Economia

O agronegócio deita e rola, mas é incorreto lhe atribuir vilania exclusiva

Setor merece condenação quando fornece insumos danosos, mas também faz crescer a produtividade com menor ocupação

Resta lamentar o amplo proletariado rural, representado não só por grupos indígenas, quilombolas e de assentados, mas todos aqueles inseridos nos grotões da miséria brasileira
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Pode alguém não ter notado, mas na semana passada, logo no primeiro parágrafo, quis mostrar “com vistas do alto e da lupa, onde o agronegócio pode ser satânico e não”.

Mencionados os benefícios, reconheço que houve e há muita insanidade, destroncamento de pescoços de mogno, desperdício de biomas, enfim, desastres ambientais e sociais causados pela agropecuária, que poderiam ser evitados ou amenizados.

Não acho correto, porém, dar ao agronegócio carga total pelas vilanias. Merece-as, sim, quando fornece insumos danosos, indica doses excessivas e manejos inadequados ou concentra-se em grandes grupos multinacionais para reduzir a rentabilidade da produção primária.

Fora isso e mais, também faz crescer produção, produtividade e agrega valores a esses bens, com menor ocupação territorial.

O capitalismo, no atual ciclo, globalizado e financista, transfere acumulação através de tecnologia e serviços. Ao Brasil, produtor de bens primários, cabe ser competitivo ou a eles agregar valor. Quando o conseguem, abençoam as contas do País.

Setores agropecuários, sem dúvida, deitaram e rolaram sobre ilícitos, embora poucas cabeças tenham sido cortadas pelas mazelas deixadas. Temos melindres em punir o capital e seus maiores detentores.

O movimento “correntão” só começou a dar certo alívio à preservação ambiental a partir da década de 1990, por pressão de movimentos ecológicos nacionais e estrangeiros, empresas privadas temerosas de entrar no rol dos devastadores, e de controle governamental tímido, diante de visigodos Caiados.

Comentários até quiseram me igualar a eles. Sabem nada. Em quase 40 anos pesquisando, trabalhando e escrevendo sobre o tema, mandei bala em todos. De alcaçuz, sim, certamente mais desagradável do que calibre 38.

Tento escrito contra equívocos. Um deles: agronegócio inclui a agropecuária, mas é mais do que ela. Outro: grande parte da produção da agricultura familiar é agronegócio; boa parte de sua produção chega ao mercado ou à nossa mesa já transformada. Nunca devem ser vistos em contraposição.

A diferença é apenas de dimensão conforme culturas. Disso saem tamanho das propriedades, manejos, necessidades e destinos vários. Ha uma enorme diversidade que vem de hábitos regionais e planetários de consumo, e movimenta o comércio internacional na procura de segurança alimentar e divisas.

Resta, e parece eternamente, lamentar o amplo proletariado rural, representado não só por grupos indígenas, quilombolas e de assentados (agora na moda digital), mas todos aqueles inseridos nos grotões da miséria brasileira.

Esperam por um Estado promotor de inserção social. Mecenas privados nunca terão. Estes se aconselham na banca, pai e mãe do “necessário ajuste fiscal”, enquanto o bebê pobreza berra durante batismo na igreja da ortodoxia.

Arbitragem, rentismo, imposto sobre grandes fortunas, isto ninguém tasca, certo?

Marcelo Pellegrini, em excelente matéria para esta CartaCapital, mostra como estão vivendo os grupos quilombolas espalhados pelo País. Somente o Estado poderá ajudá-los. Atenção ministérios dos desenvolvimentos sociais e humanos, o siri e o cacete, como diria Aldir Blanc.

Nada a ver com o agronegócio, pois. Por demorarmos a enxergar esta evidência, deixamos de fazer reforma agrária correta, atrasamos a tecnologia, esquecemos o planejamento agrícola, e montamos arquitetura burocrática a justificar enorme e ineficiente aparelho público.

Se hoje somos um dos principais agentes nesse jogo de interesses pesados e soberanos, eivado de incentivos, barreiras alfandegárias e subsídios, deveríamos demonizar o agronegócio no que ele merece, e não lastimar um passado sem recuperação.

O leite tirado, menos informação.

Depois de quase 15 anos de exibição diária (exceto aos sábados), o agricultor que depois de tirar o leite da Vaca Estrela ligava a TV para assistir ao Globo Rural, deve procurar outra fonte de informação sobre o agronegócio.

Se fissurado nas chamadas da programação altamente cultural da emissora PROJAC – novelas, faustos opulentos, fantásticos Luciano e Rossi, ou noticiários de apresentadores com olhares ora espantados ora ufanistas – pode apenas deixar o televisor ligado e esperar a edição dominical do programa, que a emissora promete manterá.

Isso me faz concordar com quem diz que, no Brasil, o ruim sempre pode piorar. É o caso dessa supressão.

Histórico de qualidade, matérias equilibradas, fonte inesgotável de experiências campesinas, caboclas e sertanejas bem sucedidas, o longevo programa, assim como a revista, sem exagero, podem ser considerados patrimônios de quem produz em áreas rurais.

O matinal diário não apenas tratava de cotações de alimentos em bolsas e no mercado, mas mostrava eventos e exposições, entrevistas, enfim, festas do interior em ritmo de frevo, catira ou xaxado.

Acabou. Alegaram concorrência no horário com o SBT. Gargalho.

Sobram os “canais rurais” da TV fechada, que não valem o que cobram.

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