Justiça

Empregada doméstica é resgatada de trabalho escravo no interior de São Paulo

A mulher trabalhou por quase 30 anos sem receber salários e ter acesso a seus direitos

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Uma operação da Polícia Militar e do Ministério Público do Trabalho resgatou uma empregada doméstica que estava em condições análogas à escravidão há cerca de 30 anos em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo.

A mulher, de 82 anos, negra e analfabeta, foi enganada pelos patrões, que alegavam que os salários estariam “sendo guardados para ela”.  A operação aconteceu após as autoridades receberem uma denúncia anônima.

Em depoimento, a idosa disse que “não conhecia dinheiro” e que seus patrões enviavam todo mês 100 reais para seu irmão. Ela afirmou ter começado a trabalhar como doméstica ainda criança e sido “cedida” aos atuais empregadores após a morte da antiga patroa. 

O casal também ficava com os valores recebidos pela idosa por meio do programa Benefício de Prestação Continuada. 

“Ela tinha o sonho grande de ter uma casa em recompensa por todos esses anos de trabalho, e ela expressava isso. Ela tinha essa crença muito forte de que receberia essa casa da empregadora”, detalha a auditora fiscal do trabalho Jamile Freitas Virginio.

Virginio ainda aponta que todos os indicadores de trabalho análogo ao de escravo estão presentes no caso, como a vulnerabilidade, a retenção salarial e a negação sistemática de todos os direitos trabalhistas. 

“A vítima trabalhava há quase três décadas sem nenhum recolhimento previdenciário, sem registro na carteira de trabalho, sem garantia de recebimento de salário, de férias, de 13º salário. Mesmo o descanso semanal não era respeitado como deveria, as férias não eram concedidas como deveriam. Havia uma negação da pessoa como um sujeito de direitos, como se ela não tivesse direito a ter direitos.”

Durante a operação, a empregadora se dirigiu de forma violenta aos auditores ficais, proferindo ameaças. Também tentou fugir da residência levando a doméstica, para evitar a identificação.

Após o resgate, a idosa foi encaminhada à Defensoria Pública da União para buscar na Justiça do Trabalho o direito aos valores retidos pelos empregadores. O casal poderá ser incluído na “lista suja do trabalho escravo”. 

Na última sexta-feira 1º, uma decisão judicial determinou o bloqueio de bens do casal no valor de 815 mil reais. 

O montante será transferido para a trabalhadora como forma de reparação pecuniária de uma vida inteira de abusos e submissão praticados pelos empregadores. 

“Mulher, negra, de origem humilde, analfabeta, ela é mais um exemplo de interseccionalidade, uma vez que evidencia a sobreposição de opressões e discriminações existentes em nossa sociedade, as quais permitiram que tantos anos se passassem sem que a presente situação de exploração fosse descoberta pela comunidade que rodeava a família”, lamenta o procurador Henrique Correia.

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