A casa

O anúncio dizia que na cozinha tinha uma lava-louça e o que encontramos foi uma embalagem plástica com detergente e escrito: lava-louça

Foto: Arquivo Pessoal/Alberto Villas

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Eu tenho um amigo que odiou o Airbnb. Claro, ele, que não sabe como cozinhar um ovo, se viu no pequeno apê em Londres, onde, ao acordar, encontrou na geladeira apenas uma garrafa com água.

“Cadê o breakfast inglês, com ovos mexidos ao bacon torradinho na manteira?”, pensou ele com botões do pijama.

Com aquele frio, ir a um supermercado pra comprar ovos, bacon, manteiga, pão, suco de laranja, nem pensar. Durante três dias ele odiou todos aquele amigos brasileiros que recomendaram Airbnb, argumentando que hotel já era.

Somos clientes do Airbnb não é de hoje. Já ficamos em ótimos, com pequenos perrengues. Em Paris, nunca conseguimos ligar a TV, em Bogotá foram surpreendidos com um debaixo da pia com apenas uma frigideira, e pequena. Em Barcelona, a cama de casal eram duas de solteiro que iam se distanciando durante a madrugada.

Mas nada se compara com a casa onde passamos apenas algumas horas na praia de Moçambique, em Floripa.

Indescritível, mas vou descrever. O anúncio dizia que era pra sete pessoas. Encontramos dois copos e nenhuma taça. Reclamamos e os proprietários disseram que não tinha taça porque eles não bebem.


A mesa de jantar ficava numa varanda cercada que, para chegar com o prato quente de macarrão alho e óleo, tínhamos que dar a volta no quarteirão. Havia dois bancos, um quebrado, e duas cadeiras de plástico que eu achei serem marrons, mas eram brancas. Uma também estava quebrada.

Mas isso não é nada. Tem mais. Percebemos que o papel contact (lembra?) que circundava a parede da cozinha era para esconder as rachaduras em que dava para enfiar o dedo polegar.

Tinham detalhes: uma impressora quebrada numa prateleira de uma estante vazia, um disco de vinil empenado do Paul Anka numa das paredes que acreditamos ser a sala, um armário branco de cozinha num dos quartos e uma televisão que não ligamos. Ficamos com medo de ligar e estar passando O Homem do Sapato Branco.

Entramos numa fria. O anúncio dizia que na cozinha tinha uma lava-louça e o que encontramos foi uma embalagem plástica com detergente e escrito: lava-louça.

Imposssível passar o Natal nessa casa. Papai Noel jamais teria coragem de entrar naquela espelunca para distribuir os presentes. Uma casa que tinha a fachada pintada de laranja até pouco mais da minha altura, porque a tinta acabou.

O banheiro tinha um problema sério. A pressão da descarga era tão fraca, mas tão fraca, que o cocô não ia embora por nada nesse mundo. Queria porque queria passar o Natal ali conosco.

Resultado: o Airbnb foi acionado e bastou mostrar o que era o lava-louça anunciado, que eles mandaram fazer o check-out, devolveram todo o dinheiro pago e mudamos para um casa gracinha, onde passamos o Natal, com direito a champagne na taça, acredita?

Ia me esquecendo de contar. Logo na entrada da casa tinha um quadrinho dependurado na parede. A foto dele ilustra esta crônica.

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