Cultura

Um guia de cinema para a era Bolsonaro

Uma lista de filmes essenciais para entender as ameaças dos próximos anos

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O cinema é, como dizia o crítico americano Roger Ebert, uma “máquina de gerar empatia”, constantemente levando o espectador a enxergar o mundo pelo olhar do próximo, o que o transforma num modo poderoso de ampliar horizontes para que possamos perceber as dores e as dificuldades do próximo.

A lista, incompleta como qualquer outra, reúne alguns filmes cujas temáticas, imagina-se, serão recorrentes no Brasil de Bolsonaro.

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O cinema do diretor grego Costa-Gavras, político e humanista por excelência, é repleto de filmes que poderiam figurar confortavelmente nesta lista, do angustiante Desaparecido, sobre as barbaridades cometidas pela ditadura chilena, a obras como A Confissão e Estado de Sítio. Talvez o mais relevante aqui, no entanto, seja Z, sobre as investigações da morte de um líder pacifista durante uma manifestação. Denso e eficaz na abordagem narrativa que o aproxima de um thriller, mantém o espectador paralisado no sofá, mas com a mente em turbilhão.

 A Batalha de Argel

O italiano Gillo Pontecorvo, assim como Costa-Gavras, era um cineasta com a política nas veias e com um espírito anticolonialista que rendeu ao cinema um de seus maiores clássicos. A Batalha de Argel combina a linguagem de documentário (uma especialidade do diretor) e a ficção e se concentra nas ações dos rebeldes argelinos contra as autoridades colonialistas francesas. É uma lição de persistência na sua luta pela liberdade e por valores democráticos.

 O Homem Que Virou Suco

De João Batista de Andrade, protagonizado por José Dumont, o filme permanece tristemente atual ao acompanhar um cordelista que, confundido com um operário que matou o patrão americano, passa a ser perseguido pela polícia. Ao explorar a cumplicidade entre o empresariado e as autoridades na opressão constante dos miseráveis e de qualquer um que ouse erguer a voz contra a exploração, o longa usa o humor e o excelente timing cômico de Dumont para nos apresentar a um indivíduo cujo espírito não se rende ao papel limitado que a sociedade tenta lhe atribuir.

O Valor de um Homem

Rendeu ao fantástico intérprete francês Vincent Lindon o prêmio de Melhor Ator no Festival de Cannes em 2015. O filme situa o espectador ao lado de um trabalhador que, demitido após décadas no mesmo emprego, tenta encontrar uma ocupação. Sentindo-se frequentemente humilhado, o sujeito aos poucos percebe como sua relevância como indivíduo parece ser julgada não por seu caráter, mas por seu valor de mercado – numa realidade que enxerga os cidadãos como meras cifras e peças sem importância em uma engrenagem massacrante.

 Arábia

Brilhante estudo de personagem e um retrato do Brasil atual. Expõe de modo inquestionável o absurdo do conceito da “meritocracia” em uma sociedade na qual as cartas são marcadas para beneficiar quem controla o baralho. Uma tapeçaria do homem comum, encarnado no protagonista (Aristides de Sousa, brilhante mesmo sem ser ator profissional), enquanto este salta de lugar em lugar tentando sobreviver a subempregos e a um Estado francamente hostil.

 Batismo de Sangue

Leia também: Estupro e misoginia: o cinema espelha a vida

Dirigido pelo veterano Helvécio Ratton com o propósito claro e importante de expor a brutalidade dos porões da ditadura e da arbitrariedade com a qual os militares tratavam a população em sua sanha autoritária e repressora, o filme tem como foco as ações dos freis dominicanos no período. Concentra-se na figura trágica de Frei Tito, destruído física, emocional e psicologicamente pelos militares.

 Filhos da Esperança

Dirigido por Alfonso Cuarón, desenrola-se numa sociedade distópica em 2027, quando as catástrofes ambientais e as guerras finalmente cobram seu preço. Mistura de road movie, thriller de ação e filme de guerra, o longa tem como pano de fundo uma visão nada otimista da natureza destrutiva de um mundo no qual o interesse pelos lucros recordes se sobrepõe à sobrevivência da própria Humanidade, algo que encontra reflexo na negação absurda e chocante por parte de determinados governos dos efeitos do aquecimento global e da necessidade urgente de ações regulatórias que impeçam as corporações de sacrificar o planeta no altar do capitalismo descontrolado.

A Batalha do Chile

Às vezes, talento não é o suficiente para estabelecer o sucesso de um projeto. É preciso inteligência para saber reconhecer uma oportunidade única. Quando o cineasta chileno Patricio começou a realizar seu documentário sobre o cenário político em seu país após a eleição de Salvador Allende, a quem ele admirava, dificilmente poderia imaginar como acabaria por criar um dos retratos mais contundentes de um golpe em preparação e execução.

Brazil – O Filme

Ambientado em uma sociedade distópica futurista não determinada, o longa de Terry Gilliam, cujo título tem origem na clássica música de Ary Barroso, é uma espécie de 1984 adaptado às sensibilidades estéticas e temáticas do ex-Monty Python. Tecnicamente fascinante (o design de produção é um espetáculo à parte), o filme aos poucos revela-se uma alegoria sobre o autoritarismo, a banalização da perversidade (ou do mal, como diria Hannah Arendt) e a persistência do espírito humano em seu desejo – frequentemente malfadado – de liberdade.

Fahrenheit 451

Adaptada por François Truffaut em 1966, a clássica história concebida por Ray Bradbury encontra ecos no projeto “Escola Sem Partido”. Aos poucos, o protagonista torna-se interessado no conteúdo dos livros que é encarregado de incinerar, tornando-se uma ameaça em potencial para seus empregadores. Ilustra por que manter o povo na ignorância e/ou na alienação é fundamental para qualquer regime autoritário.

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