Cultura

Maior baluarte vivo do Carnaval de São Paulo é contra desfile em julho

Para Carlão do Peruche, de 90 anos, não há condições sanitárias para manter o evento. ‘O melhor é fazer só no ano que vem.’

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Seu Carlão do Peruche, 90 anos, maior baluarte vivo do Carnaval de São Paulo, é contra o agendamento para julho dos desfiles de Carnaval no Sambódromo. “O melhor é fazer só no ano que vem. As escolas de samba têm que evitar aglomerações, nas quadras e no próprio desfile. Existem uma série de problemas sanitários”, diz.

“Como vão fazer os ensaios técnicos com o povo todo? A escola para ir para avenida terá uma série de restrições. Não tem condições”. O sambista adiantou que sua escola, a Unidos do Peruche (fundada por ele em 1956) não irá para a avenida esse ano. “Acredito que outras escolas também não vão querer por causa da pandemia. Nós ainda vamos marcar uma reunião com outras escolas para decidir isso”.

Sambódromo faz 30 anos

Nos anos 1960, Seu Carlão do Peruche articulou com mais quatro sambistas, os chamados cardeais do samba, a oficialização do Carnaval de São Paulo junto ao poder público e, um pouco mais à frente, a formação de uma associação para representá-los.

Esse esforço, que permitiu aos desfiles das escolas de samba crescer, se valorizar e atrair público, desaguou na construção do Sambódromo, inaugurado em fevereiro de 1991, há 30 anos.

No início, o lugar foi recebido como palco digno para a grandeza da manifestação popular. Com o tempo, entretanto, acumularam-se ressalvas. “O sambódromo foi bom para o Carnaval. Mas não ficou só para o Carnaval. Tem uma série de outras atividades ao longo do ano. Tudo bem, ele atende as escolas de samba, mas há outros eventos”, diz hoje.

No seu livro de memórias, publicado há dois anos, de autoria de Bruno Baronetti, Seu Carlão fez a mesma avaliação, acrescentando que “não há um projeto para tornar o espaço um local do samba da cidade como queríamos no início…”.

Seu Carlão idealizada um lugar ocupado iminentemente por sambistas, com ensino de música, realização de shows e projetos de samba. Nesta mesma obra, ele cita ainda que o Sambódromo encareceu muito os desfiles, afastando a comunidade e os negros, os legítimos criadores das escolas de samba.

A pandemia o impediu de comemorar seus 90 anos, completados em setembro do ano passado. “Suspendemos tudo. Tenho saudade do Carnaval, da quadra. Pessoal do samba. Mas isso vai passar. Tudo passa”. Cego depois de desenvolver catarata seguida de glaucoma, o sambista se diz triste por não poder mais assistir como queria as alas e os carros alegóricos de sua escola.

Carlão do Peruche frequentou quando criança os batuques de Pirapora, na época em que Mário de Andrade publicou o magnífico ensaio, intitulado Samba Rural Paulista, em 1937, onde faz a descrição minuciosa, vista in loco, da evolução, do canto, da dança e da coreografia desta manifestação.

O texto é um dos escritos referenciais da história da música brasileira. Não se tem notícia de outro reconhecido sambista ainda vivo, além de Seu Carlão, que também tenha frequentado naquele período do relato de Mário de Andrade as festas nos barracões, no ritmo dos tambores onde se reuniam os negros em Pirapora do Bom Jesus. O livro de memórias do Seu Carlão tem capítulo dedicado à sua passagem por lá quando menino.

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