Justiça

Hospitalizado, advogado participa de audiência após juiz recusar remarcar sessão

‘Eu duvido que ele presidiria audiência da forma como eu participei’, afirma Flávio Grossi sobre o juiz do Tribunal de Justiça Militar de SP

Hospitalizado, advogado participa de audiência após juiz recusar remarcar sessão
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(Foto: Reprodução)
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O advogado Flávio Grossi participou de uma audiência diretamente do hospital após o juiz responsável se negar a remarcar a sessão. O caso aconteceu na quarta-feira 11 durante a oitiva de uma testemunha de defesa e o interrogatório do acusado, um policial militar acusado de ter disparado tiros de borracha contra foliões no carnaval de 2019.

Grossi chegou ao hospital com suspeita de Covid-19 na madrugada do domingo 8, após exames mostrarem manchas em seu pulmão. Como o advogado possui asma crônica, os médicos acharam melhor deixá-lo sob observação.

Ao entrar em contato com o juiz José Álvaro Machado Marques, do Tribunal de Justiça Militar de São Paulo (TJM-SP), uma assistente judiciária afirmou que a audiência estaria mantida por orientação do magistrado devido aos “diversos esforços às intimações de audiências virtuais” – o contato repetido com as demais partes do processo para marcar uma nova data.

Com a recusa e o andamento da sessão, Flávio afirma que se sentiu desrespeitado e que o caso demonstra um “absolutismo dos magistrados brasileiros”.

“Isso mostra um pouco do absolutismo dos magistrados brasileiros. O magistrado pode muito, mas não pode tudo. Digamos que fosse o juiz internado. Eu duvido que ele presidiria audiência da forma como eu participei. O juiz não se colocaria num vídeo do Tribunal Militar de Justiça do Estado usando uma camisola e com cateter de oxigênio para conduzir uma audiência.”, relatou.

O caso em questão também foi alvo de interesse midiático. Grossi é advogado de defesa de duas vítimas de um policial que participou de uma ação de repressão a um bloco de rua no Carnaval de 2019, na região de Pinheiros, São Paulo. Imagens mostram que a rua já estava livre para a passagem de carros, mas, mesmo assim, um grupo de PMs lançou bombas de efeito moral e fez uso de balas de borracha contra pessoas que estavam na calçada.

Uma das vítimas, ao ir procurar a delegacia para prestar queixa, deparou-se com o policial que desferiu o tiro contra ela. No bate boca – que foi gravado pela vítima -, o PM afirma que “não tem cerimônia para quebrar cara de mulher”. Na delegacia, policiais ainda se negaram a registrar boletim de ocorrência sobre o caso.

Devido à quantidade de provas nos autos – como vídeos que circularam na mídia na época do ocorrido e os áudios de uma das vítimas -, Grossi afirma que a sugestão de enviar perguntas por meio do Ministério Público para o processo era “insuficiente”.

“É insuficiente, porque uma coisa é o MP e outra coisa é a acusação. A condição de acusação é partilhada, mas nós temos visões diferentes. Era de extrema importância a audiência de ontem. Eu queria inclusive que fosse uma audiência ao vivo, porque tem vídeos no processo que precisavam ser mostrados, vídeos do réu atirando nos meus clientes enquanto eles estão rendidos, com as mãos para cima.”, afirma.

Em nota, a Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP) afirmou que existem prerrogativas suficientes para que o juiz tivesse orientado a mudança de data da audiência, encontradas inclusive nas resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para a realização de sessões online na pandemia.

“A OAB SP, por meio de sua Comissão de Direitos e Prerrogativas, já está em contato o Advogado e, após as devidas apurações, adotará as medidas cabíveis e necessárias para salvaguarda dos direitos e prerrogativas da Advocacia no episódio”, afirmou o órgão.

CartaCapital entrou em contato com o CNJ, mas não havia obtido respostas até o fechamento desta reportagem.

Já a assessoria de imprensa do TJM-SP afirmou que o juiz “não forçou” a participação do advogado porque haveria uma outra assistente de acusação que poderia substituí-lo, e que foi o advogado quem preferiu seguir com a audiência mesmo do hospital. Grossi contesta e afirma que a advogada nunca atuou no caso, mas que atuava como assistente naquele momento.

Para o advogado, suas clientes saíram lesadas na qualidade da defesa devido à situação do advogado em uma audiência de grande importância.

“Ele me desrespeitou enquanto ser humano e o meu trabalho. Você acha que meus clientes tiveram a mesma qualidade de defesa se eu estivesse bem, em um escritório, com um computador decente? Tive que fazer pelo celular.”, relatou.

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