Economia

Um país e seu destino no Leilão de Libra

Por Rogério Daflon Mestre em Planejamento Energético pela UFRJ e doutor em Engenharia Nuclear pelo Massachusetts Institute of Technology, Ildo Sauer, professor titular da USP, não tem meias-palavras para definir a atual política do governo federal relacionada ao Pré-sal. A geopolítica estratégica no setor, para […]

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Por Rogério Daflon

Mestre em Planejamento Energético pela UFRJ e doutor em Engenharia Nuclear pelo Massachusetts Institute of Technology, Ildo Sauer, professor titular da USP, não tem meias-palavras para definir a atual política do governo federal relacionada ao Pré-sal. A geopolítica estratégica no setor, para ele, ou é ingênua, incompetente ou de má-fé. Sua apreensão aumentou quando o Leilão de Libra apontou a participação de empresas multinacionais como a anglo-holandesa Shell e a francesa Total e outras privadas. Trata-se do primeiro leilão de Pré-Sal e, não só pelo seu imenso potencial de mais de 12 milhões de barris de petróleo, mas também por dar uma direção de como serão os próximos. Os movimentos sociais já se uniram. Sessenta e três entidades enviaram carta à presidente Dilma Rousseff pedindo a imediata suspensão do leilão. Nela, há um argumento central: “Ao permitir que as multinacionais se apropriem do campo de Libra, que, sozinho, pode fazer jorrar até 12 bilhões de barris de petróleo, o governo coloca em risco não só a soberania, como também o desenvolvimento do Brasil”.

“Se não fizesse leilão, o Brasil recuperaria o investimento no Poço de Libra em menos de dois anos. Não há por que fazer leilão”, diz o professor, um ex-diretor da Petrobras.

Para Ildo Sauer, não existe país do mundo que faria um leilão de um campo como Libra sem dimensionar a quantidade de petróleo tem ali. Além disso, enfatiza ele,a Constituição de 1988 deixa claro em seu Artigo 20: “São bens da União: os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva; os potenciais de energia hidráulica; os recursos minerais, inclusive os do subsolo.

“É como se o governo federal estivesse vendendo uma fazenda sem saber quantas cabeças de gado há em seu terreno. A nação que entrega seu petróleo não zela pelo seu futuro”, acrescentou ele, acentuando que a Petrobras tem capacidade de gestão suficiente para poder prescindir de empresas estrangeiras no processo.

O professor diz que a própria Petrobras foi criada e vem sendo mantida com o sacrifício do povo brasileiro.

– O petróleo é do brasileiro e a Petrobras também. O Brasil tem que saber criar excedente (a renda petroleira) para investir no próprio país, que tem carências reconhecidas, como na educação e na saúde públicas e uma profunda necessidade de tocar a reforma urbana, com moradia e mobilidade, a reforma agrária, e melhorar setores como ciência e tecnologia e infraestrutura produtiva.

O professor explicou que o Brasil pode extrair petróleo do Pré-Sal por um baixo custo, no máximo US$ 30 dólares e vendê-lo por US$ 100. Assim, se as reservas do Pré-Sal forem de 100 bilhões de barris, haverá uma produção de US$ 6,85 milhões de barris por dia. O Brasil, nesse ritmo, pode se ombrear a grande produtores como a Arábia Saudita, a Rússia, a Venezuela e o Irã.

Para o campo de Libra, estima o professor, seria necessária a construção de 20 plataformas com um custo de R$ 60 bilhões. A Petrobras, diz Sauer, tem todas as condições de liderar esse processo, fazendo diretamente contrato com empresas sem abrir mão da riqueza que pertence ao país.

A ideia de protestar contra o leilão de Libra é para que novos leilões nesses termos não sejam postos a cabo. A posição do Movimento dos Atingidos por Barragens espelha o que as demais ONGs envolvidas pensam sobre o leilão de Libra.

– A posição do MAB é contraria ao leilão, porque este leilão de Libra que está em curso o processo de exportação do petróleo cru, sugando, assim, o nosso mais rico recurso mineral, sem um desenvolvimento da cadeia produtiva do petróleo. Exportar simplesmente não vai trazer nenhum tipo de desenvolvimento ao país. O Brasil precisa determinar seu tempo para extração do petróleo, fazer sua própria agenda, não deixar ser agendado por pressões de grandes empresas estrangeiras. O debate também é de soberania nacional – disse Joceli, Andrioli, do MAB.

De acordo com João Antônio de Moraes, coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), o artigo 12 da lei da partilha 12.351/2010 – criada pelo então presidente Lula já no contexto do pré-sal e modificando a lei anterior do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que previa leilões para todas as situações – diz que o governo federal em situações onde cabe prevalecer o conceito de soberania nacional.

– O campo de Libra é a maior descoberta de todos os tempos. Já é um campo mapeado pela Petrobras. A União em casos como esse pode determinar que a Petrobras não faça partilha e não fique só com os 30% dela previstos em leilões.

Os senadores Roberto Requião, Pedro Simon e Randolfe Rodrigues, do PMDB, já demonstraram sua contrariedade com o leilão. Em, discurso no Senado, Requião disse que “o país pode, de forma mais racional e em seu interesse, explorar todo o pré-sal sem açodamento. Nenhum país soberano, independente, leiloa petróleo já descoberto. Aliás, Woodrow Wilson, ex-presidente dos EUA dizia: A Nação que possui petróleo em seu subsolo e o entrega a outro país para explorar não zela pelo seu futuro”. Para ele, “ não se trata nem mais de explorar, mas de desenvolver a produção de campo perfurado, testado e comprovado”.

*Reportagem publicada originalmente no site do Canal Ibase

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