Justiça
Gilmar Mendes vota para derrubar a tese do Marco Temporal; Dino acompanha
Os demais ministros devem apresentar seus votos até quarta-feira 18
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou pela derrubada da tese do marco temporal prevista na Lei nº 14.701/2023 e propôs a fixação de um prazo de dez anos para que a União conclua todos os procedimentos de demarcação de terras indígenas ainda pendentes.
O texto preserva alguns dispositivos da Lei do Marco Temporal, como a participação de estados e municípios nos processos demarcatórios e a exigência de ampla publicidade das etapas conduzidas pela Funai. Nos temas em que não houve acordo, Gilmar analisou individualmente a constitucionalidade dos dispositivos questionados nas ações sob sua relatoria.
Entre os pontos considerados inconstitucionais, o ministro restringiu o reconhecimento da boa-fé nas benfeitorias realizadas em terras indígenas. Pelo voto, a indenização só será devida até a data do ato administrativo que reconhece formalmente os limites da terra indígena— e não mais até a conclusão total do procedimento demarcatório, como previa a lei. Segundo o relator, a regra anterior poderia estimular benfeitorias de má-fé e inflar os custos de indenização para a União.
Gilmar também derrubou o dispositivo que proibia a ampliação de terras indígenas já demarcadas.O voto reafirma a jurisprudência do STF no Tema 1031, segundo a qual o redimensionamento não é vedado, podendo ocorrer em caráter excepcional, desde que comprovado erro grave e insanável no procedimento anterior.
Outro ponto relevante diz respeito aos processos administrativos de demarcação ainda em curso. Embora devam se adequar às diretrizes da nova Lei nº 14.701/2023, o ministro ressalvou os atos administrativos já praticados antes da entrada em vigor da norma, garantindo que não sejam anulados retroativamente.
Por fim, o voto estabelece um prazo de até 60 dias para que os Poderes Públicos cumpram uma série de determinações de caráter estrutural. As medidas organizacionais deverão ser implementadas de forma imediata e mantidas até que o Congresso Nacional edite uma lei formal e materialmente adequada sobre o tema.
Como votou Flávio Dino
O ministro Flávio Dino acompanhou o relator, mas fez ressalvas. Ele defendeu que os órgãos públicos tenham 180 dias para editar uma nova lei, dentro dos parâmetros decididos pelo STF, após o fim do julgamento, em contraponto ao prazo sugerido pelo relator.
Além disso, reconheceu a validade da proposta de um anteprojeto de lei, elaborado pela Comissão Especial, mas votou pela inconstitucionalidade de mais alguns artigos da Lei do Marco Temporal. Dino sugeriu retirar a previsão que aplicava aos antropólogos e peritos as regras de impedimento e suspeição previstas no Código de Processo Civil. O ministro alega que já existe uma regulamentação própria para esses profissionais atuarem, prevista na Lei 9.784/1999.
Os próximos passos do julgamento
O julgamento começou nesta segunda-feira 15 e segue até quarta-feira 18, no plenário virtual do STF. As discussões vinham ocorrendo no plenário físico, mas foram transferidas a pedido do próprio Gilmar Mendes. Votam todos os ministros da Corte.
Ao longo do ano, uma comissão composta por representantes do setor agropecuário, da União e do Congresso Nacional debateu, ponto a ponto, a Lei do Marco Temporal, com o objetivo de formular uma proposta capaz de acomodar interesses divergentes.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) deixou a comissão logo no segundo encontro. A entidade argumentou que o artigo 231 da Constituição Federal já estabelece, de forma suficiente, as diretrizes para a demarcação de terras indígenas e que não é possível construir consensos com atores que, segundo a organização, estão diretamente envolvidos em conflitos em territórios ainda não demarcados.
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