Economia

‘A economia está decolando’, diz Guedes, mais uma vez; veja por que esse otimismo não faz sentido

Com inflação galopante e rendimento médio em queda, cenário desenhado pelo ministro da Economia encontra pouco suporte na realidade

O ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Sergio Lima/AFP
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O ministro da Economia, Paulo Guedes, voltou nesta sexta-feira 1º a pintar um cenário econômico favorável no Brasil. Em evento no Palácio do Planalto, ele declarou que o País “está decolando mais uma vez, apesar da crise hídrica e da inflação subindo”.

“O Brasil se levantou e começou a caminhar. Tem as reformas institucionais disparando as ondas de investimentos. Nós temos 544 bilhões de reais de investimentos já contratados”, argumentou Guedes. “O Brasil vai crescer. Diziam que nós iríamos estar no fundo do poço, nós voltamos ‘em V’. Dizem que no ano que vem nós não vamos crescer, nós vamos crescer de novo.”

O otimismo do ministro, no entanto, encontra poucos pontos de apoio na realidade. Dados divulgados pelo IBGE na quinta-feira 30 mostram que 14,1 milhões de brasileiros estão desempregados. A taxa de desemprego, que ficou em 13,7% no trimestre encerrado em julho, teve redução de um ponto percentual na comparação com o período entre fevereiro e abril.

A pesquisa do IBGE, no entanto, indica que os trabalhadores subocupados por insuficiência de horas trabalhadas chegaram a um recorde: 7,7 milhões. O aumento é de 7,2%. O número indica que a recuperação declamada pelo governo se sustenta em postos de reduzida qualidade, com poucas horas de trabalho.

O aumento da população ocupada indicado pela pesquisa é impulsionado principalmente pela informalidade. Segundo o IBGE, o trabalho informal chegou a 36,3 milhões de pessoas e a uma taxa de 40,8%. No trimestre anterior, a taxa foi de 39,8%, com 34,2 milhões de pessoas. Há um ano esse contingente era menor: 30,7 milhões e uma taxa de 37,4%.

“Em um ano, o número de informais cresceu 5,6 milhões. O avanço da informalidade tem proporcionado a recuperação da ocupação da PNAD Contínua”, explica Adriana Beringuy, analista da pesquisa.

O trabalho por conta própria cresceu e atingiu o recorde de 25,2 milhões de pessoas, um aumento de 4,7%, com mais 1,1 milhão de pessoas. Em relação ao mesmo trimestre do ano passado, o contingente avançou 3,8 milhões, alta de 17,6%. Entre as categorias da informalidade, é a que mais cresceu no último trimestre.

No setor privado, o contingente de empregados sem carteira assinada subiu 6%, para 10,3 milhões. No ano, o aumento é de 19%. Já o avanço do número de empregados com carteira de trabalho no trimestre foi mais modesto, de 3,5%.

Outro detalhe significativo é que o rendimento médio real não acompanha o crescimento da ocupação: ele caiu 2,9% frente ao trimestre anterior e 8,8% na comparação com o mesmo trimestre de 2020, ficando em 2.508 reais.

“Temos mais pessoas ocupadas, no entanto, com rendimentos menores. Isso faz com que a massa de rendimentos fique estável. A despeito de um crescimento tão importante da população ocupada, a massa de crescimento não acompanha a expansão, devido ao fato de a população ocupada estar sendo remunerada com rendimentos menores, tanto na comparação trimestral quanto na anual”, conclui a analista da PNAD.

O bolso do consumidor

Tudo isso sem mencionar o fantasma da inflação. Na quinta-feira 30, o Banco Central subiu de 5,8% para 8,5% a estimativa para o avanço do IPCA em 2021. Segundo o BC, passou de 74% para 100% a probabilidade de a inflação superar o teto da meta, de 5,25%. Com isso, a taxa básica de juros, a Selic, tende a seguir em elevação. A instituição já indicou que deve promover um novo aumento no índice, que deve chegar a 7,25% ao ano no fim de outubro.

Nos próximos dias, os brasileiros conhecerão os números do IPCA de setembro. Até aqui, o balanço mais recente é o de agosto, em que o índice avançou 0,87%, a maior taxa para o mês desde 2000.

Em 24 de setembro, o IBGE divulgou o IPCA-15, que é uma prévia da inflação oficial do País. O índice aponta uma aceleração de 0,87% em agosto para 1,14% em setembro.

De acordo com o IBGE, “trata-se do maior resultado para o mês de setembro desde o início do Plano Real, em 1994, quando ficou em 1,63%”. É também a maior taxa da série histórica do indicador desde fevereiro de 2016, quando ficou em 1,42%.

No ano, o índice acumulou elevação de 7,02%. No acumulado de 12 meses, atinge 10,05%, quase o dobro do teto da meta do governo. Sem surpresas, gasolina e energia elétrica ‘contribuíram’ com 0,17 ponto percentual cada.

O preço médio da gasolina cresceu 2,85% entre agosto e setembro – no ano, a alta é de 33,37% e, nos últimos 12 meses, de 39,05%. Já o preço médio da energia elétrica teve alta de 3,61% em setembro – 20,27% no ano e 25,26% em 12 meses.

Mas praticamente tudo ficou mais caro. Dos 367 itens que compõem a cesta analisada pelo órgão, 253 subiram. Dos nove grupos pesquisados, oito registraram aumento de preços – somente o de educação teve taxa negativa.

A inflação do grupo de alimentação e bebidas acelerou de 1,02% em agosto para 1,27% em setembro. As carnes tiveram reajuste de 1,10%, mas os alimentos que registraram os maiores aumentos no mês foram a batata-inglesa (10,41%), o café moído (7,80%), o frango em pedaços (4,70%), as frutas (2,81%) e o leite longa vida (2,01%).

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