Cultura
Violência de prefeito contra música de Criolo se contrapõe ao que o rapper cultiva
De um discurso agressivo como forma de resistência, o gênero atualmente prega o amor, diferente do que fez o administrador
A truculência e a intolerância demonstradas pelo prefeito de Criciúma, Clésio Salvaro (PSDB), pelo fato de um professor de artes de uma escola do município apresentar em sala de aula, para alunos de 14 e 15 anos do 9º ano, em uma série de vídeos, o clipe Etérea, de Criolo, revela como o Estado hoje legitima o ódio.
O RAP, quando ganhou força no Brasil nos anos 1990, atuava demonstrando a todo o tipo de violência sofrida por moradores da periferia. De uma década para cá, passou a apresentar uma narrativa menos agressiva da desigualdade social e a valorizar o amor e a ajuda de uns aos outros, seja quem for. Além disso, passou a diversificar as referências musicais. Essa nova geração tem como maiores expoentes Emicida e Criolo.
Etérea, do rapper Criolo, que possui uma batida eletrônica, é um exemplo dessa mudança de discurso. A letra diz: “É necessário quebrar os padrões / É necessário abrir discussões…Mas se tem um jeito esse meu jeito de amar / Quem lhe dá o direito de vir me calar? / Eu sou todo amor, medo e dor, se erradicar / Feito o sol que ilumina a umidade suspensa do ar”.
Criolo lançou o clipe da música em 2019 apresentando a diversidade com várias performances de coletivos LGBTQIA+. Na época, numa entrevista a CartaCapital (disponível aqui), ele destacava: “O Estado não assume ser um Estado que gesta preconceito e o que já vem acontecendo desde sempre se escancara com o número de mortes. O ódio hoje legitimado e alimentado apresenta sua pior versão cruel e assassina”. Na ocasião, Criolo ressaltava a importância da música para o diálogo com amor, serenidade e verdade para promover a mudança.
O prefeito de Criciúma exerceu o Estado intolerante e uma versão enxuta e localizada. É interessante observar como a cultura tem sido jogada dentro do sistema antiplural que tenta se impor hoje no País.
Clésio Salvaro demitiu na quarta 25 o professor, que tinha função temporária, por conta da exibição do vídeo. Ele ainda chamou o conteúdo do clipe de “viadagem”.
Entidades tentam reverter a demissão. No sábado 28, uma parada LGBTQIA+ foi organizada em Criciúma reunindo mais de mil pessoas para criticar a conduta da administração pública e apoiar o professor. Criolo tem feito postagens a favor de seu trabalho e repúdio ao ocorrido.
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