Diversidade
STF: Dino manda tirar de circulação livros jurídicos com conteúdo homofóbico e misógino
Ministro aponta violação da dignidade humana e reafirma limites da liberdade de expressão


O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta sexta-feira 1º, a retirada de circulação de quatro livros jurídicos com trechos considerados homofóbicos e misóginos.
As obras, publicadas entre 2008 e 2009, foram alvos de denúncia do Ministério Público Federal (MPF) após manifestações de estudantes da Universidade Estadual de Londrina (UEL), onde os livros estavam disponíveis para consulta. Os livros barrados são:
- Teoria e Prática do Direito Penal (2009), de Luciano Dalvi e Fernando Dalvi;
- Manual de Prática Trabalhista (2009), de Luciano Dalvi e Fernando Dalvi;
- Curso Avançado de Direito do Consumidor: Doutrina, Prática e Jurisprudência (2009), de Luciano Dalvi e Fernando Dalvi;
- Curso Avançado de Biodireito (2008), de Luciano Dalvi e Fernando Dalvi.
Em sua decisão, Dino destacou que os trechos em questão violam a dignidade da pessoa humana e ultrapassam os limites da liberdade de expressão.
“Embora o texto constitucional consagre a liberdade de expressão e a vedação à censura, é indene de dúvida que a expressão do pensamento, por qualquer meio, não poderá se chocar com outros direitos também salvaguardados pela própria Constituição”, afirmou o ministro.
Ele ainda reforçou que a liberdade de expressão “não alcança a intolerância racial e o estímulo à violência, sob pena de sacrificar inúmeros outros bens jurídicos de estatura constitucional”.
Em nota, a UEL afirmou que, ao tomar conhecimento dos fatos, no ano de 2013, optou por retirar todos os livros dos mencionados autores do acervo da Biblioteca da Instituição e, em seguida, enviou exemplares dos mesmos ao Ministério Público do Paraná (MPPR).
“Desta forma, as referidas publicações não estão disponíveis para empréstimo aos estudantes do curso de Direito e demais membros da comunidade universitária da UEL desde então”, declarou a instituição.
O que diziam os livros
Entre os trechos considerados ofensivos está a afirmação de que crianças seriam “incentivadas a serem homossexuais”, o que representaria um “risco à sociedade”. Os autores, de forma infundada, também relacionam Aids e HIV com pessoas LGBTQIAP+.
Em outro ponto, os autores sugerem ainda que funcionários homossexuais seriam “partidários de uma causa maléfica” e que deveriam ser “tratados” ou demitidos.
“O chefe poderá demitir esses funcionários afeminados por justa causa por não colaborar com a ordem imposta na empresa. O serviço não deve ser um ambiente que transforme os funcionários em partidários de uma causa maléfica (causa gay). Estes tipos de funcionários (homossexuais) deve ser incentivados a ver a origem de seu problema sexual”, anotavam Luciano e Fernando Dalvi em um dos livros barrados pelo STF.
Em outra passagem, jovens com vida sexual ativa são descritos pelos advogados de forma pejorativa.
“Ora, bem sabemos que para transar muitos jovens procuram qualquer mulher, mas para casar vão escolher as mais ‘certinhas’. Neste conceito, está incluído aquelas meninas menos afetas à promiscuidade e quer tenham uma vida sexual mais sensata”, dizia o trecho em questão.
Segundo a decisão do ministro, os livros podem ser reeditados, mas apenas se os trechos inconstitucionais forem removidos. Dino reforçou que, embora a liberdade de expressão seja um direito fundamental, o STF tem entendimento consolidado de que tal direito não é absoluto, sendo passível de intervenção judicial em casos de abuso evidente.
A Editora Conceito Editorial, responsável pela publicação das obras, encerrou suas atividades em 2016.
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