Diversidade

‘Quando o Brasil da diversidade ganha medalha, Bolsonaro se cala’, diz manchete do Eurosport

Em Tóquio, Brasil quebrará recorde de medalhas graças ao sucesso de atletas mulheres, negros e daqueles que afirmam sua homossexualidade

Foto: Oli SCARFF/AFP
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Cinco anos depois do Rio, o Brasil já ultrapassou seu histórico total de medalhas em Tóquio, levadas por uma geração de atletas comprometidos, das minorias históricas deste imenso país. “Uma afronta à política posta em prática por Jair Bolsonaro e suas posições ultraconservadoras. Então, inevitavelmente, ouvimos pouco do presidente brasileiro sobre essas Olimpíadas”, escreve o Eurosport, estampando a matéria com uma foto da baiana Ana Marcela Cunha, campeã de nado livre e homossexual assumida.

Graças em particular ao sucesso de suas esportistas, de seus atletas de origem africana e daqueles que afirmam sua homossexualidade, o Brasil certamente conquistará pelo menos 20 medalhas nos Jogos Olímpicos de Tóquio, um recorde em sua história, para desgosto de seus conservadores presidente Jair Bolsonaro, continua o texto.

Há cinco anos, no Rio, o Brasil conquistou 19 medalhas. Antes do fim de semana final, o país já tem a garantia de trazer do Japão pelo menos mais uma.

Esta safra é para atletas tão diversificados quanto a população deste imenso país, onde vivem 212 milhões de pessoas, como a ginasta negra Rebeca Andrade (medalhista de ouro no salto após ganhar a prata no individual geral), a nadadora lésbica Ana Marcela Cunha (medalha de ouro nos 10 km em águas abertas) ou os velejadores Martine Grael e Kajena Kunze (já titulados no Rio e novamente campeões olímpicos em Tóquio na 49er FX).

“Esta medalha é dedicada a todos aqueles que lutaram pela defesa dos direitos das mulheres e das pessoas LGBT”, disse a baiana Ana Marcela Cunha, que compartilha a vida com uma atleta brasileira no pólo aquático.

 

Visibilidade

As façanhas da Seleção Olímpica Brasileira, cuja população é 55% negra ou parda, é uma afronta às posições muito conservadoras de Bolsonaro, regularmente acusado de fazer comentários racistas, misóginos e homofóbicos, diz a matéria, reproduzida da agência AFP.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos também alertou em abril para o aumento de crimes e discursos ligados ao ódio desde a chegada ao poder do presidente brasileiro em 2019.

“Essas vitórias de mulheres, negros e LGBTQIA + ajudam a dar visibilidade a outras formas de vida, que eram oprimidas, excluídas e praticamente invisíveis até recentemente em nossa história”, disse a antropóloga Claudia Kessler, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

No Brasil, “a escravidão dos negros (que só foi abolida em 1888), a internação forçada de homossexuais em hospitais psiquiátricos e a ausência dos direitos civis das mulheres duraram séculos”, lembrou à AFP.

Na verdade, os esportes brilharam em Tóquio. No entanto, mulheres de sucesso no Brasil não são cuidadas e não são facilitadas.

Elas ganham 76,5% do salário dos homens por trabalho igual, de acordo com um relatório de 2018 do Instituto Nacional de Geografia e Estatística, que observa que “as mulheres estudam mais, trabalham mais, mas recebem menos do que os homens”.

O país tem uma longa tradição machista e a violência contra as mulheres está impregnada da cultura local: o Brasil registrou 1.350 feminicídios no ano passado, 23.000 casos de violência doméstica e cerca de 14.000 estupros, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

“Debate nacional necessário”

E uma lei que proibia as mulheres brasileiras de praticar esportes considerados “incompatíveis com sua natureza”, incluindo futebol, boxe, rúgbi e levantamento de peso, só foi revogada há 40 anos.

“A força do esporte, a visibilidade dos Jogos Olímpicos e das vitórias (em Tóquio) ajudarão a relançar um debate nacional necessário sobre minorias, mulheres, gays, negros no Brasil”, disse a socióloga Márcia Couto, da Universidade de São Paulo.

Este afluxo de medalhas não teve a sorte de agradar a Jair Bolsonaro, que ainda não deu os parabéns aos seus compatriotas vitoriosos em Tóquio que, por sua vez, se abstiveram de falar de política em favor de reivindicar as suas origens, a sua orientação sexual ou o seu gênero.

“Procuro reconhecimento: quero que um negro baiano (estado brasileiro onde se concentra a maior parte da população de origem africana) se transforme na maior estrela do Brasil”, afirmou numa entrevista o campeão de canoagem Isaquias Queiroz, medalha de ouro na categoria C1 1.000m neste sábado (7).

(Com AFP)

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