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Supremo Tribunal da Venezuela suspende todos os efeitos das primárias da oposição

A Corte exigiu a entrega do caderno de votação, em meio a alegações de fraude

Jesús María Casal, presidente da Comissão Primária Nacional, em 30 de outubro de 2023. Foto: Federico Parra/AFP
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O Supremo Tribunal da Venezuela suspendeu, nesta segunda-feira 30, “todos os efeitos” das primárias da oposição, em meio a um cerco judicial ao processo, realizado pouco após os Estados Unidos relaxarem as sanções contra o país, em troca de condições eleitorais.

As primárias para escolher o adversário do presidente Nicolás Maduro nas eleições de 2024 foram realizadas em 22 de outubro em um formato autogerenciado.

Uma participação surpreendente de 2,4 milhões de pessoas acarretou levou à vitória arrebatadora da liberal inabilitada María Corina Machado, com 92% dos votos.

Maduro, seu partido e o resto das autoridades alegaram que a oposição inflacionou os números e não reconheceu o processo.

A Câmara Eleitoral do Supremo Tribunal de Justiça, de linha pró-governo, admitiu um recurso de amparo contra as primárias, introduzido pelo deputado dissidente José Brito, tachado de colaboracionista.

“Todos os efeitos das diferentes fases do processo eleitoral conduzido pela ‘Comissão Nacional de Primárias’ estão suspensos”, destaca a sentença, publicada no site do mais alto tribunal do país.

“Como é possível suspender algo cujos efeitos já foram verificados?”, perguntou à AFP Ali Daniels, coordenador da ONG Acesso à Justiça. “O objetivo principal e único era escolher um candidato que representasse um conjunto de partidos. Isso já aconteceu.”

“Nicaraguizar” a Venezuela

Simultaneamente, o procurador Tarek William Saab abriu uma investigação pela suposta prática de crimes de usurpação de funções eleitorais e de identidade, assim como de lavagem de dinheiro e associação criminosa.

Ele convocou nesta segunda-feira o presidente da Comissão Nacional de Primárias, Jesús María Casal, e outros membros da equipe para depor.

As eleições primárias ocorreram cinco dias após uma mesa de diálogo entre o governo e a oposição, na qual concordaram em respeitar as primárias e, além disso, decidiram realizar as eleições presidenciais no segundo semestre de 2024, sob supervisão da União Europeia e outros atores internacionais.

Os Estados Unidos, em resposta, aliviaram por seis meses o embargo ao petróleo imposto em 2019 ao país, mas condicionaram-no a acabar com a inabilitação de opositores como Machado, algo que o chavismo descartou, pelo menos em discurso.

Em sua sentença, o TSJ refere-se a Machado como uma “cidadã inabilitada de maneira firme por 15 anos”, reafirmando uma sanção importa em junho por suposta corrupção e promover sanções.

Luis Vicente León, analista político e diretor da empresa Datanalisis, descartou o regresso ao levantamento parcial do embargo em um contexto global de crise energética.

“Pode haver punições, um redesenho da estratégia dos Estados Unidos para continuar pressionando Maduro”, disse ele.

“O dilema hoje são licenças ou eleições” porque “se você mexer demais no processo de licenciamento pode levar a um processo de ‘nicaraguização’ do processo venezuelano”, disse ele, referindo-se ao manual de Daniel Ortega de prender e exilar seus opositores eleitorais.

“Repetição das primárias”

A votação não contou com o auxílio do Conselho Nacional Eleitoral, que, depois de meses de evasivas, acabou propondo de última hora adiá-la por um mês para poder organizá-la, mas sem garantias de poder inscrever candidatos inabilitados – uma condição da oposição.

O tribunal exigiu todos os documentos relativos ao processo, inclusive os cadernos de votação, que a oposição insiste em manter em segredo para evitar represálias contra os participantes por parte do governo, como ocorreu há 20 anos durante uma coleta de assinaturas para destituir o ex-presidente Hugo Chávez (1999-2013).

Oswaldo Ramírez, consultor político e diretor da empresa ORC, disse aos repórteres que o governo provavelmente busca “uma repetição das primárias. Agora, com a ajuda do Conselho Nacional Eleitoral e com candidatos qualificados”.

Assim, procura “dominar ou escolher com quem vai competir” e “gerar esse processo de desincentivo no eleitor da oposição”, acrescentou.

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