Justiça

Moro, que tentou emparedar o STF, agora adverte quem critica o tribunal

Em mensagem no Twitter, o ex-ministro defende a Corte, alvo constante da Lava Jato no passado recente

O ex-ministro da Justiça Sergio Moro. Foto: Isaac Amorim/MJSP
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Até a Terra Plana dá voltas. O ex-juiz e ex-ministro Sérgio Moro, talvez em mais um gesto para “limpar a sua biografia”, saiu em defesa do Supremo Tribunal Federal, alvo constante de Bolsonaro e seus apoiadores. Em um post no Twitter com cara de despacho, Moro escreveu: “Nos EUA, país que serve de modelo a muitos, casos como Marbury vs Madison, 1803; Brown vs. Board of Education, 1954, e US vs Nixon, 1974, estabeleceram o princípio da supremacia da Constituição e a Suprema Corte como intérprete. Ninguém sério questiona o poder dela de dar a palavra final”.

A última frase é que importa. “Ninguém sério questiona o poder dela (Suprema Corte) de dar a palavra final”.

Quem te viu, quem te vê, cantaria Chico Buarque. Quando era o juiz supremo dos casos de corrupção no Brasil, quando acima dele só pairava, quem sabe, o poder divino, Moro não citava Marbury vs Madison ou Brown vs. Board of Education. Como Átila, o magistrado de Curitiba liderava o avanço dos hunos sobre os pilares do Estado de Direito. O STF, conivente com os desmandos, acovardado, “atento ao clamor das ruas”, segundo um ministro, foi duramente “questionado” pela força-tarefa da Lava Jato nas poucas ocasiões em que decidiu, de maneira incidental, enfrentar os esbirros. Átila converteu-se em um Marco Aurélio, não o primo de Collor, mas o imperador-filósofo romano? Estaria Moro, a esta altura, a nos dizer que Deltan Dallagnol e companhia não seriam sérios?

Vamos refrescar a memória. Em 20 de janeiro deste ano, período de baixa da operação, Dallagnol tuitou: “Quantas pessoas o Supremo condenou até agora, quase 6 anos depois? A pergunta mereceu a resposta do colega Roberson Pozzobon: “A verdade é que com a decisão do STF que impôs o fim da prisão em segunda instância as solturas não foram nem um pouco seletivas. Os oligarcas condenados foram soltos de maneira ampla e abrangente”.

Em setembro do ano passado, o mesmo Dallagnol, que desenvolveu uma carreira paralela de palestrante, atacou em um seminário: “Chega lá [no STF] e tem entendimento diferente, novo, com o qual a gente não contava na investigação e derruba [o processo] para trás. Isso é contraproducente”. Dias antes, em nota, a força-tarefa seguiu o mesmo caminho: “Os Ministros estabeleceram uma nova interpretação que, se for aplicada como nova regra, vai alterar entendimentos pacíficos sobre princípios como o da ampla defesa”.

Enquanto pressionava a corte em público, a Lava Jato buscava formas de desmoralizar ou incriminar ministros do tribunal, segundo as revelações do site The Intercept na série apelidada de “Vaza Jato”. Havia uma obsessão em derrubar Gilmar Mendes, maior crítico dos métodos da operação. Ao enviar uma mensagem sobre a chegada de documentos da Suíça, Pozzobon insinua: “Vai que tem um para o Gilmar… hehehe”. Athayde Ribeiro da Costa responde: “Ai vc estaria investigando ministro do supremo, robinho… nao pode”. Roberson riu e retrucou: “Não que estejamos procurando, mas vaaaaai que.”

As mensagens vazadas mostram ainda que os procuradores estimulavam os “protestos populares” contra magistrados do STF. À época, lavajatistas ameaçaram o então ministro Teori Zavascki e seu colega Edson Fachin. Ao contrário das investidas recentes contra Alexandre de Moraes, que resultaram na prisão e no indiciamento dos bolsonaristas que fizeram arruaça na porta do juiz, os apoiadores de Moro não responderam por seus atos. Ao contrário. Foram aplaudidos. Os tempos eram outros. Não muito sérios.

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