Justiça
STM mantém condenação de militar que atuou como médico sem diploma
Um laudo pericial apontou que, até dezembro de 2016, o réu recebeu cerca de 1,58 milhão de reais em remunerações indevidas


O Supremo Tribunal Militar decidiu manter a condenação de oficial do Exército a seis anos de reclusão, em regime semiaberto, pelo crime de estelionato contra a Administração Militar. Ele atuou, sem formação, como médico por mais de uma década.
O julgamento ocorreu em apelação criminal relatada pelo ministro Carlos Vuyk de Aquino, que teve o voto acompanhado pela maioria da Corte. Segundo a Corte, o militar usava registro profissional de terceiros para se passar por médico.
De acordo com os autos do Inquérito Policial Militar (IPM), a fraude foi descoberta em 2019, a partir de denúncia encaminhada ao Comando Militar do Leste pelo serviço “Disque-Denúncia” da Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro.
As investigações constataram que o então capitão médico usava número de registro no Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro de outro profissional. A Universidade Federal Fluminense (UFF) confirmou que o acusado havia iniciado o curso de Medicina em 1995, mas teve a matrícula cancelada por abandono em 2009, sem concluir nem se transferir para outra instituição.
Ainda assim, ingressou no Exército em 2004, como aspirante-a-oficial médico temporário, e passou a ocupar funções da profissão, apresentando documentos falsos. Entre 2005 e 2019, atuou em hospitais militares do Rio de Janeiro e de São Paulo, chegando a exercer atividades de perícia médica, chefiar setores hospitalares e até cursar pós-graduação lato sensu em Radiologia, sempre se passando por médico.
Um laudo pericial apontou que, até dezembro de 2016, o réu recebeu cerca de 1,58 milhão de reais em remunerações indevidas, além de gerar prejuízo superior a 316 mil reais à União com sua formação técnica, valores atualizados até 2020.
O STM restringiu a análise ao período em que o acusado atuou no Rio de Janeiro, entre 2004 e 2016, reconhecendo que ele obteve vantagens financeiras ilícitas e causou danos à Administração Militar. As acusações incluíram estelionato, falsidade ideológica e exercício ilegal da medicina.
Divergência da ministra Verônica Sterman
O julgamento também marcou a estreia da ministra Verônica Abdalla Sterman no plenário do STM. Em sua primeira manifestação de voto, a ministra demonstrou firmeza de posicionamento e apresentou divergência em relação ao relator, especificamente quanto à dosimetria da pena.
O Conselho Especial de Justiça havia fixado a condenação em seis anos de reclusão, próximo ao limite máximo previsto em lei. Para a ministra Sterman, a exasperação da pena-base em patamar tão elevado desconsiderava parâmetros técnicos da dosimetria e afrontava os princípios da individualização da pena e da dignidade da pessoa humana.
Com base em critérios do Conselho Nacional de Justiça, ela propôs a redução da pena para 3 anos, 10 meses e 15 dias, em regime aberto, com direito de recorrer em liberdade. Apesar de vencido, seu voto foi destacado pela clareza da fundamentação e rigor técnico.
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