Cultura

O angustiante trabalho dos restauradores das obras danificadas no Congresso

Os funcionários normalmente ocupados com tarefas de preservação tentam resgatar as obras do acervo, algumas reduzidas a peças que deverão montar como quebra-cabeças

Créditos: DOUGLAS MAGNO / AFP
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Randall Felix trabalha com afinco na madeira de uma cadeira do início do século XIX. O braço do móvel foi arrancado durante a invasão ao Congresso, em 8 de janeiro, por bolsonaristas radicais, que destruíram parte do patrimônio histórico do Legislativo.

“É grande o choque. Isso faz parte da vida da gente (…) Então, quando a gente vê uma peça desse jeito, como foi tratada, pra mim é bem difícil”, disse à AFP o mestre artesão do Museu do Senado.

A lástima é um sentimento comum entre aqueles que tentam dar nova vida aos objetos destruídos.

A cadeira na mesa de trabalho de Félix, que pertencia à antiga sede do Senado no Rio de Janeiro, é apenas uma das dezenas de peças danificadas na invasão do Congresso, em Brasília, por milhares de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Além do Congresso, também invadiram e causaram danos ao Palácio do Planalto e ao Supremo Tribunal Federal, decorados com obras de arte de valor inestimável. O grupo buscava a queda do novo governo e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Desde aquele dia, os funcionários normalmente ocupados com tarefas de preservação tentam resgatar as obras do acervo, algumas reduzidas a peças que deverão montar como quebra-cabeças.

No laboratório do museu da Câmara dos Deputados existem vários recipientes com fragmentos de vasilhas e outros objetos identificáveis apenas por fotos antigas.

A maioria foi encontrada no emblemático Salão Verde, onde os legisladores costumam falar com a imprensa, e ficavam expostos cerca de 46 presentes de diversos países. Pedaços destas peças ficaram espalhados entre os vidros e sob a água que inundou a sala após um princípio de incêndio.

“Sentimento de perda”

“Pegamos lanternas e fomos procurar fragmentos. Tivemos que fazer trabalho de arqueologia no meio dos escombros (…) Provavelmente, aqueles objetos foram jogados contra alguma coisa ou alguém”, diz Gilcy Rodrigues, chefe de restauração do Museu da Câmara.

Após um árduo trabalho de inventário e diagnóstico, iniciou-se a reparação de pinturas, mesas, tapetes, ornamentos e esculturas, entre outros.

Rodrigues, que há 30 dos seus 58 anos zela pelo patrimônio da Câmara, não conteve as lágrimas.

“Aqui não é só nosso trabalho, aqui é a nossa casa. E é nossa competência, cuidar do patrimônio da instituição. Então é muito difícil falar disso sem esse sentimento de perda, de angústia”, afirma.

Marcelo Sá de Sousa, chefe do Museu da Câmara dos Deputados, também lamenta: “Foi um trabalho extremamente difícil, emocionalmente desgastante para todos. E acho que foi um grande trauma”.

O esforço da equipe já é visível na Câmara dos Deputados, onde 60% dos objetos danificados foram restaurados.

“É muito mais do que a apreciação estética. De repente, em um ato insano, nós percebemos que todo o nosso trabalho foi por água abaixo, literalmente. É muito triste”, ecoa Ismail Carvalho, responsável pelo laboratório de restauração do Senado.

O Ministério Público Federal estimou o valor dos prejuízos nos ataques as sedes dos Três Poderes em R$ 18,5 milhões.

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