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Entenda por que demora do governo brasileiro em felicitar Macron pela reeleição prejudica imagem de Bolsonaro

O Brasil foi um dos últimos países do G20 a se manifestar após confirmada a reeleição de Emmanuel Macron, tarefa diplomática cumprida por uma curta nota do Ministério de Relações Exteriores

Fotos: AFP
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O presidente brasileiro ignora a importância da França na economia brasileira e evita felicitações a Emmanuel Macron, após a reeleição do líder francês para um novo mandato de cinco anos. Em entrevista à RFI, Antonio Carlos Lessa, professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília, diz que uma vitória de Marine Le Pen teria dado gás internacional ao discurso bolsonarista.

Redes de supermercado, montadoras de automóveis, lojas de material de construção e empresas de artigos esportivos são alguns exemplos de setores nos quais a presença francesa em bilhões de dólares é forte em solo brasileiro. Dados do governo federal pré-pandemia colocavam a França no topo do ranking de geração de empregos estrangeiros no país e de investimentos diretos. Ainda assim, o Brasil foi um dos últimos países do G20 a se manifestar após confirmada a reeleição de Emmanuel Macron, tarefa diplomática cumprida por uma curta nota do Ministério de Relações Exteriores.

O silêncio de Bolsonaro diante do líder francês não inaugura nada novo no atual governo, pois foi assim também com a eleição de Joe Biden, nos Estados Unidos, deixando às claras o cardápio movediço da diplomacia brasileira, com máculas que vão da viagem de Bolsonaro à Rússia, no eclodir da guerra na Ucrânia, às ofensas grosseiras à mulher de Macron, passando por embates verbais com a China.

Para Antonio Carlos Lessa, professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília, esse comportamento justifica a nítida torcida de líderes internacionais, de países que são parceiros tradicionais do Brasil, contra Bolsonaro no pleito de outubro. “Tudo isso faz com que se reitere, podemos dizer em termos globais, essa vontade que é não disfarçada, mas evidente, de muitos líderes europeus e também da diplomacia americana, de que o atual governo seja logo superado”, observa. “As eleições que se aproximam no Brasil renovam essa expectativa”, acrescenta Lessa.

O analista diz que a postura brasileira no cenário internacional gera dúvidas, o que compromete a imagem do país, ponto importante nas relações com outras nações. “O Brasil se põe como uma espécie de ponto de incerteza nas políticas externas dos seus tradicionais parceiros, seja dos Estados Unidos, seja do conjunto europeu, no caso concreto que falamos aqui da França, mas também da Alemanha, da Espanha, da Itália e de outros”, destaca. “São críticas que vão da política ambiental a traços diversos da política externa, como foi a visita de Bolsonaro a Putin”, afirmou Lessa à RFI.

Na diplomacia feita a várias mãos no Brasil, com opiniões muitas vezes conflitantes de Bolsonaro, de autoridades do primeiro escalão e dos diplomatas de carreira do Itamaraty, a chancelaria cuidou de dosar os elogios, contentando-se em frisar a necessidade de parceira entre os dois países. “O Brasil reafirma a disposição de trabalhar pelo aprofundamento dos laços históricos que unem os dois países e trazem benefícios mútuos a brasileiros e franceses, e manifesta expectativa de seguir implementando a ampla agenda bilateral”, disse a nota do Itamaraty.

Presidenciáveis

Se Bolsonaro, tão adepto das redes sociais, se calou ante a reeleição de Macron, outros líderes latinos fizeram questão de enviar felicitações pela internet, como os do México, Chile, da Argentina e Colômbia. No Brasil, pré-candidatos à presidência da República também se manifestaram, comemorando a derrota de Marine Le Pen. “Confio que o presidente Macron contribuirá nos desafios globais das mudanças climáticas, das pandemias, da luta contra a desigualdade e para a construção da paz na Europa”, afirmou Lula (PT) nas redes sociais.

Ciro Gomes (PDT) afirmou que “ver a extrema direita derrotada será sempre motivo de alegria”. João Dória (PSDB) ressaltou que “a conquista de Macron é a vitória da democracia”. A presidenciável do MDB, Simone Tebet, afirmou que “o Brasil precisa do mesmo caminho”.

Eleições brasileiras

Os adversários de Bolsonaro marcaram presença nas redes sociais, embora não sejam esperados ecos da vitória de Macron na disputa eleitoral brasileira, vistos os desafios particulares de cada país. Mas há um entendimento nos corredores políticos de que a vitória Le Pen, por sua vez, daria robustez internacional ao discurso conservador de Bolsonaro.

“Marine Le Pen seria uma voz poderosa, importante nesse sentido de fortalecer essa corrente ideológica que contesta o globalismo e se põe como conservadora”, avalia o professor da UnB. “Felizmente isso não aconteceu, e é bom, do meu ponto de vista, para a França e especialmente muito bom para a União Europeia, que tem sua voz de conjunto fortalecida”, analisa.

Ainda assim, Lessa reconhece que o desempenho de Le Pen expõe desafios maiores para o novo governo de Macron. “Marine Le Pen ampliou o percentual de votos e passou a tomar parte definitiva da paisagem do sistema político francês”, ressalta. “É um fato político importante, apontando para essa realidade da força de uma extrema direita que se renovou no caso da França”, conclui o especialista em Relações Internacionais.

 

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