Justiça

Como foi o 1º dia de julgamento do Marco Temporal no STF

Na quinta-feira 11, o Supremo retomará o julgamento com o restante das sustentações orais antes de iniciar a leitura dos votos dos ministros

Como foi o 1º dia de julgamento do Marco Temporal no STF
Como foi o 1º dia de julgamento do Marco Temporal no STF
Foto: Antonio Augusto/STF
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O Supremo Tribunal Federal iniciou nesta quarta-feira 10 o julgamento sobre a tese do marco temporal. Os ministros da Corte irão discutir sobre as ações que foram ajuizadas por partidos políticos e entidades e discutem a validade da lei aprovada em 2023.

O ponto central da tese do marco temporal é que, segundo ela, indígenas somente têm direito às terras que estavam em sua posse em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que estavam em disputa judicial à época.

Após a leitura do relatório por Gilmar Mendes, relator do caso, falaram as partes envolvidas nas ações: Progressistas, Congresso Nacional – que pedem a constitucionalidade da lei –, e Psol, PCdoB, PV, PT, PDT e a Articulação dos Povos Indígenas, que defendem o reconhecimento da inconstitucionalidade da legislação. Na quinta-feira 11, o Supremo retomará o julgamento com o restante das sustentações orais antes de iniciar a leitura dos votos dos ministros.

Os advogados que representaram o PP, a Câmara e o Senado, reclamaram da ausência de objetividade no artigo 231 da Constituição Federal, que versa sobre os direitos dos povos indígenas. Essa “subjetividade excessiva”, disseram, repercute no alto índice de judicialização desses casos na justiça brasileira. Eles acreditam que ao determinar o dia 5 de outubro como marco temporal para oferecer o direito à terra, os conflitos existentes há décadas no país serão finalmente superados.

“O que se está a debater neste julgamento é como e em que extensão deve o estado garantir políticas públicas às comunidades indígenas especialmente quando a concretização dessas políticas públicas afeta diretamente direitos e interesses de não indígenas de boa fé”, comentou a advogada do Senado, Gabrielle Tatith.

As entidades contrárias à constitucionalidade da lei do marco temporal defenderam que o direito à terra é originário aos povos indígenas, uma vez que, além de estar previsto na Constituição, a relação desses povos com a terra é sobretudo espiritual e indissociável de quem eles são. Para eles, a terra não é um bem, mas a construção da identidade das comunidades.

O advogado Ricardo Terena, que falou pela Apib, reforçou que o período de vigência da lei foi marcada por mortes e conflitos que não resultaram em processos conciliatórios. As entidades mencionaram a forte relação entre as comunidades e a preservação ambiental, citando estudos que comprovam que nas terras indígenas o desmatamento é 20 vezes menor do que em áreas privadas vizinhas.

Nara Loureiro, advogada do PDT, disse que durante décadas o discurso econômico foi usado como arma contra a demarcação, criando obstáculos para o progresso. Lembrou que o mercado financeiro global movimenta trilhões de dólares sobre critérios ambientais e de governança. “Bancos e gestores adotam filtros que excluem países e empresas vinculadas a violação dos direitos humanos e degradação ambiental”, concluiu.

A Advocacia-Geral da União defendeu a mesa de conciliação proposta pelo ministro Gilmar Mendes e reforçou os avanços obtidos entre os diálogos com o grupo. A AGU realizou, no âmbito do grupo, o plano transitório para regularizar terras indígenas que estão em litígio judicial – quando as partes não conseguem resolver suas diferenças por meio de acordo.

Falaram também nesta quarta os ‘amigos da Corte’, entidades que não possuem poder decisivo, mas podem se manifestar como interessados no assunto.

Tensão entre poderes

O início da análise do tema pelo Supremo acontece um dia após o Senado aprovar uma proposta de Emenda à Constituição (PEC) que estabelece a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. A matéria segue para a Câmara dos Deputados.

A análise do texto foi vista como um sinal do descontentamento do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), com o decano do STF, Gilmar Mendes. Na semana passada, o ministro decidiu restringir ao procurador-geral da República a prerrogativa de denunciar ao Senado um magistrado da Corte – após a aprovação da PEC pelo Senado, entretanto, Gilmar voltou atrás e suspendeu parcialmente sua própria liminar.

O Supremo decidiu em 2023 que o marco temporal para demarcar terras indígenas é inconstitucional. Ato contínuo, o presidente Lula (PT) vetou um projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional que aplicava essa tese ruralista. No fim daquele ano, porém, o Parlamento derrubou o veto do petista, restabelecendo o marco.

Em meio a esse cenário, partidos de direita acionaram o STF para confirmar a validade do projeto de lei, enquanto legendas de esquerda e entidades que representam os indígenas contestaram na Corte a constitucionalidade da medida.

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