Justiça
Inquérito do golpe: o que as defesas dos denunciados alegam ao STF
O prazo dado pelo STF para que os denunciados por envolvimento na trama golpista se encerra nesta quinta-feira. Até o momento, 21 suspeitos de participar da organização criminosa se manifestaram


As defesas dos mais de trinta denunciados sob suspeita de integrar uma organização criminosa que atou para reverter o resultado das eleições presidenciais em 2022 e manter Jair Bolsonaro (PL) no poder começaram a aportar no gabinete do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, nesta quinta-feira 6.
O passo seguinte à apresentação das contestações aos argumentos da Procuradoria-Geral da República é a liberação do caso para julgamento na Primeira Turma do STF. Até o momento, apenas 21 denunciados se manifestaram. O prazo estipulado por Moraes, de 15 dias, se encerra nesta quinta.
A exceção é o ex-ministro da Casa Civil Walter Braga Netto, que tem até esta sexta-feira para se defender.
Mais cedo, o ministro barrou, pela segunda vez, a tentativa dos advogados do general para estender o período para apresentação da defesa. A defesa de Bolsonaro também pediu mais tempo para analisar as provas obtidas ao longo do inquérito do golpe, mas teve a solicitação negada por Moraes na semana passada.
Os crimes apontados na denúncia envolve organização criminosa, golpe de Estado, dano qualificado e tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito. Confira abaixo as manifestações dos denunciados ao STF:
- Marcelo Costa Câmara: o coronel e ex-assessor de Bolsonaro negou à Corte qualquer envolvimento no caso e defendeu o impedimento de Moraes para julgar o inquérito. Para a defesa dele, o ministro não deveria estar à frente da investigação por ter sido alvo de uma conduta em apuração: a do seu monitoramento antes da posse de Lula (PT), como parte do plano para assassinar o magistrado, o petista e seu vice Geraldo Alckmin. A manifestação de Câmara ainda que a denúncia da PGR não detalha qual é o envolvimento do militar com a trama golpista.
- Bernardo Romão Corrêa Netto: primeiro a se manifestar, o coronel do Exército reafirmou sua inocência e pediu que o inquérito seja arquivado. Ele é acusado de integrar um núcleo que incitava militares a aderir a uma estratégia de intervenção militar para impedir a posse de Lula, afirma que ele não tinha intenção de participar de nenhuma trama golpista. As mensagens apreendidas pela Polícia Federal que apontariam para sua participação na organização, diz a resposta enviada ao STF, são “meras bravatas, destemperos emocionais, patacoadas ou desabafos, que não tinham o condão de colocar em perigo a ordem constitucional vigente e podem até configurar outro crime, mas não contra o Estado Democrático de Direito”.
- Carlos Rocha, presidente do Instituto Voto Legal: contratado pelo Partido Liberal para questionar vulnerabilidade das urnas eletrônicas durante as eleições de 2022, o engenheiro afirmou ao tribunal que a equipe técnica do IVL nunca mencionou a palavra “fraude” ao tratar sobre o sistema eleitoral.
- Cleverson Ney, coronel e assessor do general Estevam Theóphilo; e Ronald Ferreira de Araújo Júnior: ambos defenderam o arquivamento do processo e afirmaram ser inocentes das acusações.
- Marcio Nunes de Resende Jr.: a defesa do coronel do Exército disse ao STF que sequer foi indiciado pela PF no relatório final da investigação e sustentou que uma reunião de militares ocorrida na casa de seu pai em 28 de novembro de 2022 teria sido, na verdade, uma confraternização entre colegas que serviram juntos na qual conversaram sobre diferentes assuntos e até sobre a situação política do país “sem que isso significasse qualquer movimento para uma ação golpista”.
- Alexandre Ramagem, deputado e ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência: Ele disse ao STF que não teve envolvimento com a trama golpista e argumentou que já havia deixado o governo em março de 2022 para disputar a vaga de deputado federal, não tendo “interesse de instigar ou anuir com a suposta conduta de quem quer que fosse”.
- Augusto Heleno, general e ex-chefe do GSI sob Bolsonaro: A defesa do ex-ministro disse que a denúncia apresentada pelo procurador-geral Paulo Gonet no inquérito do golpe é um “verdadeiro terraplanismo argumentativo”. Além disso, o advogado Matheus Mayer Milanez afirmou que a situação processual do seu cliente seria “muito similar” à de Lula ao defender que o caso tramite na primeira instância, bem como reafirmou a inocência de Heleno.
- Jair Bolsonaro: Apontado como líder da organização criminosa, o ex-presidente alegou, por meio dos seus advogados, que houve restrições ao acesso a provas do inquérito e mencionou suposto cerceamento de defesa. Para os defensores, a gravidade do caso e o fato de envolver autoridades como um ex-Presidente da República justificam que o julgamento ocorra no plenário do STF, formado pelos 11 ministros, e não em uma das turmas da Corte, que são compostas por apenas cinco ministros cada. “Parece ser inadmissível que um julgamento que envolve o ex-Presidente da República não ocorra no Tribunal Pleno. E não se diz isso apenas em função da envergadura do caso, do envolvimento de um ex-presidente e diversos ex-ministros de Estado”, diz o documento.
- Mauro Cid, tenente-coronel e ex-ajudante de ordens do Bolsonaro: Na petição encaminhada ao STF, a defesa do militar afirmou que não fez delação sob ameaça e pediu sua absolvição por considerar que presenciou os episódios citados na acusação enquanto exercia uma função de subordinado ao então presidente. Segundo os advogados, ao agir como porta-voz do ex-presidente, o ex-ajudante de ordens estaria cumprindo apenas o seu trabalho. “Essa conduta de “porta-voz” que lhe é atribuída pela Procuradoria Geral da República, era sua obrigação legal vinculada ao estrito cumprimento de seu ofício, e como tal, abrigada por uma excludente de ilicitude devidamente prevista no Código Penal”, alega a defesa.
- Nilton Diniz Rodrigues: O general sustentou que a denúncia contra ele é genérica e carece de provas concretas, não especificando sua participação nos crimes alegados. Seus advogados também argumentaram que a única presença dele confirmada foi em uma reunião sem propósito golpista e que não há evidências de sua associação a qualquer organização criminosa.
- Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa: A manifestação do ex-chefe das Forças Armadas usa trechos da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid para tentar se apresentar como integrante de um grupo de “pessoas moderadas”. Os advogados dele também argumentaram também que o general não constava da relação de autoridades que assumiriam um Gabinete de Crise previsto para ser instituído caso a intentona golpista prosperasse.
- Rodrigo Bezerra de Azevedo: O tenente-coronel do Exército também defendeu ser inocente das acusações e sugeriu que Moraes, o ministro do STF Flávio Dino e o presidente Lula sejam ouvidos como testemunhas.
- Mário Fernandes, general e ex-assessor da Presidência sob Bolsonaro: Os advogados reclararam do prazo de 15 dias para apresentar resposta, de não ter acesso às provas e que o STF não deveria ser a Corte a julgar a denúncia, já que o general não tem direito a foro privilegiado. Os advogados pedem ainda a anulação da delação de Mauro Cid e da prisão preventiva do general.
- Marília Ferreira de Alencar, delegada da PF e subsecretária de Inteligência do Distrito Federal no 8 de Janeiro: A defesa afirmou que ela agiu dentro de suas funções à época, “tentando gerenciar da melhor maneira possível a área de inteligência da SSP/DF, juntamente com sua equipe, mesmo estando a poucos dias no cargo”.
- Wladimir Matos Soares: O policial federal afirmou ao tribunal que não participou do plano para matar Moraes, Lula e Alckmin. Segundo os advogados de defesa, “as provas apresentadas na denúncia baseiam-se em mensagens de aplicativos de comunicação, sem a devida contextualização”. Eles solicitaram o desmembramento do inquérito, a rejeição da denúncia, a revogação da prisão preventiva e pediram a oitiva de sete testemunhas.
- Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros, tenente-coronel do Exército: Os defensores de Cavaliere disseram ao STF que ele não promoveu qualquer ação tática para pressionar o Alto Comando a aderir ao golpe. “A pergunta fundamental é saber se em razão dos pronunciamentos públicos agressivos, ataques virtuais, utilização indevida da estrutura de inteligência, manipulação de notícias eleitorais, ou dos atos do dia 8 de Janeiro algum poder constitucional foi restringido ou impedido? A resposta é negativa”, diz.
- Estevam Theophilo, general do Exército: A defesa dele contestou a investigação da PF, afirmando que ela foi “conduzida de forma viciada”. Os advogados do militar argumentam que fatos ocorridos em 2021 não podem ser utilizados por Moraes como parte de uma suposta tentativa de golpe de Estado, uma vez que o governo do presidente Lula foi legitimamente eleito apenas em 2022.
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça sob Bolsonaro e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal: A defesa dele chamou a denúncia da PGR de “irresponsável” e “fruto de um roteiro imaginário”. Assim como outros denunciados, Torres não quer ser julgado pelo STF, e sim pela primeira instância. E, caso, o julgamento siga no Supremo, pede que seja julgado pelo plenário, e não pela Primeira Turma.
- Fabrício Moreira de Bastos, coronel do Exército: A defesa argumentou que denúncia da PGR se baseia em trocas de mensagens, mas não comprova a participação do coronel, de fato, e pediu impedimento de seis dos 11 ministros do STF. Para os advogados do coronel, Moraes não poderia julgar o caso porque está envolvido nele; Flávio Dino, Luís Roberto Barroso, porque já deram declarações contra Bolsonaro; Dias Toffoli e Cristiano Zanin, por já terem sido advogados de Lula, e Edson Fachin, por ter demonstrado apoio ao petista.
- Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil de Jair Bolsonaro: Na manifestação, a defesa de Braga Netto afirma que a denúncia da PGR é “surrealista” e “sustenta absurdos”, além de criticar o acordo de delação de Cid. “Tal qual um filme ruim e sem sentido, a denúncia apresenta furos em seu roteiro que desafiam qualquer lógica plausível. De forma surrealista, sustenta absurdos como o plano de prisão de uma pessoa morta. Se não há compromisso com a lógica, certamente que não há nenhum comprometimento com a prova”, afirmam os advogados do general.
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