Justiça
Como funcionava o suposto esquema de desvio de verba de Gustavo Gayer, segundo a PF
O bolsonarista é suspeito de montar um esquema para desviar verbas parlamentares para organizações de fachada; o deputado nega e questiona operação às vésperas de eleição
Para a Polícia Federal, Gustavo Gayer (PL-GO), deputado federal bolsonarista que já se envolveu em diversas polêmicas por acusações vazias contra o sistema eleitoral e o Judiciário, é a figura central de um suposto esquema criminoso cujo objetivo seria desviar verbas parlamentares.
Por causa da suspeita, os investigadores foram até endereços ligados ao parlamentar e, na manhã desta sexta-feira 25, cumpriram 19 mandados de busca e apreensão em Brasília (DF) e Goiás (GO).
Segundo a PF, existiria um “agrupamento de pessoas, com estrutura ordenada e divisões de tarefas, inserta em ambiente político, voltado para tredestinar verbas parlamentares”.
Sob as ordens de Gayer, o grupo realizava “expedientes fraudulentos, consistentes em falsificação de documentos, além do empenho de custos empresariais à conta pública”, de acordo com Leonardo Américo Angelo Santos, o delegado responsável pelo caso.
A PF suspeita que Gayer teria desviado recursos de verbas parlamentares para financiar as suas próprias empresas. Em um dos casos, teria usado dinheiro público para alugar um espaço em Goiânia, onde instalou a escola de inglês Gayer Language Institute e a loja Desfazueli.
Para desviar o dinheiro, Gayer teria agido na criação de entidades fictícias. Também teria adquirido uma associação inativa, qualificando-a como entidade do terceiro setor.
Essa ação foi destacada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, que autorizou a operação desta sexta. Para o magistrado, a associação servia para receber a verba pública.
Gayer não estava sozinho no suposto esquema. A PF entende que a irregularidade era conhecida por assessores do deputado. Os investigadores chegaram à suspeita depois de acessarem mensagens entre João Paulo de Sousa Cavalcante e Marco Aurelio Alves Nascimento, que são, respectivamente, assessor e secretário parlamentar de Gayer.
“E eu fico preocupado porque eu já falei pro GUSTAVO um dia eu chamei atenção sobre a questão da escola”, diz um trecho da conversa, sem identificação de quem enviou a mensagem.
“Ou seja a escola tá sendo paga com recurso público e tá sendo usada pra um fim totalmente que tipo num existe né num tem como ser assim e aí eles vão levando ou seja ainda não entenderam a gravidade sabe”, diz outro trecho transcrito pela PF.
Assim, segundo os investigadores, Gayer desviava os recursos a partir de duas posições. A primeira seria pelo fato de ter direito a verba parlamentar, em função de seu cargo. A segunda seria beneficiando a si próprio, já que ele operava as empresas mencionadas, apesar de utilizar os nomes de outras pessoas como responsáveis.
Outra suspeita é que Gayer teria adquirido a Associação Comercial das Micro e Pequenas Empresas de Cidade Ocidental, em Goiás, para receber verbas públicas. A PF informou que chegou a identificar dois documentos supostamente falsificados ligados ao caso.
O esquema foi dividido pela PF em dois núcleos. O primeiro era coordenado por assessores e auxiliares de Gayer. O segundo era composto por pessoas que funcionavam como responsáveis pelos grupos de fachada — empresas e organizações —, que recebiam o dinheiro desviado.
Ainda não há detalhes sobre a extensão do dano aos cofres públicos, o que exigirá investigação judicial, em caso de eventual denúncia.
O papel de João Paulo de Sousa Cavalcante
Uma figura importante no suposto esquema, já citada, é João Paulo de Sousa Cavalcante. Ele é dono da empresa Goiás Online e, publicamente, se dizia amigo de Gayer.
Cavalcante foi preso por participação nos atos golpistas de 8 de Janeiro de 2023. Foi nessa oportunidade que a PF, ao acessar o celular do empresário, percebeu que Gayer teria tentado contratá-lo.
Como Cavalcante tem uma condenação prévia, não poderia ser contratado pelo parlamentar. A alternativa foi constituir a Goiás Online para ser contratada pelo gabinete. Na prática, segundo a PF, a empresa servia como assessoria de Gayer.
“As atividades desempenhadas pela Goiás Online, sob a fachada de serviços de publicidade e marketing, na realidade consistiam em assessoria parlamentar, o que foi evidenciado pelo gerenciamento da agenda do deputado por João Paulo”, afirmou o delegado responsável pela investigação.
O que diz Gustavo Gayer
O parlamentar foi às redes sociais para criticar a operação desta sexta. Ele ressaltou que a ação foi deflagrada dois dias antes do segundo turno da eleição municipal e que o objetivo seria prejudicar “seu candidato” em Goiânia, Fred Rodrigues (PL).
“Já estamos providenciando a habilitação nos autos, que poderá ser admitida somente por Alexandre de Moraes, sem prazo certo e determinado”, afirmou a assessoria do deputado. “Entendemos que ações deste tipo não podem ser deflagradas no ápice do processo eleitoral, posto que atos judiciários interferem diretamente na política local, o que coloca em xeque a seriedade das decisões.”
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