Márcio Filho

Presidente da RING (Associação de Desenvolvedores de Jogos Digitais do estado do RJ) no biênio 2022-2024, Diretor de Produtos da GF Corp e especialista em games & sociedade

Opinião

À espera de Lula, marco legal dos games pode revolucionar o setor de jogos eletrônicos

Em um mercado avaliado em US$ 200 bilhões, estamos à beira de uma revolução no setor de jogos eletrônicos

Foto: AFP
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Maior que a soma do dobro do faturamento das indústrias do cinema e da música. Uma antiga brincadeira de criança que virou negócio de gente grande. A diversão que virou coisa séria. Uma indústria que movimenta dinheiro brincando. Todos esses brocados já foram utilizados para abrir textos que falam sobre o setor de jogos eletrônicos. Todos verdadeiros, diga-se de passagem, mas que ganharam um novo significado a partir da noite do dia 09 de abril de 2024.

Desde os tempos em que era apenas uma brincadeira infantil até se tornar um mercado bilionário, a indústria de jogos eletrônicos evoluiu de forma notável. Agora, após anos de debate e tramitação legislativa, o Projeto de Lei nº 2.796/2021, conhecido como “Marco Legal dos Games”, foi finalmente aprovado, marcando uma nova fase para o setor. O processo legislativo desse projeto poderia facilmente ser comparado a uma novela política, repleta de reviravoltas e interesses diversos. No entanto, desta vez, a trajetória culminou em um desfecho positivo.

Endereçado a um mercado que movimenta cerca de US$ 200 bilhões globalmente, o texto legislativo também foi um exemplo da boa prática política, coisa que, em tempos de hiperpolarização, tem sido difícil de se ver. Aqui teve gente de todos os matizes democráticos contribuindo pro projeto, teve participação social, teve Sessão Temática para que os jogos eletrônicos pudessem ser debatidos no plenário do Senado Federal, teve audiência pública, teve articulação da sociedade civil organizada, da academia, das empresas e de vários outros atores sociais para produzir uma lei que busca colocar o país em uma nova fase desse jogo.

O que muda com o Marco Legal dos Games, afinal? Simplesmente tudo, no que diz respeito à produção de jogos eletrônicos no país. Começa com o óbvio: ao longo de mais de 20 anos, temos debatido a necessidade da criação de Códigos Nacionais de Atividades Econômicas (CNAEs) que possam reconhecer a existência formal de empresas do setor, bem como a determinação da criação de profissões na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO).

Mas não fica apenas nos códigos – o que já seria muito, visto que parte fundamental para segurança jurídica do setor no país -, atingindo também o reconhecimento das nossas ferramentas de trabalho e dos instrumentos de fomento, garantindo que sejamos legalmente reconhecidos na Lei do Audiovisual, na Lei Rouanet, na Lei do Bem, no Inova Simples, nos dando as garantias necessárias para que possamos, de fato, existir.

O Brasil é 3% da população mundial. Corresponde a 1,5% do consumo de jogos eletrônicos do mercado global. Há, sem dúvida, espaço para crescer também no consumo. Mas o abismo em relação à posição que ocupamos no mercado produtor é gritante: somos somente 0,1% do faturamento de empresas de jogos do mundo. A falta de reconhecimento legal, de ferramentas de incentivo e fomento e a insegurança jurídica que tudo isto traz é gritante explicam grande parte desta diferença.

A lei ainda aborda o uso de jogos eletrônicos para educação, para promoção da saúde, seu uso no marketing e reconhece a responsabilidade de criadores de jogos no tratamento adequado àqueles que são um alvo importante de seus produtos: crianças e adolescentes. Novamente – assim como foi com o Estatuto da Criança e do Adolescente – o Brasil ocupa papel de vanguarda mundial no que tange à proteção das pessoas em formação.

No mundo, o cenário é de grande competitividade, onde países do norte global têm feito forte investimento na construção de seu soft power a partir das indústrias culturais e da tecnologia. Seja nos mais de US$ 30 bilhões investidos pela Coreia do Sul em seus doramas e bandas de K-pop, ou mesmo no subsídio que o Canadá dá a empresas de jogos e seus mais de 200 mil trabalhadores, o que vemos são políticas industriais estruturais promovidas por TODOS os países do G20 na direção da construção de uma imagem global em economias pouco poluentes, com alto grande de penetração em outros territórios e que nos ajudem a atingir o mundo inteiro.

Aqui, nos falta pouco: já temos a criatividade, o talento, a boa formação, a resiliência típica do povo brasileiro. Para superar essa fase final, depois da aprovação nas duas casas legislativas, só falta o presidente Lula pegar o segundo controle e vir jogar com a gente.

Topa, presidente? Bora fazer o Brasil passar de fase?

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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