Justiça
O impasse no STF em julgamento de lei que impõe a Bíblia em bibliotecas
Com mais um pedido de vista, a Corte não tem data para retomar a votação


O Supremo Tribunal Federal ainda não tem data definida para concluir o julgamento sobre uma lei do Rio Grande do Norte que determina a inclusão da Bíblia nos acervos das bibliotecas públicas. No fim de abril, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista — mais tempo para estudar os autos — e interrompeu a votação.
O ministro Flávio Dino foi o primeiro a suspender o julgamento, no fim de março. Posteriormente, ele liberou os autos e a Corte retomou a análise, no plenário virtual, em 25 de abril. Moraes, porém, pediu vista um dia depois.
O relator, Kassio Nunes Marques, votou por considerar a lei inconstitucional e foi acompanhado por Moraes antes da interrupção solicitada por Dino.
“Ao Estado não compete privilegiar, interferir ou curvar-se aos dogmas de nenhuma denominação, mas, antes, franquear a todas, indistintamente, livre atuação”, sustentou Kassio. “A colaboração entre Estado e Igreja é, inclusive, desejável, desde que em favor do interesse público.”
Para Dino, porém, a lei do RN não exclui a disponibilização de outras obras consideradas sagradas, nem impõe a leitura da Bíblia. Ele considerou inconstitucional apenas o trecho que estabelece o mínimo de dez exemplares, quatro deles em braile.
“Fica fixado o número mínimo de 2 por biblioteca, sendo uma em Braile para atender às pessoas com deficiência”, propôs Dino em seu voto divergente. “Acresço a ressalva de que, obviamente, outros livros religiosos podem e devem ser adquiridos, não havendo exclusividade para a Bíblia Sagrada.”
Em casos semelhantes, o STF já endossou a vedação ao uso de recursos públicos para promover livros religiosos específicos em Mato Grosso do Sul, Amazonas e Rondônia.
Kassio reforçou a aplicação da conclusão do tribunal segundo a qual houve, nesses episódios, ofensa aos princípios de liberdade religiosa, isonomia e laicidade estatal.
A ação da Procuradoria-Geral da República chegou ao Supremo em 2015 — à época, quem chefiava o órgão era Rodrigo Janot. “O princípio da laicidade lhe impede de fazer, por atos administrativos, legislativos ou judiciais, juízos sobre o grau de correção e verdade de uma crença, ou de conceder tratamentos privilegiados de uma religiosidade em detrimento de outras”, diz a peça da PGR.
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