Cultura

O legado de Rainer Fassbinder

Cineasta alemão de maior fama internacional recebe homenagens e influencia novos artistas no ano em que completaria seu septuagésimo aniversário

Fassbinder: 44 filmes realizados em apenas 16 anos
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Um dos maiores nomes do cinema alemão, Rainer Werner Fassbinder morreu no dia 10 de junho de 1982. Em 2015, porém, ele é lembrado como se estivesse vivo para comemorar seus 70 anos. Dono de uma obra admirável, com 44 filmes realizados em apenas 16 anos, o diretor se tornou um dos maiores representantes do Cinema Novo Alemão.

Ao lado de Wim Wenders – que também completa seu septuagésimo aniversário este ano –, Werner Herzog, Alexander Kluge, entre outros, Fassbinder legaria ao Autorenkino (cinema de autor) alemão, o maior prestígio e alcance internacional de sua história.

Prolífico e inquieto, o diretor bávaro levou uma vida intensa e morreu prematuramente, aos 37 anos de idade. Para além do mito em torno de sua pessoa, seus filmes tiveram ampla repercussão por retratarem contextos sociopolíticos importantes da história da Alemanha. No fim da carreira, realizou Lili Marlene (1980), ambientado nos anos da guerra, e uma trilogia – O casamento de Maria Braun (1979), Lola (1981) e O desespero de Veronika Voss (1982), este vencedor do Urso de Ouro no Festival de Berlim – obras tidas como crônicas audiovisuais da vida na Alemanha Ocidental.

Todos esses filmes têm em comum o protagonismo de personagens femininas. É inquestionável que Hanna Shygulla, Rosel Zech, Ingrid Caven, Irm Hermann, entre outras atrizes brilhantes do cinema de Fassbinder, permanecem até hoje no imaginário de seus espectadores. O cineasta tinha uma relação muito boa com elas e mostrava, em seus filmes, possuir uma compreensão profunda da alma feminina. Elas eram o fio condutor dos processos sociais retratados nas obras. Apesar de mostrar a vitimização e o sofrimento delas, Fassbinder atribuía-lhes, acima de tudo, uma resistência insuperável.

Por esse lugar de destaque da mulher nos filmes de Fassbinder, não é de se admirar que um documentário sobre a vida e a obra do mestre leve a assinatura de uma mulher. A alemã Anne-Katrin Hendel, diretora de Fassbinder, lançado em abril nos cinemas alemães, cresceu na Alemanha Oriental e só foi ter acesso às obras do diretor a partir dos anos 1990. “O que mais chamou minha atenção na trajetória de Fassbinder foi o entrelaçamento de sua vida e obra. Procurei retratar subjetivamente esta ambivalência no meu filme, de um artista que encontra e também perde seu caminho. Minha intenção também é introduzir suas obras às novas gerações”, conta Hendel.

Outro lançamento dedicado à obra de Fassbinder é o livro Hintern den Bildern die Welt (O mundo por trás das imagens, em tradução livre), de Antje Vollmer e Hans-Eckardt Wenzel. A obra é uma troca de experiências e sensações entre os dois autores. Em cartas, eles conversam sobre a imersão de duas pessoas de mundos diferentes na cinematografia de Fassbinder.

Ela vinha do lado ocidental, ele, do oriental. Os dois se encontraram na manifestação da Alexanderplatz, em Berlim, cinco dias antes da queda do Muro. “O conjunto da obra de Fassbinder é um espelho da Alemanha Ocidental. Ele nasceu no ano zero da república e morreu após o término de seu período mais marcante”, conta Vollmer, cientista política e vice-presidente do Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão). O legado de Fassbinder, segundo ela, é o de um sujeito formador de opinião, e é esta atitude que o livro quer instigar no leitor.

Fassbinder também é muito conhecido pela maestria com que trabalhou o melodrama em suas narrativas. Ele era um grande admirador do mestre do gênero, Douglas Sirk, de quem veio a se tornar amigo. Curvas dramáticas e sentimentos viscerais são elementos constitutivos das tramas de Fassbinder. Suas histórias são carregadas de humanismo, densidade e poesia. Além do domínio refinado de elementos narrativos e de uma construção meticulosa de mise-en-scène, o diretor também primava pela concepção estética de suas obras; por vezes em preto e branco resplandecente, como no drama de Veronika Voss, outras vezes, com um delicado balanço de cores.

O cinema de Fassbinder é uma das maiores fontes de inspiração para Karim Aïnouz, um dos diretores mais prestigiados da nova geração do cinema brasileiro. O cearense, hoje residente em Berlim, conta que explorou o melodrama fassbinderiano em seu último filme Praia do Futuro (2014), uma co-produção Brasil-Alemanha, e lamenta o fato de o gênero ter se tornado “bastardo” depois de seu desgaste pelas novelas.

  • Autoria Júlia Vilhena

 

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