Educação

Reforma tributária do governo pode extinguir 682 mil bolsas do Prouni em dez anos

Desde de 2005, programa teve mais de 1 milhão e 900 mil estudantes beneficiados e formou cerca de 400 mil profissionais

Isla, Letícia, Bianca, João e Janaína | Arquivo Pessoal
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A proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, de criar a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), unificando as cobranças do PIS e Cofins, pode extinguir mais de 682 mil bolsas do Programa Universidade para Todos (ProUni) em uma década, segundo nota técnica do Fórum de Entidades Representativas do Ensino Superior Particular divulgada na última semana.

De acordo com o levantamento, a cobrança de 12% de alíquota em cima do valor das mensalidades do ensino superior, como sugere a reforma tributária proposta pelo governo, pode aumentar em até 10% o preço das parcelas, o que impactaria diretamente a capacidade de manter alunos com isenção de pagamento.

“Com a retirada do Prouni, estima-se uma perda de vagas em dez anos para 682.400 estudantes de baixa renda, sendo que 160.800 imediatamente deixarão de se beneficiar e não terão essa oportunidade no ensino superior”, destaca o documento.

Com base no atual regime, as instituições concedem 412,7 mil bolsas integrais e 119,6 mil parciais (o número exclui entidades filantrópicas).

A cobrança de tributos das instituições de ensino é de 3% de PIS/Cofins sobre as mensalidades. Para as bolsas concedidas pelo ProUni, programa que foi criado para beneficiar alunos de escolas públicas e de baixa renda em 2005, há isenção dessa taxa.

“Isso vai ser o fim do ProUni”, avalia a presidente da Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup), Beth Guedes, em entrevista ao Valor Econômico. “O governo está criando um caos na área da educação”, completou Beth – irmã do ministro da Economia.

Acesso à universidade pode cair

João Victor da Silva, de 21 anos, conta com o programa para conseguir entrar no ensino superior a partir da nota no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), que substituiu os vestibulares em muitas universidades.

É o quarto ano de tentativa do jovem, que divide seu tempo entre o trabalho na construção civil e o estudo. “Pretendo entrar pelo ProUni. Sem a bolsa, é 0% de chance de eu conseguir pagar as mensalidades. Quero entrar para ter essa experiência”, relata o estudante que mora em São Paulo e pretende cursar Direito. 

A estudante do Instituto Federal de São Paulo (IFSP-Guarulhos) Bianca Martins, de 18 anos, também vê no ProUni a oportunidade de chegar ao ensino superior: “É um direito meu estar nesses espaços também. A educação superior, muitas vezes, é a única chance de ter experiências que sem a universidade, nós, meninas periféricas não vamos ter”.

Em 2019, o País ofertou 243.888 bolsas de estudo para estudantes de baixa renda. Caso seja aprovada, a reforma tributária produziria um impacto financeiro de 736 milhões de reais para que as empresas mantivessem as vagas, o que, para os representantes das instituições, é inviável.

Quem se beneficiou

Os professores Vanderlei Benedito e Letícia Souza, do Instituto Federal de São Paulo, fizeram uma pesquisa sobre o perfil dos estudantes que aderiram ao programa.

O levantamento, que reúne dados de 2005 a 2016, concluiu que o ProUni beneficiou cerca de 1 milhão e 989 mil estudantes no período. Desses, 52% eram negros e 53%, mulheres.

Janaína Assumpção, de 33 anos, entra nesse perfil. Fez parte da primeira turma do ProUni em 2005, com bolsa integral no curso de Publicidade e Propaganda na Universidade Anhembi Morumbi, na capital paulista.

“A ascensão financeira pela educação levou minha família para outro contexto de vida social. Hoje, meu sobrinho, por exemplo, tem oportunidade de pensar em outras coisas para além do ProUni, de não passar etapas que eu passei. Do atravessar a cidade para fazer cursinho, do voltar duas horas da manhã e sair às sete para o trabalho”, afirma Janaína – hoje pós-graduada em Marketing e Comunicação Digital pela ESPM, fundadora do Coesão Consultoria e gestora em uma agência de marketing.

“Ele pode viver outras coisas porque a gente já resolveu o básico. Quando a gente resolve isso, a gente deixa esse jovem mais seguro para sonhar”, completa.

Isla Nayara Campos, de 20 anos, estudante de direito, diz que a entrada na faculdade mudou a realidade da família.  A mãe, Idalece Campos e o pai, José de Figueiredo Campos,  concluíram o ensino médio e o ensino fundamental, respectivamente.

De acordo com estudo do professor Sergio Firpo, do Insper, publicado em 2018, a diferença salarial a partir da escolaridade chega a ser 500% a mais para quem tem ensino superior.

“O ProUni não é um benefício, ele é uma medida reparatória para mudar trajetórias. Foi isso que aconteceu comigo”, afirma a publicitária Letícia Guedes, de 25 anos.

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