Justiça

Prefeitura de Aracaju irá pagar indenização por racismo religioso contra terreiro de candomblé

Em 2018, o Terreiro Rei Hungria, na capital sergipana, foi alvo de operação da Prefeitura para “resgatar” animais que seriam abatidos durante um ritual

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O Tribunal de Justiça de Sergipe decidiu manter a condenação da Prefeitura de Aracaju por racismo religioso contra um terreiro de candomblé localizado na zona norte da capital sergipana.

Com a decisão, que não pode ser contestada com recursos, o município terá de pagar 20 mil reais em indenização ao Fundo dos Direitos Difusos.

O caso aconteceu em 2018. O Terreiro Rei Hungria, chefiado pela Yalorixá Valclides Francisca dos Anjos (conhecida como Mãe Quida), foi alvo de uma operação da Secretaria de Meio Ambiente cujo objetivo seria “resgatar” animais a serem abatidos durante o rito religioso.

Durante a vistoria, acompanhada por seis policiais, uma fiscal da Prefeitura chegou a disparar insinuações racistas contra o Terreiro e afirmou que o templo “fazia magia negra”, termo preconceituoso utilizado em referência a coisas ruins ou negativas.

A operação apreendeu alguns frangos, um bode e um pato, que seriam oferecidos no ritual a Exu, divindade ancestral cultuada pelos adeptos do candomblé. Os agentes ainda proibiram a entrada de outros animais vivos no Terreiro.

Esse tipo de ritual, vale dizer, faz parte das práticas cultivadas pela religião de matriz africana. Depois que os animais são abatidos, eles são preparados e servidos à comunidade, sem que haja desperdício.

Depois de recolhidos pelos agentes, os bichos foram levados para um sítio na zona sul de Aracaju, mas morreram durante o trajeto devido ao sol quente a que foram expostos.

O caso foi levado ao Ministério Público, que ingressou com ação civil pública por intolerância e racismo religioso. Na representação, a 4ª Promotoria dos Direitos do Cidadão pedia o pagamento de 50 mil reais em indenização por danos morais coletivos, mas teve a solicitação acolhida parcialmente.

De acordo com a juíza Christina Machado de Sales e Silva, da 18ª Vara Cível de Aracaju, a Prefeitura de Aracaju agiu de forma “arbitrária” ao realizar a operação e não “foi capaz de demonstrar a efetiva ocorrência de maus tratos a animais”. A magistrada ainda citou entendimentos de ministros do Supremo Tribunal Federal sobre as práticas religiosas.

“Entendo que o exercício do poder de polícia exorbitou seus limites intrínsecos, na medida em que o ato administrativo não se motivou em causa legítima para a atuação da fiscalização ambiental, muito menos em indícios mínimos da suposta prática de crime”, escreveu.

A Justiça ainda condenou, em 2019, a fiscal responsável pela ação ao pagamento de 2 mil reais à Mãe Quida, responsável pelo Terreiro Rei Hungria. Ela foi indiciada por crimes contra o sentimento religioso, perturbação de culto religioso e crime resultante de preconceito de raça ou de cor.

Atualização às 21h38

Após a publicação da reportagem, a Prefeitura de Aracaju se manifestou. Por meio de nota, disse que a atitude da fiscal foi “um ato isolado e que não representa as diretrizes e posicionamento da gestão municipal”.

Afirmou também que “respeita os costumes e manifestações religiosas, apoia eventos de religiões de matriz africana” e que, à época, aplicou “medidas administrativas cabíveis, com a devida exoneração” da servidora.

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