Justiça
MP vê ‘direcionamento’ e pede anulação de contrato de carro blindado para a prefeita de Aracaju
Ação enviada ao TJSE diz que o aluguel do veículo, feito sem licitação, buscou beneficiar correligionário de Emília Corrêa (PL); em nota, gestão nega irregularidades


O Ministério Público de Sergipe pediu à Justiça que anule um contrato firmado pela prefeitura de Aracaju para a locação de um carro blindado destinado à segurança de Emília Corrêa (PL). Na ação enviada ao TJSE em setembro, à qual CartaCapital teve acesso, o promotor Ricardo Machado de Oliveira aponta possível “direcionamento e fraude para beneficiar agente político ligado à gestão”.
A aquisição do veículo, feita sem licitação e ao custo total de 312 mil reais, ocorreu em junho. À época, a prefeitura disse se tratar de medida preventiva e baseada em critérios técnicos e relatórios de inteligência que apontavam riscos à integridade física de Corrêa. Quem venceu o certame foi a empresa Gold Transportes e Serviços, sediada em Poço Redondo (a 174 km da capital).
Mas o veículo efetivamente entregue pertencia à Emília Veículos & Serviços, cujo sócio-administrador, Josinaldo de Santana, foi candidato a vereador nas eleições de 2024 em Campo do Brito pelo PL, mesmo partido da prefeita. A referida empresa, de acordo com o MP sergipano, só possui seis veículos cadastrados nos órgãos de trânsito e nenhum deles era a Toyota Hilux SW4 contratada.
O contrato, aliás, vedava a subcontratação do automóvel. Era, por si só, um motivo para anulação imediata do arranjo. Para o MP sergipano, tratou-se de uma “operação para direcionar recursos públicos a empresa de um correligionário e aliado político da Prefeita, em arranjo a atacar o caráter competitivo da licitação e violar os mais basilares princípios que regem a Administração Pública”.
“Era dever do agente público responsável pelo recebimento do bem verificar se o veículo entregue correspondia às especificações contratuais e se era, de fato, fornecido pela empresa contratada. Ao aceitar um veículo registrado em nome de terceiro, a fiscalização municipal foi, no mínimo, gravemente negligente, ou, o que é mais provável, conivente com a fraude em curso”, escreveu o promotor.
Na petição, que contém mais de vinte páginas, o órgão afirma que a prefeitura usou como justificativa para a dispensa de licitação supostas ameaças à prefeita, mas que nunca foram registradas em boletim de ocorrência ou comunicadas oficialmente às autoridades de segurança. Em audiência, o advogado Hunaldo Motta, procurador-geral do Município, admitiu que não houve registro policial das ameaças por “decisão pessoal” da prefeita – em entrevista a emissoras locais, ela afirmou ter recebido as intimidações “por áudio”.
O chefe da 7ª Promotoria também mencionou no documento a resistência da gestão municipal em fornecer informações e documentos sobre o aluguel do blindado, definida por Oliveira como uma “uma estratégia consciente de obstrução e ocultação de informações, demonstrando o desapreço pelos mecanismos de controle”.
Ao acionar o TJ sergipano, o promotor solicitou a suspensão do contrato e de eventuais pagamentos em caráter liminar, sob pena de multa diária de 5 mil reais, com objetivo de evitar uma “sangria mensal” dos cofres públicos em um ajuste “nulo e fraudulento”. O processo tramita na 3ª Vara Cível de Aracaju. Até o momento, não houve manifestação sobre os pedidos do Ministério Público.
Outro lado
Procurada pela reportagem, a Prefeitura de Aracaju afirmou que o processo de contratação do veículo “transcorreu dentro da legalidade”. Em nota, a gestão municipal informou ainda ter encaminhado à 3ª Vara Cível manifestação na qual “comprovou que não houve resquício de superfaturamento” no ato administrativo questionado pelo MP.
O texto ainda diz que a prefeitura finalizou, na quarta-feira, uma licitação para adquirir o veículo. Cerca de 14 empresas teriam participado do certame. “Dentre as 10 empresas de Sergipe, oito são do interior do Estado, o que de plano contraria a tese do Ministério Público quanto a essa possibilidade. Outro ponto importante a ser destacado é que nesta licitação o valor médio para locação ficou em 26.469,07 reais, o que também comprova a inexistência de sobrepreço”, conclui o comunicado enviado à reportagem.
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