Justiça

Trump recalibrou a Lei Magnitsky para proteger aliados e perseguir desafetos

Sanções recentes expõem o uso político de uma lei criada para punir abusos de poder e corrupção internacional

Trump recalibrou a Lei Magnitsky para proteger aliados e perseguir desafetos
Trump recalibrou a Lei Magnitsky para proteger aliados e perseguir desafetos
Donald Trump e o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, em um encontro na Casa Branca realizado no dia 4 de fevereiro de 2025. Foto: ANDREW CABALLERO-REYNOLDS / AFP
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Desde que voltou à Casa Branca, em janeiro, Donald Trump vem usando a Lei Magnistky como uma ferramenta para perseguir desafetos e proteger aliados. A contradição ficou evidente nesta quarta-feira, 30, quando o governo americano impôs sanções ao ministro do Supremo Tribunal Federal brasileiro, Alexandre de Moraes. Pouco antes, em abril, Trump fez o caminho oposto: retirou as sanções que pesavam sobre o húngaro Antal Rogán, braço direito de Viktor Orbán, o mais estridente expoente da extrema-direita europeia.

A seletividade política se estende a outros camaradas do presidente americano. Em maio, o procurador-geral do Tribunal Penal Internacional, o britânico Karim Khan, foi alvo de duras sanções por ter solicitado a prisão de Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel. Embora o TPI acuse Netanyahu de usar a fome como arma de guerra em Gaza — uma grave violação do direito internacional — Trump decidiu punir o procurador, e não o acusado.

Moraes foi sancionado porque Trump busca livrar do risco de prisão o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro, que está sendo julgado pela participação da tentativa frustrada de um golpe de Estado em 2022/2023. O ministro do Supremo converteu-se no principal antagonista da extrema-direita brasileira, papel que motivou Trump a manifestar solidariedade a Bolsonaro e discordância com o ministro, que se converteu no primeiro brasileiro a ser sancionado pela Lei Magnistky.

Já com o húngaro Rogán, o caminho foi inverso. O ministro do gabinete de Orbán havia sido identificado pelo embaixador dos EUA em Budapeste, David Pressman, durante o governo Joe Biden, como “o arquiteto primeiro, implementador e beneficiário” de um “ecossistema cleptocrático” entranhado na administração local, e com impacto substancial para empresas e cidadãos americanos. Apenas três meses depois de assumir, Trump revogou as sanções que pesavam sobre Rogán.

A Lei Magnitsky foi criada em 2012 com apoio bipartidário do Congresso americano e sancionada pelo então presidente Barack Obama. Seu nome homenageia Sergei Magnitsky, advogado russo que denunciou um esquema de corrupção e morreu na prisão em 2009. O espírito original da lei era claro: punir agentes públicos envolvidos em corrupção e violações de direitos humanos. Na prática, ela se tornou uma ferramenta unilateral de intervenção, aplicada segundo os critérios e interesses da administração americana da vez.

Sob Trump, esse viés ficou ainda mais explícito. “O que é muito grave no caso do ministro Moraes é a deturpação evidente dos princípios da Lei Magnitsky pela seletividade oportunista de quem está sendo incluído ou excluído da lista”, disse a CartaCapital Bruno Brandão, diretor-executivo da Transparência Internacional no Brasil.

Cesar Muñoz, diretor da Human Rights Watch no Brasil, foi ainda mais direto: “Há um claro paralelismo entre as sanções dos EUA contra o Tribunal Penal Internacional e contra um ministro do STF e suas tarifas contra o Brasil. Nos dois casos, o governo Trump tenta impedir o julgamento de algumas pessoas — Netanyahu e Bolsonaro — e enfraquecer a justiça”, escreveu em suas redes sociais.

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