Cultura

Vladimir Safatle: governo tenta impor a cultura que seja segura ao seu projeto

Filósofo lança segundo álbum de composições instrumentais com fragmentos de textos de grandes autores

Foto: Alexandre Nunis/Divulgação.
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Diferente de Música de Superfície, um álbum de piano e voz lançado em 2019, o Tempo Tátil (Selo Sesc), segundo registro musical de Vladimir Safatle, se opõe a estrutura linear imposta pela composição cantada. Neste novo trabalho, a proposta é de rompimento.

“O Tempo Tátil é um trabalho que compus nos últimos 3, 4 anos. Indica um horizonte que procuro trabalhar de desfibramento e descomposição. Queria explorar as dimensões do tempo musical a partir de uma decomposição de estruturas tradicionais da música”, afirma o filósofo.

Nas cinco peças do projeto, Safatle usa fragmentos de textos na língua original dos autores Paul Celan, Scott Fitzgerald, Paul Eluard e Heiner Müller. Um texto é seu.

“A ideia de trabalhar a interface música e literatura foi para explorar temas que tratam de paralisia. Queria dar uma forma musical a esse bloqueio (proposto pelos textos)”.  Apresentar os textos na língua original foi para explorar a musicalidade que se perderia com a tradução.

Experimentando a liberação do tempo musical de seus esquemas estruturais, Safatle afirma que o trabalho pode ser visto como uma forma de refletir a experiência brasileira, assombrada por certo fantasma de que aqui seria uma terra sem lei, sem fé, sem fibra, amorfa, paralisada, onde nada se sustenta.

“Queria explorar essa fantasia, não no sentido de se defender dela, mas de afirmá-la. Mostrar a potencialidade e a produtividade disso que aparece para nós como profundo medo. As peças procuram o tempo do desligamento, em que gestos musicais são recuperados em outro instante”.

Obscurantismo

O filósofo também escreve um novo livro. Desta vez, sobre consciência, autonomia e expressão. “Uma maneira de tentar pensar os mesmos problemas que refleti musicalmente. A música produz conceitos, tem forma específica de pensamento”.

Safatle diz que a cultura virou o grande inimigo do governo. E não é só um delírio obscurantista, mas um projeto.

“A ideia é criar uma espécie de vertente, de uma cultura segura. Isso elimina aquilo que seria tenso, elemento fundamental para qualquer expressão cultural verdadeira”, explica.

“Uma cultura sadia, que decompõe e questiona é a verdadeira cultura. Isso cria um certo tipo de sensibilidade, imaginação, que coloca em cheque todo o controle de sujeição que é a base desse programa fascista do governo”.

As cinco peças do álbum, que estão sendo lançadas aos poucos nas plantaformas digitais, são: O Amor Vai Desterrar Nossos Corpos, Três Peças para Gestos ao Piano II, Instância e Explosão, O Solfejo de Nossas Filhas e Espaço Liso. Quatro delas sairão também com videoclipe.

A concepção, arranjos e direção musical de Tempo Tátil é do próprio Safatle. O trabalho mostra uma profundidade musical aplicada, propondo confluência de linguagem (música e literatura) de maneira atípica.

Além de Vladimir Safatle ao piano, o trabalho conta com Caroline De Comi, Fabiana Lian (soprano), Cristine Guzze (mezzo soprano), Valentina Ghiorzi Safatle (voz), Evan Rothstein (violino e arranjo de cordas), Renan Vitoriano (violino), Paco Garcez (viola), Rafael Ramalhoso (violoncelo), Igor Willcox (bateria e arranjo na música Instância e Explosão) e Ivan Nascimento (fagote).

O filósofo foi aluno de piano de Jay Gottlieb, renomado músico novaiorquino com extensa carreira internacional.

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