Diversidade

Bancada Preta, o projeto que quer alavancar políticos negros eleitos

Articulação forma rede de comunicação nas Eleições 2020 para mostrar que ‘periferia não é o fim, e sim o começo’

Alguns membros da Bancada Preta reunidos (Foto: Divulgação/Bancada Preta) Alguns membros da Bancada Preta reunidos (Foto: Divulgação/Bancada Preta)
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As eleições municipais de 2020 não estão situadas no melhor dos contextos: a pandemia de coronavírus ameaça a saúde e acentua a crise econômica. Mas nem tudo vai mal. Este também é o pleito que possui, pela primeira vez, uma distribuição equânime de financiamento para candidaturas pretas em todos os partidos – um fator que o projeto Bancada Preta quer aproveitar para mudar, sem ponto de retorno, o rosto do cenário político brasileiro, que é majoritariamente branco.

Idealizado por diversas frentes sociais que agem pela igualdade racial e defesa dos direitos dos cidadãos periféricos, a Bancada Preta foca em 2020 para promover, a partir da comunicação, reflexão sobre a participação social para promover mudanças.

Articulado em São Paulo, o projeto endossa 11 candidaturas de vereança na capital paulista, além de uma em Francisco Morato e outra em Campinas.

As eleições 2020 servirão como balanço e ponto de partida para, em 2022, projetar a plataforma a uma dimensão nacional e fazer com que a política já existente na periferia chegue aos postos efetivos de tomada de decisão, diz Vinícius Antônio Pedro, coordenador da Frente Favela Brasil, uma das entidades integrantes.

“Eu sou do Capão Redondo, nasci e cresci lá, e, sobretudo, eu sei que a gente aprende lá desde cedo a fazer política. Por mais que não seja a politica institucional ou eleitoral, é a politica da boa vizinhança, da comunidade, do apoio um ao outro. A política está na nossa vida desde sempre, em todas as comunidades que têm a falta como um de seus cenários principais”.

Na base do projeto, está a intenção de focar na produção de conteúdo digital, construir um programa de variedades para o canal do YouTube da Bancada, lançar um podcast e suscitar uma plataforma de e-commerce, cursos, e eventos ao vivo.

A lista de intenções é grande, e o motivo é a desmistificação do que é ser da periferia e o incentivo para que a representatividade chegue às vias de fato do poder, explica o geógrafo Ederaldo Nascimento.

“O poder é oportunista. Falamos da periferia como se esta não fizesse parte da cidade – ou, pior, como se o atraso dessa ‘cidade’ se desse por conta da periferia. É um conceito equivocado que se tornou sinônimo de pobreza, como se fosse possível a todos morar no centro.”, afirma. “Nossa tentativa de comunicação com a periferia é primeiro de identidade. Se somos a maioria, devemos ser maioria nós espaços de poder”.

Para Suêrda Deboa, administradora que integra a bancada, há de se superar o racismo atrelado à imagem de pessoas negras em espaços de poder e, também, o estigma que recai sobre territórios ocupados historicamente por essa população – constante alvo de ações truculentas do poder público.

“No cenário político, homens brancos são maioria. Por mais qualificadas que as pessoas pretas sejam, sempre a nossa competência é questionada”, diz. “Há uma ideia que a gente tem desde a colonização de que determinado território é ‘seu’. Assim, territórios quilombolas e periferias são vistos como ameaça ao desenvolvimento”, afirma.

A agenda de compromisso que o candidato deve possuir para ser endossado pelo movimento, porém, não se relaciona necessariamente com a cor da pele, explica Vinícius:

“Nós temos um monte de candidatos que não estão comprometidos com a pauta racial que são negros. Não que a gente queira que as pessoas pensem da mesma forma ou não tenham sua individualidade, mas a gente precisa entender que o Brasil é um país afetado pelo racismo, São Paulo é uma cidade profundamente afetada pelo racismo e afetada de tal maneira que há uma segregação entre as pessoas. Isso a gente precisa colocar para todos os candidatos que estiverem lá. Aqueles que quiserem fazer uma construção de verdade com a bancada e com a população preta e periférica, nós estamos abertos ao diálogo.”, diz.

Para 2020, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) registrou cerca de 545 mil pedidos de registro de candidatura com a maioria de candidatos que se declaram pretos ou pardos, sendo 49,87% do total. Em 2016, essa porcentagem foi de 47,46%. A candidatura já existe, mas a bancada procura incentivar que a eleição de negras e negros saia do campo dos projetos e passe ao lugar de pautas prioritárias no País.

“De tanto ser esquecida pelo Estado, a periferia se autoajuda. Cria sua própria cultura, seu jeito de se vestir, suas poesias, as grandes lideranças, em especial mulheres e negras, que ainda se ajudam no cuidar dos filhos, na alimentação, no viver do dia a dia. Essa é nossa busca, de comunicar que a periferia não é o fim, e sim o começo.”, diz Ederaldo.

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