Opinião

A reunião dos chefes de Estado da Unasul é um alento

O colonialismo do passado nos fez tão ignorantes uns dos outros que o simples fato de nos reunirmos traz alento, conhecimento e esperança

O presidente Lula em encontro da Unasul. Foto: Evaristo Sá/AFP
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Acho que esse negócio de memórias, pelo menos no meu caso, sempre termina em algo parcial, calculado, sabe? A gente lambendo, mesmo inconscientemente, as próprias feridas.

Vinicius de Moraes 

Não sei como é para os jornalistas, mas, para mim, diletante, é muito prazeroso não precisar criticar.
A crítica cansa, extenua, exaure.
Que felicidade quando vemos os caminhos corretos sendo percorridos, em paz.
A reunião dos chefes de Estado dos países da União de Nações Sul-Americanas, que se inicia hoje em Brasília, é alento, de certeza.
Podemos ampliar enormemente o comércio intra-regional, com imenso benefício para os países e os povos da região.
Ao lado disso, o financiamento conjunto de obras de infraestrutura poderá facilitar ainda mais as trocas, diminuindo custos e tempos, além de empregar mão de obra ociosa.
Demais, precisamos estar unidos para enfrentar o monstro do colonialismo – que nunca será vencido até que os seres humanos deixem de ambicionar viver à custa de outros, pois é disso que se trata.
Na semana passada, um deputado estadunidense, do Partido Republicano do Texas, Dan Crenshaw, propugnou intervenção militar no México, contra os cartéis de drogas, que, na verdade, só existem porque o país dele, Estados Unidos da América, é o maior consumidor de drogas do mundo.
O colonialismo do passado nos fez tão ignorantes uns dos outros que o simples fato de nos reunirmos traz alento, conhecimento e esperança.
Com efeito, em Vulnerabilidade (editora Ideias & Letras), de René Dentz, lemos a propósito:”Enfim, se quisermos conhecer verdadeiramente alguém, precisamos exercitar a nossa capacidade de escutá-lo (a) e, assim, compreender suas demandas e sua singularidade. Diante de um mundo complexo, as soluções podem estar situadas em dinâmicas simples, mas comumente ausentes.”
O autor complementa: “Paradoxalmente, presenciamos hoje um fenômeno cada vez mais evidente: mais informação, menos conhecimento…A pensadora judia-alemã Hannah Arendt analisa a banalidade do mal no julgamento de Eichmann e nos ajuda a pensar o contexto de hoje: ‘Clichês, frases feitas, adesão a códigos de expressão e conduta convencionais e padronizados têm função socialmente reconhecida de nos proteger da realidade, ou seja, da exigência do pensamento feita por todos os fatos e acontecimentos em virtude de sua mera existência.”
Atualizando esses conhecimentos, Dentz nota: “A sensação de muitos é que o trabalho agora não tem mais limite, as resoluções de problemas são entendidas a partir de uma flexibilidade máxima de horário. Antes da pandemia, já vivíamos em uma sociedade do cansaço, como dizia o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han.
Para ele vivemos hoje em uma sociedade que nos leva à exaustão, cobramos a nós mesmos excessivamente a ponto de termos a sensação de inutilidade quando não estamos produzindo: ‘Hoje a pessoa explora a si mesma achando que está se realizando; é a lógica traiçoeira do neoliberalismo. E a consequência: não há mais contra quem direcionar a revolução, a repressão não vem mais dos outros. É a ‘alienação de si mesmo’, que no físico se traduz em anorexias ou compulsão em se alimentar ou no consumo exagerado de produtos ou entretenimento.”
Ao citar a Encíclica Fratelli tutti, do Papa Francisco, Dentz aduz: “O individualismo não nos torna mais livres, mais iguais, mais irmãos. A mera soma dos interesses individuais não é capaz de gerar um mundo melhor para toda a humanidade. Nem pode sequer preservar-nos de tantos males, que se tornam cada vez mais globais. Mas o individualismo radical é o vírus mais difícil de vencer. Ilude. Faz-nos crer que tudo se reduz a deixar à rédea solta as próprias ambições, como se, acumulando ambições e segurancas individuais, pudéssemos construir o bem comum.”
Em Sobre o amor (Editora Vozes), o editor Welder Lancieri Marchini nos recorda: “…o amor é uma atitude que nos leva ao encontro do outro.”
Naquela obra, a Monja Coen discorre:
“Expandir a mente, o coração de forma que pulse
forte e firme, suave e macio na ternura sem fim
de nos sabermos unidos e dependentes uns dos
outros – a interdependência para a qual o monge
vietnamita Thich Nhat Hanh sugeria uma nova 
palavra, ‘interser’.
Nada existe por si só. 
Somos a trama da vida.
Interligados estamos a todas as formas de vida.
Nada nem ninguém existe por si só, independente 
ou separado.
Influenciamos o todo e somos influenciados por tudo.
Cada gesto, palavra e pensamento de cada um de
nós transforma a realidade. 
Será que conseguimos ser a transformação que
queremos no mundo, como afirmava Mahatma 
Gandhi?
Será que temos um sonho como Martin Luther King?
Será que podemos abandonar tudo como Teresa de 
Calcutá? 
Poderá a Terra ser nossa testemunha como
mencionou Buda no momento do seu despertar?
Somos, fomos e seremos capazes de amar por amar
apenas, sem esperar nada em troca?”.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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