Justiça

‘Nossa tarefa é assegurar transições justas e suaves’, diz Gilmar sobre pejotização

Rrelator do tema no STF, o ministro defendeu adaptar a legislação às novas formas de trabalho. Governo Lula vê ‘cupinização’ de direitos e alerta para perdas bilionárias

‘Nossa tarefa é assegurar transições justas e suaves’, diz Gilmar sobre pejotização
‘Nossa tarefa é assegurar transições justas e suaves’, diz Gilmar sobre pejotização
Audiência pública - ARE 1.532.603 de relatoria do ministro Gilmar Mendes. Ministro Gilmar Mendes. Foto: Rosinei Coutinho/STF
Apoie Siga-nos no

Decano do Supremo Tribunal Federal, o ministro Gilmar Mendes afirmou nesta segunda-feira 6 que a regulamentação da chamada pejotização — prática em que trabalhadores são contratados como pessoas jurídicas — busca garantir o que considera “transições justas e suaves” no mercado de trabalho. As declarações foram dadas na abertura de uma audiência pública sobre o tema em Brasília.

No discurso, o magistrado defendeu que o País precisa lidar com as novas formas de ocupação sem tentar frear as transformações em curso. Para ele, a legislação deve acompanhar as mudanças sociais e tecnológicas sem abrir mão da proteção aos trabalhadores.

“A nossa tarefa é pensar como assegurar transições justas e suaves, fomentando a economia e permitindo que a livre iniciativa e as novas formas de trabalho promovam o desenvolvimento, tendo como pilar a dignidade da pessoa humana”, frisou.

Gilmar é o relator de uma ação no STF que trata da pejotização. A decisão terá repercussão geral — ou seja, definirá uma regra que servirá de referência para todos os tribunais do País.

O debate reuniu representantes de trabalhadores, empresários e autoridades para discutir a constitucionalidade da contratação de autônomos ou pessoas jurídicas para a prestação de serviços.

“A complexidade do tema exige compreender como a inovação pode ser incorporada sem retrocessos — mas também sem a ilusão de que a legislação possa deter o curso da história ou preservar relações que, na prática, já se reconfiguraram”, afirmou o ministro.

No fim de agosto, durante um evento com empresários, Gilmar já havia sinalizado posição favorável à pejotização. Para ele, é preciso encerrar uma “insistência” em modelos “ultrapassados” de regulação do trabalho. “A insistência em manter modelos ultrapassados de regulação gera insegurança jurídica, mina a livre iniciativa e contamina o ambiente econômico, em prejuízo do próprio valor social do trabalho que, em tese, busca-se proteger”, declarou à época.

A audiência desta segunda contou com a participação de dois representantes do governo Lula. O advogado-geral da União, Jorge Messias, classificou a pejotização como “cupinização dos direitos trabalhistas”. Disse considerar que esse processo fragiliza o sistema de proteção social e empurra o trabalhador vulnerável para a informalidade.

“Por trás da aparência de liberdade contratual, muitas vezes o que se esconde é a negação de direitos fundamentais — a substituição do vínculo de emprego por arranjos precários que transformam o trabalhador em pessoa jurídica de si mesmo: desprotegido, isolado e sem voz”, argumentou.

O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirmou que a pejotização é “papo furado” e tem causado impactos financeiros expressivos ao Estado. Estimativas do governo federal apontam que o País deve deixar de arrecadar mais de 106 bilhões de reais em tributos e contribuições previdenciárias em razão desse modelo de contratação.

“O contrato de pessoa jurídica existe no mundo, isso não está em discussão. O que está em discussão é a fraude trabalhista travestida de pejotização. O que nós temos de compreender é que, independentemente da formação ou do salário da pessoa, se há subordinação, é preciso proteger o trabalhador”, afirmou o ministro.

O caso chegou ao tribunal a partir do recurso de um corretor contra decisão do Tribunal Superior do Trabalho que havia validado um contrato de prestação de serviços com uma seguradora. O processo ganhou repercussão geral e levou Gilmar a suspender, em todo o País, ações que discutem a legalidade da pejotização, a competência da Justiça do Trabalho e o ônus da prova em alegações de fraude.

Segundo a Receita Federal, mais de 5 milhões de trabalhadores atuam como PJs no Brasil. Áreas como tecnologia, comunicação, saúde e educação concentram a maior parte desses vínculos. Nos últimos dez anos, o número de profissionais nessa condição cresceu mais de 80%.

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Depois de anos bicudos, voltamos a um Brasil minimamente normal. Este novo normal, contudo, segue repleto de incertezas. A ameaça bolsonarista persiste e os apetites do mercado e do Congresso continuam a pressionar o governo. Lá fora, o avanço global da extrema-direita e a brutalidade em Gaza e na Ucrânia arriscam implodir os frágeis alicerces da governança mundial.

CartaCapital não tem o apoio de bancos e fundações. Sobrevive, unicamente, da venda de anúncios e projetos e das contribuições de seus leitores. E seu apoio, leitor, é cada vez mais fundamental.

Não deixe a Carta parar. Se você valoriza o bom jornalismo, nos ajude a seguir lutando. Assine a edição semanal da revista ou contribua com o quanto puder.

Leia também

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo