futebol é fonte de debates sobre racismo e a qualificação da discussão é inevitável, ao que o trabalho de Leite Leal contribui significativamente.

Também estão presentes no livro o trabalho de Damião Alves Azevedo, desvelando as falsas polêmicas da contraposição da biologia às cotas raciais; a pesquisa crítica de Paloma Vidal de Mello Araújo intitulada “Branco não rouba, branco sonega: uma análise crítica da branquitude como estruturadora da seletividade das normas penais”; os estudos de Rhenzo Pugliese Abou Haikal sobre a constitucionalidade das ações afirmativas racialmente inclusivas e a responsabilidade social por empresas; e, ainda, a pesquisa de Marcus Vinicius Silva de Oliveira sobre Justiça espacial e discriminação racial, um trabalho que traz o olhar sobre a segregação urbana na cidade de São Paulo.

São temas avançados e, para um já relativamente antigo estudante do Mackenzie como eu, ver alunos e alunas dessa Universidade estudando essas matérias nos informa como a instituição melhorou o nível estratosfericamente de 10 anos para cá. Fui aluno da graduação na instituição de 2008 a 2013 e não tive em nenhum momento qualquer fomento ao estudo de direito antidiscriminatório e literatura desenvolvida por pessoas negras.

Aliás, a diferença de tempos é tão gritante que, em meus tempos de estudante da graduação, tive em sala de aula Césare Lombroso, notório racista científico italiano do Século XIX, como se ele tivesse razão em seus estudos. Bom, na minha época o reitor era o hoje ex-ministro da educação do governo Bolsonaro, aquele mesmo dos pastores do MEC, então podemos ter uma ideia de como a instituição que chocou os ovos do CCC (Comando de Caça aos Comunistas) na Ditadura Militar tem apresentado uma realidade de pesquisa séria, o que contribui para que seus e suas estudantes tenham competitividade na campo da pesquisa acadêmica.

A Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie soube se reinventar e está atualmente na frente de outras Faculdades de Direito, inclusive de universidades públicas, no que se refere ao estudo do Direito Antidiscriminatório. As produções estão fervilhando e se realizando em livros que embasam outros tantos trabalhos acadêmicos que se valem de parte dos trabalhos e das referências bibliográficas para se desenvolverem. Trata-se de uma área em desenvolvimento inicial em todas as Faculdades do país e as bases brasileiras estão sendo construídas nos anos presentes. Ao contar com Adilson Moreira, um dos pioneiros no estudo do tema no país, o Mackenzie marcou um golaço e deu um salto surpreendente na vanguarda de pesquisa do país.

E rendo aqui minhas homenagens com gosto ao professor Adilson Moreira, um dos principais responsáveis por essa transformação. Claro que faço a ressalva de que eu sou um admirador pessoal e tenho a imensa alegria de chamá-lo de amigo, então o elogio vem carregado de muito amor, mas a verdade é que suas produções tem sido impactantes no cenário acadêmico e profissional jurídico brasileiro.

Seu “Tratado de Direito Antidiscriminatório”, de quase mil páginas, é uma obra monumental que será lida como bibliografia principal do primeiro ao último semestre durante as próximas décadas. Seu título “Racismo Recreativo” tem sustentado decisões de todos os Tribunais Regionais do Trabalho, do Tribunal Superior do Trabalho e do próprio Supremo Tribunal Federal. Sua obra “Pensando como um negro: ensaio de uma Hermenêutica Jurídica” está se proliferando como bibliografia obrigatória em programas de pós-graduação em Direito. Entre muitos outros trabalhos de impacto social.

Além disso, o professor está como convidado constante de seminários, encontros, conferências no Brasil e no continente americano. Recentemente esteve como pesquisador convidado na prestigiada Berkeley University e, em breve, estará de malas prontas para lecionar em uma das mais importantes Faculdades de Direito do mundo.

Sua última obra com orientandos e orientandas é, além de um trabalho antidiscriminatório de primeira grandeza, mostra de sua generosidade com alunos e alunas. Para pessoas egressas da graduação, publicar um artigo em um livro acadêmico conta pontos em disputas para ingresso em programas de pós-graduação, que muitas vezes fazem a diferença crucial entre entrar ou não. Ter uma pesquisa revisada e refinada publicada em livro também é um fortalecimento da autoestima para a produção de textos.

Ao publicar esse livro, o professor Adilson fortalece a transmissão de seu legado para proliferação de estudiosos e estudiosas nessa área. Como diz no ditado futebolístico, a base vem forte e o técnico está com tudo.

ENTENDA MAIS SOBRE: , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo